HEROI SEM MEDALHA
Era uma frente de colonização, um lugarejo distante dos grandes centros comercial, existia apenas uma vendinha onde as pessoas recorriam para adquirirem gêneros alimentícios ou objetos de trabalho que a natureza não lhes propiciava. Era uma região inóspita, as terras eram férteis, existiam madeiras de lei, e todos ambicionavam possuí-las porem, alem dos temidos bugres e animais selvagens outro mal, quase invisível aos olhos humanos, a maleita transmitida por um mosquito que empesteava o lugar castigando os sertanejos, tanto é que todos que ali moravam já tinham tido um ou mais episodio da doença, o que os tornavam um povo debilitado fisicamente, deprimido e simples, com medo do próprio mundo.
Contou-me um velho sertanejo, que era ainda criança quando o diabo em pessoa apareceu por lá na figura do temido Tonhão, um baita dum mulato, homem bruto, violento que impunha o seu desejo pela ameaça, não tinha regras e a lei não servia de freio para seus impulsos rompantes. Devido ao tamanho descomunal, causava medo até pela aparência e pela rusticidade de seu corpo, sempre se apresentando aos farrapos, um verdadeiro indigente respeitado por todos. Vivia pelo mundo e ninguém soube explicar ao certo como veio parar neste lugarejo, talvez até refugiado da justiça de alguma cidade grande. Verdade era que Tonhão chegava fazendo arruaça, queria bater em todos que estavam no estabelecimento, exigia que as pessoas bebessem cachaça mesmo contra a vontade, era realmente infernal o grandalhão e se houvesse uma pequena desobediência a suas ordens, se irritava e dava uma surra de chicote no caboclo.
Lembra o narrador que nas proximidades, vivia um casal de irmão ainda jovem que veio com os pais na busca de melhor vida, ele um rapazola franzino de uns quinze anos de idade a menina era mais nova e uma bela garota. O sonho idealizado porem não se realizou pois infelizmente os pais não agüentaram a violência da maleita e acabaram morrendo ainda jovens, mas os dois e permaneceram morando no lugarejo. A propriedade deles ficava a algumas léguas da venda e era casal muito queridos pelos colonos vizinhos, que procuravam cuidar dos jovenzinhos com muito amor e carinho, na tentativa de substituir o amor paternal que o destino lhes roubara.
Certa tarde chuvosa, Maria e Jose, este era o nome dos irmãos, foram à venda fazer suas compras como de costume, só não esperavam encontrar o temido Tonhão, o que infelizmente aconteceu e o pior foi que o famigerado homem encantado com a beleza de menina, se sentiu enamorado da pobrezinha, dizendo que iria levá-la consigo. A menina assustada procurou se desvencilhar do monstro, o que causou certo revolta do pretendente. Os presentes no bar que deveriam defender aquela criança inocente se acovardaram talvez por medo de uma repreensão do valentão. O franzino irmão porem enfrentou o grandalhão, que puxando do “rabo de tatu” deu lhes umas chibatadas e num pescoção, arremeçou o menino porta afora e se voltou para galantear a menina que, assustada, permanecia encurralada num canto do estabelecimento.
José, muito jovem ainda, mas sentindo a obrigação de zelar pela reputação da irmã, apesar ser enxotado para fora, não deu o caso por encerrado, levantou, deu meia volta, sorrateiramente entrou na venda pela outra porta e com um pequeno punhal que sempre trazia consigo, apunhalou o grandalhão pelas costas que embora sendo uma pessoa de boa forma física, devido a gravidade da agressão, faltou-lhes as forças para revidar, encostando no balcão, já sem forças ainda fez um comentário irônico: “Pois não é que o porqueira do menino me matou” e tombou sem vida no chão frio e barrento da vendinha e o povo ficou livre daquele infortúnio.
Jose pegou a irmã pelos braços e saiu em disparada rumo a sua propriedade, verdade é que os dois nunca mais foram vistos na região, alguns tempos depois, dois homens se apresentado como sendo tios, apareceram na região, venderam as propriedades que pertenciam a eles e nunca mais ninguém teve noticias do herói e sua irmã.