144 – SEMPRE AOS DOMINGOS...
E Ela já estava na casa dos setenta anos de idade quando se enviuvou, e seu único filho vinha todos os domingos almoçar, das vezes trazia a nora, mas esta sempre arrumava uma desculpa qualquer para não vir àquele almoço, parece que nora não se dava bem com a sogra, embora esta fizesse de um tudo para agradá-la.
O filho insistiu que ela vendesse o seu apartamento e fosse morar com ele, mas ela relutava, dizia que, ou melhor, imaginava que na casa de seu filho ela seria um estorvo, que iria tirar a liberdade deles e a sua também, preferiu continuar sozinha naquela vidinha simples e cheia de sonhos.
Com os reclames da nora que detestava vir à casa da sogra o filho foi rareando suas visitas, foi se afastando paulatinamente de sua mãe, e nesta época raramente ele vinha almoçar, e quando vem, vem a toda pressa, nem bem acaba de almoçar e já se retira, dando claramente a demonstração de estar cumprindo uma obrigação, e não cumprindo um desejo e não demonstrava alegria alguma quando estava ao lado dela.
E assim o tempo foi passando e agora raríssimo eram as suas visitas, e nesta época Ela adquiriu o hábito de conversar com o finado marido:
- Marido, o menino não apareceu hoje, deve ser porque ele está muito ocupado, ele tem tantas coisas pra cuidar, tantas coisas pra zelar, tem que lavar o carro, tem que cuidar das jardineiras, tem que cuidar dos filhos, da esposa, e sendo assim não sobra tempo algum para vir almoçar comigo!
E Ela adquiriu outro hábito, todos os domingos, ao colocar os alimentos sobre a mesa, colocava também um prato com os devidos talhares para que seu filho almoçasse, mesmo que ausente, e era como se ele estivesse ali, ao seu lado, almoçando e conversando alegremente com ela.
E assim, todos os domingos ela religiosamente arrumava detalhe por detalhe o tão aguardado almoço em homenagem ao seu filho querido, tão preocupada estava em servi-lo que passou a colocar alimentos no prato e a conversar com ele, mesmo ausente:
- Filho, gostou da lasanha que eu fiz, fiz com todo carinho, porque sei que você adora!
Terminado o almoço ela servia a sobremesa com a mesma dedicação e entusiasmo:
- Filho! E o pudim, está do jeito que você gosta?
E assim o tempo foi passando e ela se esmerando cada vez mais em servir o almoço ao filho, e dizia pro falecido marido:
- Você viu como ele comeu tudo, rapou o prato, a minha comida é realmente muito deliciosa, e a sobremesa? Não sobrou nadica de nada!
Aquela mania foi se agigantando, agora ela não só servia o filho nos domingos como também em todos os dias da semana, tornou a sua obsessão aquele desejo de servir o almoço e Ela continuava a colocar no prato os alimentos, mesmo que depois os tivesse que jogar no lixo, e assim nesta labuta, neste afazer, nesta contínua e insistente mania em servir cada vez mais e melhor o seu filho, ela paulatinamente foi se debilitando, foi se enfraquecendo, estava se enlouquecendo, enlouqueceu, e quando o filho se deu pelo acontecido, restou a ele somente a opção de colocá-la em um manicômio, onde terminou de forma melancólica os seus dias, e mesmo em seus últimos momentos de vida ela insistia em servir o almoço ao seu filho querido, aquele que quando menino lhe dera tantas preocupações, pois era um tanto adoentado.
Agora que Ela não mais cozinhava, se imaginava cozinhando, se imaginava ao lado de seu finado marido, se via na cozinha, se sentia realizada naquele lidar.
Com o agravamento da sua loucura não mais reconhecia o seu filho, mesmo assim Ela conversava animadamente com o falecido marido:
- Querido, o nosso filho esta atrasado para o almoço, o que será que aconteceu?
E assim ela terminou os seus dias, na certa morreu feliz na companhia de seu finado esposo, e cozinhando, cozinhar era a sua paixão, principalmente quando estava preparando os pratos preferidos do seu inesquecível filho!