O CAIPIRA MACUMBEIRO

"FUI MACUMBEIRO POR UM DIA"

Ao adquirir nossa propriedade rural no ano 1966, endividados, minha esposa e eu tivemos que desdobrar no trabalho, ela muito mais do que eu, como toda dona de casa do meio rural no passado, cujos afazeres domésticos iniciavam com os primeiros sinais da aurora e só terminavam a alta noite. Quando o sol nascia eu já havia ordenhado as vacas, e colocado as latas de leite a disposição do caminhão que o recolhia.

Apanhava a ferramenta de trabalho e juntava-me aos peões para a labuta diária, ora lavrando a terra carpindo, ora roçando capoeira, pastagens e outros tantos serviços necessários no cotidiano rural. Nossa luta foi árdua e penosa, muitas vezes fomos frustrados pelas intempéries climáticas que destruíram nossas plantações, tendo que adiar nossos compromissos financeiros, mas com fé a gente erguia novamente a cabeça e seguia em frente.

Hoje recordo com saudade a dureza daquele trabalho usando farrementa rudimentares que pouco rendia exigindo grande esforço físico para produzir o mínimo necessário para nos manter. Trabalhando entre aquela gente simples que sobrevivia sabe Deus como, mas gente honesta e de uma fé admirável. Gente que trabalhava mais de dez horas por dia, do nascer ao por do sol, em troca de um salário muito aquém de suas necessidades, caminhado longas distancia sempre com a maior boa vontade.

Certo dia preparando uma área para plantio, éramos uma turma de oito ou dez, não me recordo bem ao certo, lembro-me que havia um rancho de capim, noutra área próxima cuja cerca foi acerada para que o fogo não atingisse aquela parte. As paredes do rancho foram retiradas e seriam refeitas. Servindo como moradia para um carvoeiro que trabalhava nas imediações. Geralmente não se sabe por que, mas quando ateia fogo numa área logo o vento aparece metendo o bico empurrando o fogo no sentido contraria. Segundo o sertanejo na sua crença folclórica, o capeta não pode ver fogo que está logo metendo sua colher de pau nele. Fizemos todos os procedimentos para que o fogo não saltasse o aceiro, mas de repente um rodamoinho jogou fogo no outro lado, era tempo de seca e muito quente não tínhamos muito a fazer. Era bem volumosos o capim seco e o resíduo de madeira espalhados no entorno e até dentro do rancho. Quando nós vimos que não era possível conter as chamas e desistimos, numa brincadeira eu disse pra turma; vou benzer aquele rancho e ele não vai queimar. Dirigindo-me até ele tirei o chapéu dei duas voltas no seu entorno para um lado e voltei dando outras duas para o outro. Juntei novamente a eles, um entre eles perguntou-me – cocê tava fazeno sô? – Rezei uma oração brava para um lado e voltei rezando ela de traz pra frente para o outro lado! –Foi incrível por coincidência o vento virou no momento o fogo abrandou nos cobrindo de fumaça passou dentro do rancho, eu diria que de marcha ré, mas como o vento soprava ao contrario, e o rancho era bastante alto,o fogo não atingiu o capim de sua cobertura. Assim que o fogo afastou e a fumaça diminuiu, ele estava queimando alguns de seus esteios, nós o apagamos com a água de nossas cabaças.

E agora...?- Para eu convencer aquela gente pobre de espiririto, que acreditava em lobisomem mula sem cabeça e outras crendices? Tentei em vão convencê-los que não sabia reza brava nenhuma que era apenas uma brincadeira, mas para aquela gente crédula, eu acabei ficando com a fama de macumbeiro por longos anos.

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 30/04/2012
Reeditado em 28/08/2012
Código do texto: T3641191
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.