CACIMBA SECA - 1

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O gado berrando na porteira da fonte.

O homem — o pai — lá embaixo na cacimba, puxando água, lata a lata. E a água no chora-chora, minando devagarinho.

O menino — o filho — na porteira, botando o gado a beber, dois a dois, três a três, conforme fossem as reses, mais fortes ou mais fracas. Vaca pejada entrava uma a uma, para evitar que fosse espancada pelo outro gado e caísse. Vaca prenha, caída, é vaca perdida!

A cacimba — 30 palmos cavados na rocha de arenito — água insuficiente para o gado. E o gado berrando na porteira, à espera que a água minasse.

De vez em quando o homem bota a cabeça no alto, pula fora da cacimba e conta as reses berrando de sede. Repara na magreza do gado. As vacas paridas, barriga lá dentro, o couro agarrado nos ossos pontudos, sem leite nenhuma. Como é que vaca dá leite, sem pasto e sem água? Ao bezerrinhos, mirrados, encolhidos, magrinhos, de fazer dó. As vacas escoteiras, nem por isso, ainda trotando. O gado macho e as marrãs, só estes com um pouco de carne.

Bate o pé a uma rês aqui, a outra adiante, para sentir-lhes a resistência. Gado que tem forças, quando tangido de supetão, ergue a cabeça e anda aprumado. Gado fraco, troca os passos e tropeça em nada, querendo cair.

Separa as reses e recomenda ao menino:

As vacas Cumbuquinha e Chita Fina, quando beberem, passe para a caiçara. Essas aí têm que ir para o trato já, se não, caem. E depois de cair, adeus vaca! Estão pejadas.

E volta ao fundo da cacimba, a deitar para o valado a pouca água minada enquanto em cima via o gado berrando de sede. Cacimba encantada! Já tinha água de novo!

A cacimba vinha de seu bisavô. Bem assim, parte da propriedade. Ampliada pelo avô, pelo pai e por ele mesmo, depois de três divisões sucessórias, aí estava a sua fazenda de criação. Punha a água lentamente para o valado no alto, enquanto o filho botava o gado a beber, devagar, porque muito gado de uma vez em valado pequeno, dá para espancar-se e com pouco tem rês na cilha. A maior preocupação de quem cria, é evitar que a rês vá para a cilha. Além do trabalhão que dá, quase sempre morre.