"GIRDÃO DO ZÉ DO GÊNIO"
“GIRDÃO DO ZÉ DO GÊNIO”
(Theo Padilha)
Havia um cidadão em nossa comunidade que era muito interessante. Homem grandalhão, forte, destemido, filho de uma boa família. Gente pobre, mas muito trabalhadeira. Seu pai o senhor José Eugênio trabalhou muito para sustentar a sua prole.
Já o nosso personagem começou desde cedo a gostar de beber e fumar. Trabalhava também, mas vivia nas horas de folga dentro dos botecos. Chegou a se casar com uma bonita mulher. Com quem teve cerca de seis ou sete filhos. Com a bebida Girdão foi ficando preguiçoso e já não podia mais sustentar toda aquela gente. Seus filhos começaram a perambular pelas ruas da cidade pedindo tudo. Eram umas crianças muito bonitas e todos ficavam com pena daquelas crianças. O pai e a mãe iam para a bóia-fria e eles ficavam pelas ruas. O povo lhes dava muita coisa. O pior de tudo que, assim que eles ganhavam uma roupa nova, eles trocavam por doces. O mais velho começou até a beber. Havia uma menina no meio deles. E assim foi. Apesar de existirem tantas separações. Hoje, até por uma coca cola casais se separam. Gildo e a sua mulher Lúcia, nunca se apartaram.
A Prefeitura e a Igreja Católica resolveram criar uma Casa da Criança no salão paroquial, próximo a praça. Ali as crianças faziam o dever de casa e praticavam artesanato, brincavam, comiam e estudavam. O casal resolveu matricular ali seus filhos. As crianças melhoraram de vida. Foi muito bom.
Certo dia um americano entrou em contato com a Igreja e procurou saber se haviam crianças para adoção. Depois de uma reunião com os pais dos alunos Lúcia resolve ceder a sua prole para adoção. Este americano é de Tampa, Flórida, nos EUA. E quis adotar todos os irmãos, filhos do Gildo. O americano dizia que também era filho adotivo. E usou isso como argumento para conseguir junto à justiça o seu intento. E que havia uma mágoa que o atormentava. Fora criado longe de seus outros irmãos adotados. Esse americano é muito rico. E acabou levando todos para a sua cidade. Com exceção da menina que fugiu para uma cidade vizinha. Hoje ela já está casada e mora lá mesmo.
Um dia chegou à nossas mãos a cópia de um jornal americano contando como as crianças estavam. Elas apareciam muito alegres e felizes. Começaram a usar nomes em inglês. Adriano passou a ser Adrian, Juninho passou para McGildo. E assim por diante. No jornal que fora dirigido ao Juiz da comarca, havia o endereço deles. Nós escrevemos uma carta para o americano pedindo notícias, vídeos, mas ele nunca nos respondeu. Temia que os meninos quisessem voltar, acreditamos. Quem sabe hoje eles estejam na University of Tampa.
Mas a vida de Gildo não parou aí. Começou a viver seus últimos dias com uma companheira num barraco improvisado no Centro de Eventos. Um lugar de festas municipais. E uma noite quando faziam janta o botijão de gás explodiu. E o fogo se alastrou rapidamente não dando tempo dele se salvar. Sua companheira tentou de tudo. E até se queimou tentando salvá-lo. Mas foi inútil. Gildo morreu queimado. Foi o fim de mais uma odisséia terrestre.
“É aqui o combate entre o dia e a noite” (Victor Hugo, ao morrer.)
Joaquim Távora, 12 de setembro de 2011- Copyright by Theo Padilha©.