CHIFRE É COISA PRA HOMEM

Naquele mundo pacato do sertão, perdido num pequeno povoado encravado entre as verdejantes montanhas e que nem sequer a conheciam por cidade mas a tratavam carinhosamente por patrimônio, Pio era um barbeiro muito conhecido em toda a região, apesar de não ser o único mas a tradição o consagrara como o melhor na arte desse oficio, assim sua barbearia vivia sempre cheia de fregueses que por lá apareciam, ou para fazer cabelo e barba ou para fofocar a respeito da vida dos moradores do pequeno vilarejo.

Ele já era um homem de idade avançada e apesar dos conselhos de alguns amigos mais chegados, alertando-o de que ele poderia arrumar pra cabeça, acabou por casar com Ritinha, uma menina nova e espevitada e não deu outra, a jovem mulher se aquietou por algum tempo mas logo começou traí-lo com um jovem retireiro de uma fazenda nas proximidades do patrimônio.

Para segurança dos amantes, ante de adentrar na casa de Ritinha ele passava pela barbearia, perguntava quantos fregueses tinha na sua frente, se quatro ou mais, rumava para casa do barbeiro, se menos, saia de fininho e ia embora, com isso o barbeiro começou a ficar encafifado, afinal de contas ele nunca fazia a barba e nem sequer cortava o cabelo em sua barbearia, por que esse interesse pela sua freguesia, até que certo dia, um amigo chegado, não se conformando com a situação, acabou cochichando em seus ouvidos algumas indiretas, o suficiente para alertar o nobre homem do que se passava em sua casa durante o tempo em que estava no trabalho.

Calmo e sossegado como era, num primeiro momento fingiu não dar credito ao falatório,mas ficou de orelha em pé e alguns dias depois, na barbearia adentrou o dito cujo intruso fazendo a pergunta de costume, o barbeiro estava despachando um freguês e apesar de alguns fregueses sentados, o barbeiro respondeu:

___ É o urtimo, pode sentá!

Apesar de tentar esquivar, não teve outro jeito, o negocio foi arriscar, pois fugir naquele momento seria muito arriscado, assim que sentou na cadeira, um tanto quanto ressabiado, foi logo informando que seria somente cabelo mas, o barbeiro sorridente alertou

___ A barba é cortesia da casa! Quem sabe o amigo num vira fregueis!

Prestimosos que era o homem cortou pacientemente o cabelo do peão, com tranquilidade, passou espuma no rosto, afiou bem a navalha e começou o serviço passando suavemente a navalha pelo pescoço do homem, num relance perguntou:

___ Mas que mar lhe pirgunte, é u moço que ta saindo côa Ritinha, minha esposa.

Neste momento o traidor suou frio, sentiu fio da navalha na garganta, só não fez sujeira na caça por não ter produto pronto, assim que o barbeiro aliviou a navalha, o peãozinho negou, desconversando e dizendo não entender sua pergunta mas o barbeiro, caboclinho de brio na cara insistiu com a navalha no pescoço do infeliz.

___ Ué, intão proque a procupação com minha friguisia quase todo dia e pruque quanto tem bastante o sinhô vai pra minha casa e quando tem poco o sinhô vai simbora? Tô achano isso muitio isquisito! È o moço sim que ta saino co’a Ritinha.

O homem suava frio, sentindo o fio da navalha afiada no gogô, sem chances alguma de defesa, o negocio foi apela:

___ Imagine seu Pio, inté viado eu sô.

Terminado o serviço, o homem mau pagou o trabalho, saiu voando da barbearia e nunca mais colocou os pés lá e nem na casa da Ritinha, o barbeiro ficou satisfeito com o resultado da lição pregada no sem vergonha, mas não demorou ela arranjou outro amante e assim viveram felizes o resto da vida, afinal de conta era ele que sempre dizia:

___ chifre foi feito prá homi, siô! O boi usa é de atrevido.

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Maciel de Lima
Enviado por Maciel de Lima em 16/05/2012
Código do texto: T3671457
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