O cumpadre do esperma esperto

- Bão cumpade?

- Tô nada, sô.

- Pro caos de quê?

- Tá custoso vivê.

- Tá nada, cumpade, a gente arruma um jeito.

- Arrumá jeito cumo se meu mio na coieta num vale nada e eu continuo devendo lá pro banco?

- Mas sua fia num vai formá?

- Vai.

- Antão?

- Só que prela formá eu tenho que pagá os estudo dela e o pió é que memo queu arrume os cobre nóis num tem certeza se vai adiantá arguma coisa.

- Cumo assim?

- Cê lembra que uns tempo atráis minha fia me obrigou pô televisão lá em casa, num lembra?

- Lembro.

- Pois é, onte eu vi num jornal que ia tê concurso de lixeiro lá num tar de Rio de Janeiro. Na fila da prova tinha l30.000 pessoas e quase a metade tinha diproma de quarqué coisa.

- E daí?

- Pensa bem, cumpade. Eu nessa luta danada prá formá minha fia, gastá uma vida inteira de sacrifício pra vê minha fia trabaiá de lixeira numa cidade grande?

- É cumpade, num tá certo não.

- Nesse memo jornal esses dia vi um hôme falá que toda pessoa tinha que tá alegre proquê afinar de conta, no dia que meu pai deitou ca minha mãe pra mim nascê, eu fui o felizardo numa turma de um milhão de concorrente. Pensa bem cumpade, eu nessa vida dura daqui da roça ficar satisfeito só proque nasci?

- Uai cumpade, tem argum sentido sim. Se a gente fica reclamano porque nosso trabaio num tem valor, pense nos irmão esperma que num conseguiram nem nascê? Ficaram tudo pelo meio do caminho?

- Mas será quesse home que falô isso num é da turma que põe preço nos nossos produto não?

- Cê continua disconfiado, né cumpade?

- Mais num tem que tá? Arguém me falá queu tinha que tá feliz só proque deixei 999.999 esperma pra tráis?

- Mais num tem que tá?

- ...

- Tem ô num tem?

- Sei não...

JOSÉ EDUARDO ANTUNES