1º Ato Rodriguiano
No teatro os assentos iam sendo ocupados. Os presentes estavam ouriçados para o inicio do primeiro ato. E, em meio ao público estavam Marilia e Regina, duas jovens senhoritas já passado a casa dos trinta. Amigas de longa data, que também aguardavam ansiosas como todos a peça iniciar. Vendo alguns atores no palco, isso dava mais gana a sanha de ver a façanha "Boca de Ouro" texto escrito por Nelson Rodrigues.
Marilia – Onde vamos sentar? Pergunta a amiga Regina.
Regina – O mais próximo possível do palco. Olha ali, tem dois lugares sobrando.
As duas amigas tomam posse do lugar e felizes por estarem presentes a mais uma encenação da vida sorriem.Em meio à expectativa que faz parte do clima, aparece do nada uma senhorinha (que logo mais elas a chamarão de velhota).
Sigo a contar...
Senhorinha - Por favor, é aqui que ficam as poltronas 10, 11 e 12?
As moças trocam olhar.
Senhorinha – É que eu e minhas amigas estávamos aqui e como precisávamos tomar remédio e saímos.
Marilia Responde:
Marilia – Sim, é aqui.
Regina com olhar de desaprovação, chegando á conclusão do que a tal queria, quase cospe fogo na cara da “senhorinha”.
Senhora – Então, como já tomamos o remédio voltamos e queremos sentar.
Regina responde ríspida e com ironia a tal questionamento.
Regina - Hoje não há cobrança de bilheteria, os acentos estão liberados para quem chegar.
Senhorinha – Mas eu sou idosa (imputação de preferência, sinônimo de decadência).
Regina – Vai se foder! Sua velha asquerosa! Bem que ela queria ter dito isso, mas apenas fez sinal de não com a cabeça.
Marilia fala á senhorinha mostrando o teatro:
Marilia – Mas onde vamos sentar? O teatro esta lotado, veja! A maioria das poltronas ocupadas!
E ao lado Regina bufava com tal disparate da velhota.
Senhorinha – Tudo bem! Vocês não vão sair certo?
A Velhota fica indignada com a má criação das jovens meninas.
Senhorinha - Vou falar então com o responsável.
E ela parte enfurecida.
Regina – Que merda, essa tia ai Marilia! Sai pra tomar remédio e acha que é assim! Por que não guardou lugar? Precisava ir todas, não podia ficar uma garantindo o acento das outras? Lamento, mas não me levanto e sem contar que a bilheteria hoje é liberada, ninguém que esta aqui pagou pra entrar...
Marilia concorda e começa um buchicho próximo ao público vizinho, que começou a indagá-las:
- Qual é mesmo o número que ela queria?
Uma com voz de alivio:
- Ufa! Ainda bem que não é o meu lugar.
Outros diziam:
- Essa dai esta querendo demais não?
Diante a esse alvoroço no palco o telão desce e Rui Castro começa a relatar referências da peça e do bom moço que a escreveu. As luzes vão se apagando e a velhota desaparece da cena e do olhar dos demais.
Quem é frequentador de cinema, teatro sabe muito bem que antes de iniciar “a maravilha” somos abordados por algumas leis e decretos de como devemos nos comportar, do que não pode funcionar e se houver incêndio, para onde devemos seguir.
E Marilia tem um lapso e cutuca a amiga deixando sair pela boca sua imaginação...
Marilia: Imagina essa cena Regina.
- O Locutor - O Ministério da blá blá blá informa que por decreto lei nº blá! blá! blá! fica proibido sentar no lugar de velhinhas.
As duas imaginando a situação não param de rir e o locutor no imaginário continua...
- O Locutor – Portanto vocês ai, sim, vocês Regina e Marilia queiram se levantar e ceder o lugar!
A gargalhada toma maior proporção e a imaginação ainda não termina...
- O Locutor – É com vocês mesmo meninas, não vão se levantar?
Risos e mais risos.
Bem, essa cena já foi vista em alguma dramaturgia e tenho certeza se vivo, Nelson Rodrigues a contaria (coitada da senhorinha risos).
Privada a vida, só mesmo no banheiro de casa.