João Branco o Chefe dos Bandidos
Finalmente domingo, que felicidade para um garoto de 12 anos, dia de tomar “gasosa” na hora do almoço, salada de frutas com gelo e receber e mesada semanal de $ 1.000 reis, para depois ir para a tão esperada matinê do velho cinema Capitólio.
Já ao meio dia a meninada começava a chegar acompanhada pelos vendedores de “brebotes” (pipoca, fubá de milho, amendoim, rolete de cana e cocadas). Formando no estacionamento da Praça Clementino Procópio ao lado do Capitólio, uma eclética feira, onde eram negociados os mais variados produtos como sejam: “Gibis” usados, notas de cigarros, figurinhas, bolas de gude e tantas coisas mais. Ali também era o “ring” onde era travadas ferrenhas brigas entre os garotos sempre após o encerramento das matinês.
Eu morava na Praça Clementino Procópio; bem por trás do velho cinema; enquanto almoçava, meu ouvido estava atento ao barulho do grupo gerador do cinema, exatamente as 12h30 ele era acionado, sinal que as bilheterias já se encontravam abertas, ainda com a boca cheia, saía correndo em direção a grande fila já formada, onde na cabeça da mesma, com toda certeza se encontrava um dos meus companheiros de bagunça pronto a comprar o meu ingresso.
Não sei explicar bem o motivo, mas sentar-se na primeira fila de cadeiras, bem em frente a tela, dava status, e sentar na mureta que separava as cadeiras do fosso no pé da tela, onde ficava a orquestra nas apresentações de peças de teatro apresentadas no Capitólio, mais status ainda. Aquele lugar era disputado no grito e na tapa pela garotada. Na época de milho verde a molecada que sentava naquela mureta era alvo fácil das “sabugadas” jogadas lá de trás, mas, compensava o sacrifício, só prá ver: o Artista, a Mocinha e o Doidinho tão de perto.
Finalmente as 13h00 em ponto, “seu” Getúlio Cavalcante (era o gerente do cinema, senhor de idade, alto, magro austero) para arrematar a gurizada morria de medo dele.. Para iniciar a sessão era um verdadeiro ritual, primeiro era acionada uma cigarra, em seguida tocava um gongo, dois funcionários, cada um de um lado do grande salão iam fechando as janelas; pouco a pouco o cinema ia ficando as escuras, as luzes centrais presas no teto ficavam vermelhas, em seguida verde, finalmente azul, o projetor era acionado e um facho de luz cortava a escuridão impregnada de fumaça de cigarros, a garotada ficava eufórica, gritando, assoviando e batendo os pés no chão e no assento das cadeiras, era uma barulheira infernal . Os garotos que ficavam no “puleiro” (primeiro andar) subiam nas cadeiras, colocavam a mão em frente ao buraco da cabine de projeção, só para ver o seu dedo projetado na tela (dando dedo a todos). O projetor era desligado, as luzes acesas e “seu” Getúlio pessoalmente ia até o primeiro andar para trazer arrastado pela orelha o “sem vergonha” que havia dado dedo para o respeitável público; a meninada ficava em pé sobre as cadeiras para ver a saída do intruso, debaixo de uma forte
vaia. Novamente o projetor era religado e a meninada mergulhava naquele mundo de sonhos e fantasias para ver seus heróis (Allan Rock Lane, Randolph Scott, Billy Eliot e Roy Rogers)
As sessões das matinês eram divididas em cinco partes; Jornal de Noticias (Americano ou Francês), os trailer dos filmes da semana, um desenho animado (a maioria das vezes colorido com Tom e Jerry ou Perna Longa), um “short”, filme de curta metragem de “Faroeste” e para encerrar o tão esperado seriado (geralmente iniciado com o “Artista” tentando se salvar do perigo da capitulo anterior). As séries mais cotadas pela garotada do meu tempo foram: “O Besouro Verde”, “Os tambores de Fá-man-chú”, “Flash Gordon no Planeta Mongo”, “O Caveira” e “O Homem Morcego”.
Como naquela época todos os filmes eram legendados em português por João Branco, corria boato entre os garotos que JOÃO BRANCO, com toda certeza Era o Chefe dos Bandidos. . . .