Como cuidar de cachorros
Eu adoro cachorro, de todos os tipos, tamanhos, raças.. eu simplesmente ADORO cachorros. Quando criança eu morava em um lugar que meu pai transformou em uma quase chácara. Já tive os mais diversos bichos de estimação, só não tive um golfinho porque meu pai disse que não era viável criar um golfinho na piscina. Em compensação já tive patos, ganso, coelhos, tartarugas, cavalos (mas esses não ficavam no quintal, mas sim na fazenda), mas sempre gostei mais de cachorro… e é assim até hoje.
Tirando Lênin, um pastor alemão que já me mordeu uma vez, já mordeu meu irmão mais velho uma vez, já mordeu meu primo uma vez, já mordeu meu irmão caçula 4934894034 vezes e já mordeu/assustou/arranhou/avançou em alguns passantes, os cachorros lá de casa sempre foram conhecidos por aquele jeito de cachorro bobão e pacato até que:
- Ah! Você ficou sabendo o que aconteceu com o Neto?
- Ahn?
- O Neto..coitado! Morreu em um acidente de moto..
- Ahn??
- O Neto.. não lembra dele?
- Quem??
- O filho da Maria.
- Maria?
- Ah! Enfim.. ela te deu o cachorro.
- Hein?? Cachorro???
E foi assim que de repente lá em casa passou a ter uma criatura que alguns chamavam de cachorro, outros de criatura demoníaca. Um fila enorme e incrivelmente sociopata, que ficava isolado no outro lado do quintal de casa, afastado por um muro e dois portões do convívio social, sendo alimentado só pelo meu pai e privado de carinhos na barriga e brincadeiras com bolinhas, por se tratar de um cachorro incrivelmente bravo. E assim seguimos nossas vidas, eu já não morava mais com meu pai e nas raras vezes que estava lá de passagem, nem chegava perto do cachorro.. sabia de sua existência pelos latidos altos e em som grave e vivia bem assim.. até que meu pai fez uma operação e eu era a única pessoa passando uns dias em casa, então, ou eu alimentava o cachorro ou ele morria de fome. Confesso que cogitei deixar o cachorro morrer de fome cada vez que ele rosnava pra mim e avançava sobre a grade, mas eu lembrei que eu adoro cachorros, então, pensei:
- Que isso.. medo eu tenho de ratos, que são animais ferozes e perigosos, vê se eu vou ter medo de um simples cachorro.
E assim, munida de muita coragem, atravessei o portão que liga o quintal social ao quintal dos cachorros e senhora de mim, peguei o saco de ração com a bravura de uma guerreira dos tempos romanos, pelo menos por breves momentos, até o cachorro começar a latir, rosnar e bater na grade do outro portão, então, como qualquer mulherzinha que se preze, larguei o saco de ração e sai de lá antes que ele descobrisse que era maior do que a grade que nos separava.
Depois dessa tentativa frustrada, como mulher adulta, independente e auto-suficiente que sou, fiz o que qualquer outra faria no meu lugar: chamei um homem.
- Ei! O que está fazendo?
- Nada. Por quê? Tá querendo fazer alguma coisa?
-Sim, estava pensando em alimentar uma criatura com corpo de cachorro e fúria de leão, está afim?
- Oi??
- Não consigo dar comida pro cachorro, ele me detesta!
- Que patinha!! – diz ele rindo – Já estou indo.
Então ele, ser do sexo masculino, senhor de si, corajoso e macho pra caramba, atravessou aquele portão, com a determinação de um William Wallace, lutando por suas crenças e menos de um minuto depois:
- Meu! Aquilo não é um cachorro… não vai dar não, Má.. não tenho coragem de encostar na grade pra por ração.. nem água.
- Ahh.. mas o que fazemos então? Não podemos deixar o cachorro morrer de fome.. chamamos os bombeiros?
- Hum… eu tenho um plano.
- Qual?
- A gente pega uma mangueira e um banquinho, subimos no banquinho e jogamos água por cima do muro, até encher a vasilha de água – diz destemido.
- E a ração?
- Uma coisa de cada vez, uma coisa de cada vez..
E assim, corajosamente, colocamos água para o cachorro.
- Já sei como colocar ração.
- Como?
- Só precisamos distrair o cachorro.
- Ah! E como distraímos uma besta demoníaca faminta?
- Tenho certeza que você vai dar um jeito.
- Eu????
- Eh.. é só você ficar lá na parte da frente da casa e manter o cachorro lá, enquanto eu entro e coloco a ração.
- E como vou manter o cachorro lá? Vou dar minha mão pra ele morder?
- Isso!!! Grande idéia
- Ahn?
- Vá jogando alguma coisa pra ele comer..
E assim fiquei, na parte da frente da casa, jogando pedaços de pão para o cachorro, enquanto meu amigo entrava cuidadosamente e colocava ração para o cachorro. Missão cumprida.
Dois dias depois, pensei novamente:
- Merda! Tenho que dar comida pro cachorro.. vou ligar para o… Ahhh! O que eu sou? Uma franguinha? Desde quando tenho medo de cachorros ferozes e com dentes afiados?
E, numa técnica milenar, aprendida nos filmes do Karatê Kid, fiquei por minutos, encarando o cachorro por cima do muro, ele me encarando e latindo, eu o encarando e cogitando latir e assim foi até que ele parasse de latir e de avançar sobre a grade. Então, determinada, entrei pelo portão, peguei o saco de ração e o cachorro voltou a latir e a rosnar, eu olhava pra ele, ele olhava pra mim.. ou ele avançava em mim.. ou eu avançava nele, mas não ia sair de lá sem colocar comida e água, já tinha decidido e eu sou conhecida pela minha teimosa. E pronto, lá estava eu, senhora de mim novamente, uma pessoa capaz de colocar água e ração para um cachorro sem a ajuda de terceiros.