O povoado, quase uma cidade. Comemora com discursos de políticos na praça da igreja o início de uma nova era. O telefone chegou! Casas de gente de posse já tinha cada uma o seu, apenas aguardando a inauguração da rede pelo candidato a prefeito, quando da emancipação, marcada ainda para o corrente ano.
Em cada residência, o dito cujo lá em um lugar de honra. Mesinha nova, toalha de crochê engomada e ele lá em cima, limpinho, cor de cinza, da Ericsson. Até que enfim, a primeira ligação, do gabinete do prefeito, para o governador do estado, inaugura o sistema que iria funcionar ainda com o auxílio da telefonista par ligações interurbanas. Um segundo depois Nêga já falava com Tonho, que mora três casas depois da dela. Jacinta já conta a fofoca da festa e comenta sobre o vestido da sirigaita da Clotilde, todo decotado, mostrando os peitos. Zé Calixto acerta a venda de fumo com o dono do armazém, apesar de ambos serem vizinhos. E assim por diante. Meia hora depois o tráfego urbano congestiona. Mas, quando ouvidos e bocas cansados, descansam, tudo volta ao costumeiro normal.

Anormal aconteceu com Dona Tonha. Ela reclama que ninguém telefona para ela. Ela já deu o número até pro seu filho que mora na capital, mas o telefone dela não toca! 
Reclama com a Telefônica.
Os técnicos olham a rede externa, confere os armários, verifica os pares, revisam a central e voltam para conferir:
- E agora dona Tonha, o telefone está tocando?

- Não, nadinha.
Os técnicos retornam à rua, olham tudo de novo e por fim resolvem: vão até a casa de dona Tonha. Entram e perguntam:
- Onde fica o telefone, dona Tonha? 
- Por aqui meu filho, na sala de visitas, ali, olhe, naquela banquinha que comprei na cidade aqui perto, só para ele. Os técnicos olham, miram, reparam, entreolham-se e perguntam: 
- Dona Tonha, porque o telefone está assim? 
- Assim como, meu filho?
- Assim, olhe, fora do gancho... O telefone tem que ficar assim, ó...
(e põe o gancho no lugar certo)
Dona Tonha, triste e desencantada fala:
- E é assim que fica? Eu deixei pendurado porque achei mais bonitinho o fio enroladinho assim, pendurado... Até pensei em amarrar a cortina com ele, mas não deu certo.

Como é que pode?... Pode, sim, e é verdade. Aconteceu. Daí em diante, o telefone de dona Tonha não parava de tocar, ou para tirarem o atraso das conversas ou para gozarem com a pobre coitada.

 
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IMAGEM: teria sido esta, a toalhinha de dona Tonha?