O Conhaque
Josias, aos trinta e cinco anos de idade e dez de casado, inexplicavelmente, perdeu a libido.Todo o seu interesse pelo sexo desapareceu completamente. Não procurava mais a mulher, deixando-a desconfiada. Ela sofria, suspeitando de que ele arranjara outra, mas não falava nada, não reclamava. Passava os dias num mutismo exarcebado, tornando as coisas mais difíceis para ambos.
Ele procurava no fundo da mente uma explicação para o que estava lhe acontecendo, mas não encontrava. E para piorar, nem ele e nem a mulher tocava no assunto. Ela, talvez, por medo da verdade, de perder o controle e fazer uma besteira. Ele, porque tinha vergonha do que estava lhe acontecendo e além disso, não tinha uma explicação convincente para apresentar.
Furiosa, ela teimava em não tocar no assunto e mantinha-se arredia, não fazendo o menor esforço para conquistá-lo. E ele, cada vez mais encabulado com sua falta de desejos. Seu maior medo era que ela pensasse que arranjara outra e o abandonasse. Ele e ela sofriam.
E assim, foram passando os dias. À noite, na cama, viravam-se de costas um para o outro e dormiam. De manhã ele se levantava, tomava o café e saía para o trabalho. Aquilo não podia mais continuar. Pensando assim, procurou um amigo, com mais tempo de casado e, conseqüentemente, mais sabido nos assuntos de sexo e falou sobre o que estava lhe acontecendo e sem reservas, pediu um conselho, ansiando por uma resposta salvadora.
O amigo, imediatamente, perguntou se ele tinha uma amante. Disse que não, que era fiel a sua mulher. Depois, quis saber se andara bebendo ou comendo alguma coisa diferente, que não estava acostumado. Josias pensou, e se lembrou de que, ultimamente, quando saía do trabalho passava no boteco da esquina e tomava duas doses de conhaque.
- Está aí, seu problema, disse o amigo: o conhaque. Existem pessoas que ficam frias, sem vontade para o sexo, impotente, quando tomam essa bebida. Muitas vezes ela deixa as pessoas assim. Pode ser o seu caso. Você precisa deixar de tomá-la, imediatamente, para ter certeza.
Ele não pensou duas vezes. Abandonou a bebida de vez. Três dias depois, sentia-se melhor, e o resultado, era que sua libido voltara. Esperou mais dois dias e aí, teve a certeza de que estava curado. O amigo, realmente tinha razão. Sentia-se outro, e pronto para uma noite de amor com a esposa. Queria recuperar o romantismo perdido.
Naquele dia, foi para casa mais cedo. Jantou e na hora de deitar tomou banho e esperançoso, vestiu seu pijama e se jogou na cama a espera da mulher que acabara de entrar no banheiro. Nunca ia esquecer aquela noite.
Longos minutos depois, ela saiu do banho. Por sua vez, ela deitou-se. Nenhum falava. Ficaram-se frente a frente por alguns instantes, olhos nos olhos, cada qual tentando penetrar no fundo do pensamento do outro, numa luta íntima entre dois seres que, apesar de viverem lado a lado durante dez anos, pareciam dois estranhos. Ele cheio de vontade, sentia-se mais leve; e ainda experimentou até mesmo um sentimento de vitória. Entretanto, o olhar dela começou a recuar.
Tomado por uma imensa alegria, ele fecha os olhos, abraça-a e aperta com força o corpo dela no seu, na maior tesão. Ela, de olhos arregalados, se perguntava por que ele a trocara por outra. Sentia-se ultrajada. Inconformada, se desembaraça dos braços rígidos dele e o empurra, dizendo:
- Pode parar! Foi bonito abandonar sua mulher por outra! Agora que ela não lhe quer mais, você vem correndo para se consolar comigo, pensando que sou remé-dio.Também não lhe quero. E antes que ele falasse qualquer coisa, o colocou para fora da cama.
Josias saiu de mansinho, e desapareceu puxando a porta do quarto. Pela manhã, saiu de casa e desandou a beber.