UMA CARTA À CRE(DOE)NÇA MILITAR
Esta noite, acordei assustada. Coração disparado. Ombros pesados e aquela terrível sensação “... mais um dia...”. Um sonho/pesadelo trazia a tormenta do rosto de um espectro. Quem me conhece sabe que costumo acreditar muito mais nos meus sonhos/prenúncios do que em mil verbalizações.
Sentada na recepção de uma clínica, acompanhada de um amigo psicólogo (sem camisa), ocupava a terceira posição a espera de um atendimento com o oftalmologista. Cansada de esperar, a dor no cóccix me acompanha às vezes nos sonhos, meu amigo reclamou o tempo excessivo de atendimento da segunda paciente, como “cala boca” passei para outro espaço. Lentamente, a segunda paciente abre a porta da sala para sair, o espectro olhou-me com o riso irônico e a chamou novamente. Experimentei de forma mais intensa a dor, o menosprezo, a humilhação, a chacota, a desonra, os ultrajes de anos. Inerte, obediente, resistente, talvez, percebi que não me encontrava sozinha ao ouvir a voz de uma amiga:
- Para que vai alimentar esta dor?
Direcionei meu olhar em sua direção, segurei as lágrimas e balbuciei:
- Quero ir, mas não sei como [...].
Respondeu-me:
- Vamos, cure-se através de outro oftalmologista!
Respondi-lhe:
- Ajude-me!
Retirei-me apoiando em seus braços.
Pela manhã, aquele sonho tão cheio de símbolo e de tamanha realidade, marejava meus centros de força. Resolvi relatá-lo para três heroínas que me ofertaram o significado de sonhar com um Oftalmologista, em sinopse: “[...] necessidade de manter os olhos bem abertos [...] você pode ter deixado alguém te enganar por muito tempo [...] existe energia em ti para fazer as mudanças necessárias em tua vida [...] você pode corrigir o ângulo errado, a visão distorcida e refazer a sua vida [...]”. Profundo! Calei-me bastante impactada com tamanha sincronicidade, pus-me a tentar compreender a realidade e a medição de cada evento doloroso que aquele espectro, em particular, causou-me.
Lembrei-me de uma “cartinha terapêutica” de Bert Hellinger “Vá além da dor e encontrará seu bálsamo”. Confesso que, pela primeira vez, procurei olhar para a dor específica buscando acolher e nutrir (minha criança ferida, minha adolescente ferida e minha adulta ferida). Com elas chorei e disse-lhes: Quantos choros solidificados em nosso corpo! Quantas pessoas deixamos despejarem seus lixos emocionais em nós! Quantos comportamentos lesivos, maledicentes, sarcásticos, ultrajantes deixamos “cortar” a nossa alma! Quantas vezes fomos julgadas, violadas, injuriadas, difamadas, feridas, criticadas, enganadas por pessoas que não viram nossas dores nem mesmo sabem a respeito de nossas histórias! Quantas vezes deixamos que nos assassinassem em doses homeopáticas!
Sim, somos responsáveis pelo que cativamos, mas também responsáveis pela forma que assassinamos emocionalmente o outro. Mesmo quando nos escondemos ou nos filiamos à ideia de que apenas se é responsabilizado (pelo Estado) por um assassinato quando “crava-se um punhal, tira-se o pão, não se permite a cura do outro, deflagra-se um tiro, condena-se a miséria ou se impõe o trabalho-escravo”. Não! Absolutamente que não! Ao contribuir com o autoextermínio de outrem, ocorre um emaranhamento orquestrado pela Lei de Ação e Reação.
A segunda “cartinha terapêutica”, revelou-me o seguinte: “Somos 50% responsável pelos “males” que nos causam”. Respirei, indaguei e pus-me novamente a refletir com (minha criança, minha adolescente e minha adulta): Se tivéssemos nos posicionado de forma a pôr limite nas atrocidades que nos fizeram, teríamos adoecido tanto? Se tivéssemos dito NÃO/BASTA/PARE àqueles que despejaram seus lixos emocionais em nós, teríamos adoecido? Se tivéssemos compreendido desde o início que a pessoa mais importante de nossas vidas deve ser nós mesmas, teríamos tolerado tantos desrespeitos, descuidados, desamor?
O verbalizado pela minha amiga no sonho, talvez seja a representação da terceira cartinha/colírio “Toda doença ou desagrado vem como resolução de um conflito”. Tomara que a imagem da saída daquele espaço caminhando, apoiada pela amiga em direção a um novo oftalmologista, seja a metáfora perfeita para uma ressignificação de tantas crenças que nos limitam e nos aprisionam a dores inenarráveis. Que seja, para mim e para você, a metáfora perfeita para a construção de um NOVO futuro, deixando de trilhar por caminhos trevosos e com as lentes embaçadas, ampliando a consciência de maneira saudável, a fim de enxergar a LUZ que não ofusca, que não distorce, que não cega, que não mata.