O ULTIMO PEDIDO

Era um homem forte, rapaz novo ainda, não passava dos quarentas anos de idade, porem rude, não podia dizer que era ateu mas o homem não gostava de religião, não freqüentava a capela do bairro nem as festas do padroeiro e muito menos nos terços que eram rezados todo primeiro domingo de cada mês, conhecido como “Domingo de Mês” oportunidade que todos aproveitavam para se reunir numa grande partilha social e alem da reza do Terço, também eram discutido as dificuldades e solidariamente se procurava encontrar soluções, quer no plano individual, quer no plano comunitário mas qual o que, quando convidado o homem não desfazia do convide como que por educação, porem para alguns dizia não ter tempo para essas coisas de religião, assim vivia entocado em seu mundo de ilusões, sua única preocupação era trabalhar e vencer na vida, porem certo dia caiu doente.

O pobre coitado foi se acabando dia após dia, perdendo peso, tinha dificuldade em se alimentar e começou a queixar de fortes dores no estomago, até que, já enfraquecido pela doença, após procurar todo tipo de benzimentos e remédios populares, tradição do lugar, fracassado em todas as tentativas, buscou socorro no conceituado farmacêutico da cidade, homem experiente que percebendo a gravidade do caso, o aconselhou a procurar o Doutor que atendia na cidade duas vezes por semana e por sorte, aquele dia ele estava atendendo em seu consultório particular.

Vale lembrar que naquela época não existia o SUS e o falado INPS era só pra quem tinha carteira registrada, outra alternativa seria pelo então Sindicato Rural da cidade visto que era contribuinte do FUNRURAL porem não foi possível marcara uma consulta pois a entidade estava sem profissional médico para o atendimento, assim, apesar do preço da Consulta com o tal medico ser um pouco salgado para os padrões do sertanejo da época, ele não teve outro jeito senão dispor do dinheiro para tentar resolver o seu problema de saúde.

Relatou-me o rude sertanejo que doutor o examinou cuidadosamente e balançou a cabeça negativamente dizendo que o caso era gravíssimo, estava com um Câncer no estomago e necessitava ser internado no hospital numa cidade maior para numa cirurgia tentar amenizar o problema. Perguntando quanto tempo que levaria para restabelecer a saúde, disse sentir faltar lhes os chão aos seus pés quando o medico informou friamente que não tinha cura, estava desenganado pela medicina e o que ele podia fazer era receitar algumas injeções para diminuir a dor.

Diante de tal constatação, o homem se recusou ser internado e optou pelas injeções e assim voltou para casa trazendo as ditas cujas injeções de Dolantina para serem aplicadas quando tivesse dor. A principio aplicava-se uma injeção a cada três ou quatro dias porem, os intervalos foram diminuindo ao mesmo tempo em que as crises de dor foram tornando cada vez mais freqüentes e intensas, a ponto de praticamente a injeção não fazerem mais efeito algum e foi numa tarde destas que sua filha mais nova apareceu correndo lá em casa dizendo que o pai estava com muita dor e me chamava. Deixei imediatamente o que estava fazendo e me dirigi para lá, ao chegar, encontrei o homem desesperado, sentado na cama, gemendo de dor, fui preparar para aplicar mais uma injeção, ele porem me retrucou:

___ Agora não!

Parei e me voltando para ele ouvi dizendo entre gemidos:

___ Sei que você reza terço, agora quero que você reze um terço para meu anjo da guarda.

A esposa, que estava apavorada vendo o marido naquela situação, e que diga-se de passagem, viviam como cão e gato, situação que se agravou ainda mais com a doença, tão acética quanto ele, retrucou

___ Que terço esse, homem! Não esta podendo nem ficar sentado! Isso vai lá adiantar alguma coisa!

Ele manteve sereno como nunca o a havia visto, se voltou para a mulher e disse numa voz suave

___ Mulher, nós nunca deixamos Deus entrar em nossa casa, é preciso que abramos as portas de nossa casa para Ele.

Percebendo que aquele questionamento ia longe, procurei tomar conta da situação pois apesar de ser ainda jovem era muito bem acolhido por todos da casa e respeitado em minhas decisões e mesmo com o protesto da esposa eu disse:

___ Muito bem, se é o terço que o seu coração pede, é o terço que vamos rezar.

Felizmente a minha decisão prevaleceu e no momento convidei algumas pessoas que estavam visitando a família para rezarmos o Terço junto com nosso irmão enfermo e nos reunimos em torno de umas sete ou oito pessoas aos redor de sua cama. Devido a dor, ele ora permanecia sentado, ora deitava, porem acompanhou aquele momento com todo fervor, desde o principio ao fim, com agradecimento, ladainha e tudo o que tinha direito. Terminado a reza, ele se deitou, acalmou não deu sequer um gemido e tranqüilamente dois a três minutos depois, expirou.

Maciel de Lima
Enviado por Maciel de Lima em 02/02/2011
Código do texto: T2768026
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