Mal de amor

Um farmacêutico antigo de minha cidade me contou um
causo que eu quase morri de rir… Era um domingo à noite e ele
estava dormindo em sua casa quando foi chamado para acudir um
doente muito seu amigo que estava nas últimas. O farmacêutico
foi informado que no hospital da cidade não tinha médico de
plantão e o único recurso no momento era ele. O que lhe causou
surpresa foi que na sexta-feira, quando tinha atendido o tal
doente, ele estava ótimo, parecendo que até tinha encontrado o
ninho da égua. Um pouco surpreso e preocupado com o chama-
do, ele pegou sua maleta com todos os aparatos e saiu correndo,
já preparado para ver o moribundo passar dessa para uma melhor
(bater as botas) e que azar ia ser se isso acontecesse em suas mãos.
Chegando à casa do doente, o farmacêutico se deparou com
o maior alvoroço: a família desesperada, todos chorando muito e
preocupados com a saúde do doente. A única que parecia não se
importar com os fatos era sua esposa, que estava descontrolada e
querendo entrar no quarto onde estava o doente de qualquer jeito.
Alguém chamou o farmacêutico para o canto, sem que a família
ouvisse, e lhe contou que o cara tinha arrumado uma amante e
foi pego no flagra pela família. Pressionaram tanto o “Don Juan”

que o cara teve um ataque cardíaco fulminante, sentiu uma dor
no peito e desmaiou.
O tal doente tinha diabetes, e o farmacêutico ficou preocupado
e correu para ajudar. Mediu a pressão, a temperatura, a pulsação e
a respiração. Tudo estava normal, excelente, porém o doente estava
completamente desfalecido. Por via das dúvidas, fez um teste de
glicose, e confirmou que também estava dentro da normalidade.
Ficou em dúvida, pois o paciente estava com uma cara de defunto
fresco danada, com os olhos fechados e quase não respondia aos
estímulos. Então fez um sinal para que todos saíssem do quarto e
os deixassem a sós, e fechou a porta. Não sabia se o doente estava
mesmo passando mal pela pressão da família ou se era um artista
de primeira qualidade. Molhou um pedaço de algodão com um
pouco de éter e o aproximou do nariz do doente, que virou o rosto

para o outro lado. Como o doente tinha diabetes e não podia
tomar glicose de jeito nenhum, o farmacêutico falou em voz baixa:
— Vou ter que aplicar glicose pra ver se numa última tentativa
ele melhora.
O doente abriu um pouco um olho, e vendo que estavam a
sós, deu um pulo repentino e disse baixinho:
— Cê tá querendo me matar? Não faz nada, não. Pode ir
embora e diga que vou melhorar. Que é pra eles me deixarem de
repouso, e não me incomodar de jeito nenhum — disse isso de
olho na porta do quarto para não ser pego desprevenido.
O farmacêutico quase não suportou a vontade de rir e falou
para ele ficar tranquilo que ia dar um jeito. Nisso abriram a porta
e foi entrando alguém da família rezando com um terço na mão
e dizendo que o padre havia chegado. O moribundo começou a
gemer de tanto aperto, parecendo que estava nas últimas. Então,
o farmacêutico lhe disse baixinho:
— Agora você vai ter de morrer mesmo, não pode desperdiçar
a extrema-unção.
O padre entrou para dar a extrema-unção e o farmacêutico foi
chamado para atender alguém da família que havia desmaiado. O
padre começou rezar e o doente ficou desfalecido. Daí a pouco o
farmacêutico voltou e o padre terminou a reza. Quando o padre
saiu e os dois ficaram a sós novamente, o farmacêutico lhe disse:
— Vou ter que lhe aplicar algo, senão o povo vai desconfiar.
Assim, começou a sua vingança, encheu a seringa de água e
enfiou no braço do doente, que gemeu feito um cão danado. E
depois lhe disse baixinho:
— O único remédio para curar o mal de amor que tenho é esse,
e vê se melhora logo, pois se eu voltar aqui, vou aplicar uma seringa
de álcool na sua bunda. Ou você prefere uma caixinha de Viagra?
Antes de sair, chamou em particular o compadre do doente
e lhe disse:
— Ele tá sofrendo de mal de amor, pode ficar tranquilo que
amanhã ele vai estar bem. Converse com a família toda e tente
acalmar os mais exaltados, antes que alguém morra no lugar dele.
O compadre, que era muito amigo do doente, prometeu-lhe
que ia passar no outro dia bem cedo de carro para levá-lo ao
médico. Na verdade, o compadre só queria tirar o amigo daquela
situação. Pediu a família para deixá-lo descansar em paz, pois ele
precisava de repouso. Além disso, o farmacêutico havia aplicado
uma injeção que o faria dormir a noite toda.
No outro dia quando o compadre chegou, o “ex-doente” já
estava do lado de fora de sua casa e logo entrou no carro, pedindo
para o compadre sumir com ele. Deu uma ligada para a amante
e lhe pediu para esperar a poeira abaixar, que assim que pudesse
entraria em contato.
Do mal de amor ele parece ter escapado, só não sei se deixou
a “filial” para lá. Assistam às cenas dos próximos capítulos, pois
boi que arromba cerca uma vez dificilmente para na propriedade,
só castrando.

 

Kennedy Pimenta