O Caso da Capa

I

Disse-me um advogado que este caso aconteceu com um cliente dele que chegara um “pouco tocado” à 38ª. Vara do Trabalho de Belo Horizonte.

O caso é que o companheiro havia tomado ”umas” e “outras” e mais “algumas” antes de se encaminhar para a audiência que aconteceria no préido da avenida Augusto de Lima.

E o fato é que entre a chamada das partes pelo datilógrafo e a entrada das mesmas na sala de audiência, o juiz havia se retirado por alguns segundos para tomar um copo d’água e esticar as pernas.

Ao retornar, entretanto, fora imediatamente recepcionado e inquirido por aquele reclamante “para lá de Bagdá”. Este, apesar de mal conseguir se manter ereto em sua cadeira, assim se dirigiu ao meritíssimo:

- O senhor é (hic)... o senhor é... é o juiz?

- Sim, eu sou o juiz, responde-lhe o meritíssimo com o rosto já fechado e sombrio...

- Mas... mas o senhor tem certeza... (hic)... tem certeza de que é mesmo o juiz, perguntou-lhe o reclamante uma segunda vez e com certo ar de quem não estava acreditando muito no que estava vendo.

- Claro que tenho! Mas qual é o seu problema? Por que afinal você está insistindo em me perguntar isso, questionou-lhe o juiz já percebendo pelo bafo e o jeito festivo do homem que não poderia dar continuidade àquela audiência e que teria que proceder ao adiamento da mesma.

- Mas como é (hic)... como é que o senhor pode ser o juiz (hic)... se nem está usando a sua capa preta?!...

II

Aquele reclamante “um pouco tocado” acreditara deveras que os juízes sempre se apresentavam em audiência usando a toga ou - como ele mesmo acabara de dizer - vestidos com uma capa preta e meio que travestidos de “Zorros”.

A capa ou a toga à qual o reclamante estava se referindo nada mais é do que uma antiga vestimenta muito utilizada pelos padres, médicos e juízes, conhecida pelo nome de veste talar. Esse termo nos remete ao fato de que a dita roupa deveria cobrir todo o corpo da pessoa que a usava, indo até a região do talo ou calcanhar.

No caso específico dos juízes, a cor do pano com que se confeccionavam as togas era a preta e simbolizava a imparcialidade e a abnegação deste servidor-juiz para com todas as partes envolvidas no processo e o julgamento deste. Devemos recordar também que o preto não é propriamente uma cor, mas a representação da ausência da cor, o que nos remete uma vez mais ao sentido de imparcialidade, distanciamento e equilíbrio.

O capelo ou borda era um tipo de chapéu usado com a roupa, mas caiu em desuso na maior parte dos tribunais. Hoje em dia, aliás, uma parcela expressiva dos juízes e juízas abandonou o uso da toga em audiência como uma maneira de se posicionar mais próximo dos jurisdicionados.