AVÔ PÃO DURO RECEBE LIÇÃO DE VIDA DO NETO O GÊNIO (12 º CAPITULO)
Dona Meire e eu nos conhecemos na época que trabalhei como governanta da casa de Richard e Vilma, ocasião que perdemos uma boa oportunidade de aproximá—la de sua irmã Manoela, faltou diálogo para que isso acontecesse, uma ironia do destino que em muitos casos nos priva da realidade com os seus caprichos. Aconteceu que na semana passada, logo cedinho bateu uma saudade louca do meu sertão dos amigos e até da vida trabalhosa que lá eu vivi. Se eu tivesse o poder bateria asas e pousaria ao lado de minha melhor amiga. Ex que de repente Pedro me chama e anuncia – Dona Laura visitas para a senhora! –Visita Pedro quem possa ser?—Acredito que vai gostar, vá até a sala de estar leve Rosa também, vai ter uma bela surpresa!—Entramos na sala La estavam os visitantes admirando as obras, a concentração era tamanha que não notaram nossa presença os acompanhando. Ao término da vistoria, Manoela virando-se para trás, depara-se comigo, que esperava ansiosa por seu abraço, por momentos a emoção me cortou as palavras, mas logo me recompus podendo expressar todo a minha alegria e felicidade. – Seus avôs Luizinho vieram nos visitar graças a sua tia avó que durante anos procurou pela irmã e só agora a encontrou.
-- E como eles estão? O vô continua o mesmo pão duro de sempre?— Bem no inicio resistiu ao convite de dona Meire para se hospedar em sua casa, afirmando que teria que voltar para Rancharia o mais rápido possível, mas assim que descobriu que você estava por perto, mudou de idéia imediatamente e só serviu vir visitá-lo quase não dormiu a noite de ansiedade pela viagem, como me narrou sua avó Manoela. Parece mais civilizado, ao descobrir que estávamos residindo aqui desistiu de voltar para cruzilhas, e veio nos procurar saiu entristecido por não encontrá-lo. –E como soube da gente? –Um quadro seu na casa de dona Meire, ele reconheceu o local, como sendo a fazenda de sua propriedade e perguntou pela sua assinatura. Agora a decisão é sua, em minha opinião você deve procurá-lo o mais rápido possível e contar sua história. Pode abrir o jogo com ele. Não perda tempo os dias de seu avô estão contados, a opinião dos médicos é que eles devem vir morar aqui na a capital para se cuidar, mas como você sabe tudo para ele são seus bens materiais, o seu mundo gira em torno de sua fortuna. – Vó eu só não o procurei antes em respeito à senhora, mas já que a senhora me deu esta liberdade eu farei isso sim! E se a senhora me permite vou convencê-lo a vir morar na capital, para que eu possa cuidar dele. –Traga seus avôs, convide-os a morar conosco- O que vó--, a senhora fala sério?—Sim meu querido, não é seu o dizer, que o ato de perdoar é tão belo como o amor?
–Luizinho abraçou avó encheu ela de beijos, arrancando lágrimas de todos que presenciaram a sena. –Tudo bem pessoal, por hoje chega de emoções agora eu faço questão, já que todos aqui são meus familiares vamos nos dar as mãos e rezemos juntos -, a oração que Jesus nos ensinou. E após Luizinho finalizou dizendo: “estamos e estaremos sempre unidos e reunidos em nome do pai do filho e do espírito santo amem!” E agora em nome de Deus façamos nossa refeição!
O jovem pintor não se cotinha de tanta alegria, ele abraçava seus pais adotivos, Pedro e Rosa, sua tia avó Meire, as primas, acariciava o bebê recém nascido. – Já imaginou Richard como Deus é generoso, bendito seja ele, pelo dia que te colocou em meu caminho para que eu mais tarde ganhasse uma família!—E bendita seja tua genialidade in La pintura Luizinho! – Respondeu Richard com o seu sotaque. Encerraram a festa, marcaram uma viagem a cruzilhas para a próxima semana, viajaria a família inteira e o objetivo era uma visita de surpresa a Rancharia! Meire com a família retornou a sua mansão. Luizinho descansou durante a semana desligando completamente de suas obras, escreveu algumas Crônicas sobre sua viagem, e deixou tudo preparado para o reencontro com o avô.
Segunda feira quatro da tarde, após dez horas de viagem o trem parou na estação de Cruzilhas, Luizinho saltou acompanhado de sua avó seguido dos demais familiares, exceto Neide e o marido que por precaução não viajaram devido a pouca idade de seu bebê. A cidade crescera razoavelmente a sede da fazenda Barro Branco estava margeando a avenida principal que levava o nome de Antero Gonçalves, onde também situava o grande seleiro de Certoro. Laura se emocionou ao ver o nome do marido escrito na placa homenageando-o como um dos fundadores, pioneiro que ali atuou. Luizinho amparou sua avó e o grupo de malas em mãos segue a busca de um hotel, cercado por dezenas de pessoas, se apresentando como amigos e colegas do pintor, Alguém o reconheceu e espalhou o boato sobre sua presença. Em pouco tempo formou-se uma grande aglomeração de curiosos. Uma carruagem adentrou no meio grupo, era Clóvis que recebeu a noticia através de um velho amigo que reconheceu Laura e o avisou. Apresentou-se: – Sou Clóvis capataz da fazenda Barro Branco coloque as malas na carruagem tem acomodação para todos na fazenda! O coronel Certoro deixou-me de sobre aviso caso soubesse de vossa chegada à cidade, os acolhesse imediatamente. Ajeitaram as malas na carruagem, tomaram seus lugares. Educadamente de cima da carruagem Luizinho pronunciou: — Caros conterrâneos eu nunca imaginei uma acolhida tão calorosa ao retornar a minha querida terra, mas meu tempo é curto. São dezesseis horas e alguns minutos eu lhes prometo às vinte horas estarei na plataforma da estação para abraçar cada um de vocês!
Clóvis deu ordem de partida aos animais, seguindo para a sede da fazenda. Ao chegarem Laura e os demais, antes de tudo andaram pelo quintal foram até a bica água. Fez uma vistoria nas dependências ainda bem conservadas, Luizinho a acompanhou descrevendo minuciosamente aos familiares todos os detalhes por eles ali vivenciados. Mais tarde após a boa chuveirada que todos tomaram, foi servido o jantar.
Vinte horas em ponto Richard acompanhou o pintor à plataforma da estação. Avenida estava tomada pela população que compareceu em massa. Os funcionários da ferrovia organizaram uma fila para que todos abraçassem o conterrâneo famoso. Richard se sentiu lisonjeado quando o pintor no seu discurso creditou a ele todo aquele seu sucesso. Voltaram à fazenda já era alta noite, decididos adiar a viagem a Rancharia por mais um dia, para que junto a Laura o pintor pudesse visitar a sepultura do avô e da mãe. No dia seguinte; na sede da fazenda, receberam os amigos mais íntimos, dentre eles seus ex-colegas de escola.
Foi um dia de gloria jamais visto naquela prospera cidade. Ao procurar pelo sepulcro do marido, Laura teve a grata surpresa, foi construído um cemitério abrangendo aquele campo Santo cujas sepulturas eram ao ar livre em campo aberto. - Certoro mandara construir um luxuoso jazigo para o amigo Antero e filha La sepultada. – Foi à gota d’água que faltava para derreter o coração de Laura que teimava em não perdoar o velho coronel. Comovida ela não conteve a emoção e declarou ao neto que o acompanharia até a fazenda Rancharia, para agradecer pessoalmente o coronel Certoro pelo seu nobre gesto. A revelação deixou Luizinho irradiando felicidade, era também o passaporte que lhe faltava para libertar seu desejo de abraçar o avô e apagar de vez aquela sombra que em obediência sua avó escureceu sua alma durante seus trinta e dois anos de vida!
A melhoria da estrada encurtou distancia diminuído o espaço de tempo, entre Barro Branco e Rancharia, Clóvis avisou:- - se saírem às quatro horas da madrugada, poderá chegar a tardar La pelas vinte horas, não há mais necessidade em pernoitar no caminho.
Vários amigos estiveram visitando Laura na fazenda e foi unânime na afirmação que sua atitude em perdoar o coronel era um nobre gesto de sua parte, incentivo este que influiu satisfatoriamente em sua decisão.
No dia seguinte quatro horas da manhã Pedro tomavam as rédeas da carruagem da fazenda cedida ao grupo, rumo à fazenda Rancharia. Enquanto a lua de prata bailava entre brancas plumas de algodão formadas pelas nuvens no alto índigo do infinito o tropel dos cavalos fazia coro com o cantar dos curiangos nas restingas floridas que Margeavam a estrada. A viagem para o jovem pintor e seus acompanhantes parecia um sonho equiparando-se aos contos de fadas. Laura contemplava aquele belo cenário, mas voltada no tempo fazendo a mesma viagem de mais de três décadas passadas quando de coração ferido fizera aquela trajeto ao inverso em todos os sentidos, apenas uma coisa a magoava a falta física do marido e a filha, por que espiritualmente eles estavam com ela guardados dentro do seu coração. Quando aurora começou a tingir ao longe o horizonte com suas nuanças escarlates, algumas milhas, já haviam sido devoradas pelas patas dos cavalos atingindo o alto de uma colina. Pedro no papel de cocheiro sugeriu uma parada, hora de um pequeno descanso aos animais. Do alto contemplava-se a verdejante floresta, salpicada de filetes que subiam em riste, desenhados pela fumaça branca expelida das chaminés, anunciando o inicio do labor sertanejo.
Reiniciou a viagem com a lua tímida e empalidecida com os primeiros raios lançados pelo sol, refulgindo rutilante no orvalho da madrugada, acumulado pelas folhas que gotejavam pérolas cristalinas. A carruagem seguia desentocando os saguis e espantando as aves que chilravam lindos gorjeios, em seu desjejum saboreando as frutas silvestres oferecidas pela mãe natureza.
Ao meio dia com o sol a pino, hora de mais um parada, desta vez no riacho das pedras. Um lanche reforçado aos viajantes, e feno aos animais, uma hora de descanso com direito a um banho de cachoeira incluindo os animais. Ouvindo o murmurar da cascata cuja água cristalina cantava rolando entre as pedras e apreciando o malabarismo dos lambaris, em azuladas poças que se formavam a disputar cada frutinha que o vento desgarrava dos arbustos ribeirinhos, as atirando sobre eles, obedecendo à automatização criada pela mãe natureza. —Luizinho chamou atenção da avó: “veja vó quanta perfeição da natureza, o vento alimentando os peixes... Como não acreditar na existência de Deus?”
Seguiram a viagem até ao cair da tarde. -- Na parte da manhã viajaram ao encontro do sol, agora com ele vertido ao poente viajavam se distanciando do astro rei. Ao atingir o cume de mais uma colina, Pedro avisou: demos mais meia hora de descanso aos animais. O sol acabava de mergulhar no horizonte e a lua estava retardatária em seu plantão, que teria inicio um pouco mais tarde devido ao ciclo de sua fase minguante. Retomando a viagem a sombras da carruagem, e das arvores, que nas ultimas horas se alongaram com o sol vertido ao poente aos poucos desapareceram. Centenas de curiangos, (pássaros de hábitos noturnos) começaram tomar a estrada chegando a assombrar os animais algumas vezes, exigindo a atenção redobrada do cocheiro Pedro.
Quando a noite caiu completamente e o céu cobriu com o manto azul bordado por milhões de estrelas, ouviam-se os curiangos, cantar: --amanhã eu vô, amanhã eu vô! Seguidos pelos urutaus gritando mata afora, -fôi-fôi! E Fôi-fôi–fôi!-- Dona do universo a lua apontou soberana de traz da mata dando boas vindas aos visitantes que adentravam o curral de Rancharia. O relógio da Casa grande acabara de dar a oitava badalada anunciando oito horas da noite. Certoro que descasava os recém lavados pés na borda da bacia olhou pela janela da cozinha que dava para o curral, e murmurou: --Manoela tem visita quem será a esta hora? Calçando suas alpercatas de couro cru com as calças arregaçadas até ao meio das canelas ele vai à porta da sala. De malas em mãos o grupo de visitantes entoou em coro “uma boa noite coronel!” Assustado o velho não teve palavras para responder abraçou o neto que liderava o grupo e disse apenas; -- sejam todos bem vindos... Então é tu o homem que faz milagres com as tintas?—Sim sou eu mesmo vovô! –Como disseste? Vovô! Ouviu isto Manoela... Ele disse vovô! É a coisa mais maravilhosa que ouvi em meus oitenta anos de vida! –Acalme-se Certoro, dê boas vindas aos outros, eles estão aguardando! Passada a euforia da recepção, dirigiram todos à cozinha.
(Continua na próxima semana)