O CUMPADE QUE PERDEU O ASSENTO

Penso que toda eleição no Brasil a partir de l994 ficou parecendo uma novela, onde os coadjuvantes elegíveis fazem do eleitor o verdadeiro palhaço.

- Já invem outo né cumpade?

- Tarde cumpade.

- Boa tarde, discurpe é que ando apavorado quesse tempo passano nessa pressa que inté isqueço de cumprimentá.

- Né só ocê não cumpade! O povo de hoje é dos botão. É botão de interfone, do tar de computador, do telefone, do caixa eletrônico, do controle, de qualquer coisa. O dia que tive os disprazê de visitá mia fia na cidade grande fiquei pareceno bobão, bobão memo da roça.

- Caos de quê cumpade?

- O povo naquela corriria e eu sem intendê nada proquê que todo mundo corria daquele jeito. Oiava na cara dum, dum outo e nada, mema coisa.

- Cumo assim cumpade?

- Lá ninguém cumprimenta ninguém cumpade, inté parece quês mora junto pra se protegê dos bandido mas ês memo é tudo inimigo um dos outo.

- Deve sê isso tudo não cumpade...

- Cê que num viu. Sorta aquele tanto de carro pra rua e buzina pra cá, pqp pra lá, todo mundo cum pressa num sei pra quê e o caminho dos carro num anda. Fica iguar carreiro de formiga quando a gente cerca cum redo d’água.

- Eas perde a noção memo.

- Tar quar a cidade grande.

- ...

- E quando a gente vai atravessá um sinar de trânsito no dedão?

- Qué que tem cumpade?

- Uai, se num andá ligero, argúem passa pro cima da gente.

- Será proquê esse povo corre tanto cumpade?

- Ah cumpade, to cum vontade de filosofá munto hoje não! Ia falá dum tar de capitar que obriga o povo trabaiá pra consumi mais, mais bamo fazê diferente?

- Mais o que que nóis vai fazê?

- Tá chegano de novo o tar de carnavar, núm tá?

- Puis é, nóis ia falá que tá chegando muito rápido...

- Antão, lembra daqueas modinha de carnaval?

- Claro cumpade, quilo lá quera tempo bão...

- Lembra da Jardinera?

- E ia isquecê sô, o jardineira porque está tão triste...

- Bamo fazê um plágio dela?

- Falano isquisito cumpade?

- Não cumpade, foi minha fia que me ensino. Isso é quando a gente aproveita o ritmo de uma música e muda a letra dela.

- Antão bamo tentá; trais lá o violão proque sem fazê uns baruio a cabeça num sai do lugá.

Depois de uns goles de cachaça e um frango caipira, saiu assim o plágio da Jardineira:

“O eleitor porque está tão triste, o que foi que te aconteceu, foi o meu voto que caiu na fossa e deu dois suspiro e depois morreu..."

- Mais fico boa hein cumpade?

- Sei não.

- Mais sê acha que fico feia?

- Inté que dá pra cantá aqui nesses cafundó...

- Mais antão ce acha que o povo da cidade grande num vai gostá?

- Gostá pro dento, ês inté pode gostá mais pó fora....

- Caos de quê cumpade?

- Uai cumpade. Custoso de falá. Depois da ditadura a democracia começo a andá...

- Para quesses trem de repentistas cumpade...

- Em passos rápidos, aprendeu a roubá...

- Uai cumpade, nóis tava falano que na ditadura militar de quando em quando se trocava os generais, nessa ditadura financeira, só se troca os subordinados...

- Pára. Para.

Mais ninguém sabe parar. Tiraram o assento do pára. Parar de roubar para quê se é para favorecer o seu eleitor. O assento no pára fica até parecendo que é uma ordem; quando se tira o assento vira quase um adjetivo nesse submundo político. Para a conta do ciclano na Suíça, para com essa investigação porque o dinheiro na sacola foi dinheiro de campanha da construtora tal que tantos "benefícios" fez à comunidade, para os velhilhos da Vila Vicentina, para o presidente do Banco Central que se eternizou no porder porque não para de deixar os banqueiros se enriquecerem mais ainda...

- Ce pudia para de falá cumpade!

- Pra quê?

-

- E os políticos e empresários corruptos que lavam dinheiro na agricultura na pura cara de pau...

- Pára cumpade

- Mais num tem mais assento...

- Para os políticos e banqueiros tem assento sim?

- Antão bamo para?

- Aí tem assento sim...

- Para nóis num tem assento não cumpade...

- Nóis assenta nos toco de pau...

- Nos barranco dos corgo...

- E o povo da cidade, cumpade?

- Que que tem cumpade?

- Es toma é impé memo.

- Cumo assim?

- Nas fila de banco, nas fila da jardinera, nas fila de pronto socorro; tem fila inté de enterro, cridita? Se num visá uns tempo antes, sobra buraco não!

- Credo cumpade, dô conta não...

- Bamo para poraqui?

- Onde que é esse trem cumpade?

- Eu falei mode nóis pará quessa prosa...

- Ah, ta bão, gora intindi...

- Bamo fazê outa modinha?

- Bamo... Ce já viu ipê florir no fim do verão?

- Não...

- Olha lá pa cima na grota...

- Credo, é memo! Inté a natureza resorveu para...

- Aí farto um assento ou um r cumpade...

- Rsrsrsrs.....

JOSÉ EDUARDO ANTUNES

Zeduardo
Enviado por Zeduardo em 08/01/2012
Código do texto: T3429059
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