A SUA PARTIDA
O meu corpo está uma completa bagunça, tem sido assim desde que ela foi embora. O meu carro tá bagunçado, as minhas roupas, as anotações e até o meu calendário. Perdi um pouco da noção entre os dias que se passam e só consigo me lembrar que já faz tempo desde que a vi pela ultima vez. Não estou falando da semana passada quando a encontrei na balada. Já faz tempo desde que a vi pela ultima vez como eu costumava vê-la; de alma nua, um pouco brava e com um sorriso de criança. Tenho visto ela em muitos lugares vestida com armaduras, nem é ela mesma. Vi sorrisos que não sorriam com o olhar como costumava ser. Me sinto inábil. Mas entendo por vezes a escolha dela. Me perguntei centenas de vezes onde eu errei e em alguns momentos acho que não errei. Eu ainda não sei. Por um tempo eu parei de me perguntar, não só isso, mas muitas outras perguntas que poderiam me dar uma explicação sobre a sua partida. Cedi o meu corpo para outras pessoas a fim de me sentir curada sobre ela, e não foi ruim, o meu corpo e a minha vida estavam com muitas pessoas em volta, mas a minha alma estava vazia no fim das contas. Soube disso quando sonhei com ela dias atrás. Sonhei com algo que costumávamos fazer juntas: eu abraçada ao seu corpo para dormir parecia real em carne e osso. Acordei pulsando saudade. Eu chorei saudade. Eu vivi saudade. E eu engoli esse sentimento mais uma vez. Eu estou bem, repito; por vezes eu imagino que do outro lado da cidade ela diz o mesmo e nós nem acreditamos nisso. Eu rezo para que ela esteja. Todos os dias. E então eu volto a vê-la e enxergo em seus olhos o contrário de estar bem.
Hoje eu encontrei um amigo que há muito não nos víamos, ele perguntou sobre a minha vida e instantaneamente eu comecei a falar dela, ele me ouviu por duas horas e eu falei todas as coisas boas que conheço e sei sobre ela. Falei sobre ela ter sido escolhida por Deus desde que nasceu e para muitas outras coisas que ela nem faz ideia e/ou não consegue entender. Falei sobre a força que ela tem porque eu acho que não conseguiria passar por metade de tudo o que ela já passou. Ela costuma dizer que eu não entendo, mas não sabe o quanto eu tento e me coloco no lugar dela para entende-la. Falei sobre a sua pureza que conheci quando estávamos juntas. Falei e dei risada quando me lembrei dela encarando algumas meninas que me olhavam. Eu não posso mentir, sinto falta até dos gritos dela perguntando "cadê a minha mulher?" quando eu saía de perto. Eu juro, não era no sentido ruim. Era da forma mais fofa que pode existir... Entre tantas outras coisas que me faz mergulhar na saudade... Eu tenho total consciência sobre os erros que nos magoaram, ambas as partes, e depois de muito chorar e pensar neles eu aprendi e consegui separar e guardar tudo de bom que tivemos. Jogaram o seu passado na minha mesa, não uma, muitas vezes, e não vou dizer que foi fácil passar por cima, mas eu a amei um dia e tirei coisas boas disso e joguei todo resto fora. Não me importa. Quando penso nela eu não consigo acreditar que a pessoa que existiu pra mim simplesmente não existe. Quando penso nela, ainda vejo a mulher incrível que eu conheci e me apaixonei. Eu não sei quem ela tem sido agora, mas sei que também me apaixonaria por essa versão. Mas eu continuo aqui lembrando dela quando olho pro meu quarto, quando chego no bar e vejo o seu nome escrito em letras grandes na parede, quando passo onde ela gostava de comer esfiha e até quando olho pra minha cachorra. As lembranças me desmontam. Principalmente quando tratam-se dos planos que fazíamos juntas que por vezes podiam ser loucuras, mas eu queria mesmo assim porque só pensei esse tempo todo em fazê-la feliz e não me importava se para isso eu precisasse pular de paraquedas tendo medo de altura. Pra resumir, amar essa mulher não está apenas tatuado em forma de abacaxi no meu corpo, parece estar tatuado no meu caminho e na minha alma e eu simplesmente não consigo apagar e esquecer, mas as suas ultimas palavras foram “você no teu canto e eu no meu”, e é quando eu jogo todos esses meus sentimentos num canto e volto a viver a minha vida sem ela. Como toda essa bagunça eu já nem consigo pensar no tempo...