O CRUZEIRO MAL-ASSOMBRADO
Quando as estradas do nordeste ainda não eram pavimentadas, eram cheias de curvas, buracos e atoleiros. Encontrar caminhões virados era uma constante. Geralmente nesses acidentes ocorriam mortes. Era costume, na época, que a família do morto mandasse construir na beira da estrada. no local do acidente. algum tipo de construção que lembrasse aquele que passou dessa para melhor. Dependendo da condição financeira da família do falecido as homenagens iam de uma tosca cruz de madeira com o nome do defunto, construção de casinhas minúsculas, com o retrato do falecido no seu interior, cruzeiros com placas de bronze no seu pedestal e/ou mini capelas que lembram túmulos dos grandes cemitérios
É muito comum, aqui na Paraíba encontrar esse tipo de homenagem, onde moradores criam lendas sobre: milagres, aparições de almas penadas que ficam a beira da estrada dando com a mão aos carros que por ali trafegam, principalmente em noites de lua cheia. Na estrada que liga as cidades de Taperoá a Texeira existe um cruzeiro que foi edificado para lembrar um grande acidente no qual morreram várias pessoas. Dizem os moradores da região que o tal cruzeiro e mal -assombrado.
Este causo que vou contar, juro de pés juntos que aconteceu comigo no início da década de sessenta. Naquela época eu era um rapaz de uns 25 anos, estava sendo construindo em paralelo um hotel na cidade de Patos “Hotel JK de propriedade do Grupo Tropical de Hotéis” e uma série de pontes para o DER-PB, na PB-238, estrada que liga as cidades de Taperoá a Texeira .
Minha base era na cidade de Patos e como a distância entre as obras era de apenas 50 kms., três vezes por semana ia até a PB-238 inspecionar a construção das pontes. Numa dessas visitas, como uma das pontes estava sendo concretada, era a ponte sobre o rio Sete Estrelas, na entrada para a cidade de Livramento, quando retornei à Patos já passava das 23h00.
Naquela época o meu transporte era um Jeep, único veículo capaz de enfrentar as estradas de barro durante o inverno, quando elas ficavam cheias de atoleiros e intransitáveis. Eu não havia jantado e estava doido para chegar em Patos para fazer uma boa refeição.
Peguei o Jeep e segui viagem em direção a Patos, como a estrada era estreita e cheia de buracos, a velocidade máxima era de 40 km. Depois de uma meia hora de viagem numa das curvas da estrada, divisei um
vulto ao longe, dando com a mão pedindo carona, (naquele tempo ainda não havia a palavra carona, a pessoa pedia uma passagem até. ..)
Era uma velhinha, instintivamente parei o carro, ela escorada num cacete se aproxima da janela do Jeep , e. . .
- Meu fio me dá uma passagem até mais aiguente ?
- Pode subir comadre !
A velhinha tentava subir no carro mas não conseguia, desci. contornei o jeep e ajudei-a a sentar-se.
Quando a velhinha se acomodou, dei partida no carro e pela primeira vez encarei a minha companheira de viagem, era uma senhorinha de uns 85 anos de idade. De repente, me deu um frio na espinha e morrendo de medo pensei:
- Meu Deus será que esta velha é uma alma penada do
Cruzeiro ?
Não trocamos uma só palavra e eu lá morrendo de medo, quando de repente a velhinha falou:
- Meu fio ta vendo aquele cruzeiro ? Apois eu vou fica lá !
Na hora eu gelei, mesmo a duras penas consegui parar o carro e desci para ajudar a velhinha a descer. Quando ela perguntou:
- Quanto é a passagem meu fio ?
- Não é nada não comadre !
- Poi então meu fio, vamos inté lá em casa, vô lhe dá uma mão
de mio pra você fazer uma canjica !
Quando ela passou a caminhar vi bem em nossa frente a sua casa próxima ao tal cruzeiro mal assombrado. Respirei aliviado, não foi daquela vez meu encontro com a alma penada do Cruzeiro. . .