BOATARIAS DE PARANORMALIDADE
Dizem que em tempo de crise os boatos se multiplicam como a grama, em terreno fértil. Isto pode ser verdade, já que os tempos sempre estiveram recheados de crises. Crises ocasionadas por guerras, pelas moléstias e pela fome.
Quem desconhece as crises advindas de fatores econômicos, políticos e sociais? E as crises surgidas pelas grandes catástrofes e as tragédias todas em consequência da rebeldia da Natureza?
Agora mesmo, bem recentes, três dramas horrorosos – que são crises – proporcionados pelo desequilíbrio ecológico e pela sanha de fatores meteorológicos ou naturais, como todo o mundo tomou conhecimento: vazamento de petróleo no Golfo do México, nos EUA, desmedidas enchentes no Nordeste, repetindo outras anteriores no Sul e no Sudeste e, já esta semana, um tornado doidão que, no Rio Grande do Sul, atacou as cidades de Canela e Gramado.
Falo tudo isso – e vocês sabem quantas e diversas crises e convulsões naturais e sociais têm acontecido – para tocar no assunto dos boatos sobre fenômenos de paranormalidade que assolam o interior do Ceará, nos últimos meses.
Se ainda vivêssemos nas épocas em que Antônio Sales escreveu “Aves de arribação” e D. Rachel de Queiroz publicou “O quinze”, romances nos quais se pintam os horrores da seca, vá-se lá, tudo joia e muito bem. As fofocas de manifestações mediúnicas e de almas penadas, nos sertões cearenses, boatos geradores, no mínimo, de crises de medos e apreensões, tudo isto seria justificável.
Mas, tantas petas, agora, que todos estão ligados na Internet e as secas, mercê da tecnologia e da melhora das condições sociais do homem do campo são uma realidade... Não que diga que as coisas andam maravilhosamente, contudo as condições de vida têm sido menos ingratas, e já o menor índice de êxodo rural comprova o que estou falando. Ah, logo agora, boatos associados a crises?
Pois vamos ao motor destes causos plurais que falam de manifestações e transes paranormais. Não respondo pela veracidade das potocas, mas sempre vou deitar no papel o que vi e ouvi pela imprensa. E o diacho é quem duvida.
Tudo, tudo tem se dado no decorrer de meses... Nem um ano faz ainda que a boataria fosse se propagando. E o diacho é quem duvida. Vou lá o quê!... Espalhou-se o tititi dos seguintes acontecidos, em alguns rincões do interior do Estado do Ceará, a saber...
No município de Jaguaruana, segundo o folclore local, estaria aparecendo uma “mulher cavalo”, reprise do Centauro; na lenda grega, um monstro metade homem e metade cavalo. Essa tal “mulher cavalo”, com o testemunho de várias pessoas, de preferência, literalmente, estaria botando o cavalo nos rapazes da região, a ponto de eles não mais irem a festas e outros eventos noturnos.
Em outro município, Itatira, na zona rural, onde a boataria se tornou mais rumorosa, meninas em torno de seus dezesseis anos entravam em transe, numa escola, e haja tremeliques e estripulias. Inicialmente só acontecia a paranormalidade com meninas, depois homens começaram a sentir a coisa. Enfim, a clientela predileta foi o quadro discente.
Era um corre-corre de gente e homens maçudos não conseguiam segurar direito os jovens manifestados. Objetos em torno voavam e uma geladeira abriu-se sozinha, e as coisas pulavam para longe. Para completar a crise de pavor das professoras, um televisor pegou fogo e algumas peças de roupas se chamuscaram, saindo pessoas também chamuscadas.
No lugarejo, para exorcismar o capiroto, lá foram bater um pastor evangélico e um padre, sendo que este afirmou com ciência de causa que o caso se tratava de “histeria coletiva”, pois que os jovens teriam assistido ao filme “O exorcista”. Se não verídico o laudo, boa imaginação, a do sacerdote.
O Açude Araras fica na jurisdição de Varjota, outro município cearense visitado pelas arrumações do imaginário popular. Esse açude ocupa, hoje, o lugar de um velho campo-santo, depois transferido para outro local. Aí pescadores e demais banhistas começaram a ver um monstro com cabeça de mulher e corpo de serpente. Nascia daí outra lenda, a lenda da “mulher serpente”. Digo lenda, mas todos, lá, juram de pés juntos que as aparições são reais. Resultado: o pânico foi geral, e ninguém queria ir sozinho ao açude.
Um jornal da cidade de Crato, no centro sul do Estado, noticiou que um padre de Santana do Cariri estaria virando lobisomem. Foi um deus nos acuda. E quem viu mais a mocidade da cidadezinha ter coragem para ir às festanças? Nem pensar.
Desse causo não li nem ouvi muito, mas captei que a história fora inventada pelos próprios rapazes de Santana, que discordavam dos métodos conservadores do pároco. Coitado, virou lobisomem por invencionice.
Encerrando esta saga de causos sobre fatos estapafúrdios, esotéricos e/ou paranormais, sei menos ainda sobre os acontecidos de Tabuleiro do Norte, município do Vale do Jaguaribe, onde o coisa-ruim teria feito do pessoal de lá gato e sapato.
Mas, pelo pouco que amealhei, as coisas dançavam no ar, voam como aviõezinhos de papel e objetos incendiavam à toa, sem nem para quê. A zorra atormentou o Tabuleiro por uma porção de tempo e o zé-povinho de lá se borrava de medo. Um bafafá dos diachos.
Fort., 23/07/2010.