O Gato e o Filtro
Algumas pessoas conhecem , gostam, e sabem para que servem os Filtro de Sonhos. Além de decorar o ambiente, colocado dentro no quarto ou na porta de entrada faz com que os pesadelos não se “aproximem”. É um artefato xamânico, muito bonito, como todos. Não vou alongar-me no assunto Xamanismo, é vastíssimo e não faz parte do cerne no conto. O protagonista é o Gato.
O Filtro de Sonhos é composto de cipó maleável, uma teia feita com cordão colorido, contas, sementes, uma pedra e penas, muitas penas coloridas. Eles são usados pendurados, claro! E um gato, é um gato, ama; tudo que balança, que vai prá lá e prá cá, que é colorido, tem cordão e, principalmente, penas!!! Penso que quando eles descobrem um Filtro de Sonhos, começam a sonhar com passarinhos e salivar, já imaginando o banquete.
Pois bem , Vicência (ou Vicença) como era chamada por quem lhes deram o nome e por toda a pequena cidade do agreste nordestino, onde cactus, mandacarus, poço seco, terra gretada e animais mortos de sede, imperam; lá, por onde passou Virgulino, o Lampião, Vicência morava; era doidinha por gatos e por aquelas bandas adolescia. Acordava, cantava, saia a passeio pelas ruas de terra seca e vermelha, carregando o “Vermêio”. Ele não gostava, queria andar, correr e ela deixava, “mai só um tiquinho”. Ele corria e explorava tudo, mas sempre voltava pros braços de Vicência, ou melhor, Vicença, porque era assim que ele escutava o nome da dona.
Um belo dia, chegou “de visita” a madrinha de Vicência, dona Kalendua, nome bonito, (em homenage a pranta) como ela diz, que veio de outra cidade baiana maior e muito famosa, Porto Seguro (tem até aroporto), como ela fala).
E, como todos sabem, é por lá que encontramos o Monte Pascoal, a Cruz da Santa Missa e, algumas tribos indígenas, civilizadas, é verdade, mas que ainda vendem colares, pulseiras, brincos para esticar orelhas e bocas e também Filtro de Sonhos.
- Vicença, minha fia, vem cá, truxe um presente procê.
- O que madrinha? ailôve presente!
- Um Firtro de Sonho que os índio de lá da cidade faiz. Tive que acordá nas madruga, pá cumprá, cê sabe, moro uma lonjura da cidade. Veja, né bunitão?
Vicência olhou, virou, revirou, sacudiu e o troço colorido, balançado e emplumado atraiu Vermêio, que chegava “desimbestado” como que tivesse tomado “umas”, bebão e doidinho.
- É madrinha... mai... ter serventia? Carece pá fazê o quê? A dona Kalendua explicou do jeito que ouviu. meio barro, meio tijolo.
Vivência foi pendurar na porta do seu quarto e, antes que colocasse o outro pé sobre a cadeira, VUPT!!! Vermelho deu um salto olímpico arrancou e comeu as penas do Filtro de Sonhos.
Assim acabou o conto: com o vate da madrinha: tomara que tu vire um urubu! Vicência não se importou e o gato nem ligou, saiu à caça de outro passarinho, dessa vez, bem gostoso.
Entrou por um Filtro, saiu pelo outro, quem quiser que conte outro!
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Imagem: presente da amiga fotologuista Carla. minha comadre virtual
Conto inspirado em conversa com outra amiga fotologuista, Patrícia