Espero Faróis, mastros e velas !!
eço desculpas ao leitor por não dar-lhe hoje o prazer de um texto simpático, mas prometi a ti e a mim a minha sinceridade. Abro o peito por cima do teclado, nele deixo cair o que há. E o que há, em alguns dias, é gozo, é felicidade, é beleza e amor. Em outros, esta coisa disforme. Hoje há um desânimo, uma não-vontade que não combina comigo. Eu que sou enérgico demais, incomodado demais, me sentei no sofá dois dias atrás por e duas horas fiquei. Comi, conversei, pensei. As malas para visitar alguns parentes na cidade vizinha estavam nos meus pés, a hora de descer para a rodoviária passava com todos os seus minutos e segundos. O relógio contava o tempo como o tempo deve ser contado, e não há nada mais irritante que um relógio que faz o seu trabalho direito. Ele não corria, para que eu pudesse voltar logo para casa. Nem sequer andava devagar, para assim acalentar a poesia da minha saudade. Era um tic tac regular, sério, pontual. Quem já viu relógio pontual?
Então, eu ando. Eu vou a todos os lugares, eu vejo todos os rostos, tudo é novo. Há os textos que me animam e me distraem, há o mundo no qual pareço não ter lugar. O lugar ao qual pertenço não é um lugar, são pessoas. O lugar onde quero estar não é físico nem estático, mas move-se longe daqui. Eu que tanto sonhei em sair, eu que tanto sonhei em estar longe. Eu que era outro menino e agora sou este homem. Eu que queria intensidade e às vezes me canso dela, eu que gosto de estar bem. Eu que não me sinto bem. Eu que tenho os olhos caídos e entediados, desinteressados e murchos. E, com tanta frequência, molhados.
Eu que não tenho prazer no toque. As coisas que quero tocar não estão aqui. Eu que não previa esta falta. Eu que não sabia o quão apegado eu era. Eu que mudo meus sonhos com tanta frequência desde os dezessete anos, que agora já se tornou natural. Não espero muito. Tenho uma lista reduzida e vaga de coisas que me são preciosas, como pequenos souvenirs. Esqueci-me de pesar o presente na balança dos atos recentes, preso aos meus esforços do passado. Preso a tudo o que já passei para estar aqui, não me questionei se valia a pena, dadas as atuais circunstâncias, estar. Dado o atual Eu. Jogo dados, então. O futuro sempre está a própria sorte, e nele navego sem bússola. Nele espero um eu futuro, talvez consonante com o eu de agora. Nele espero uma luz, ou várias. Espero faróis, mastros e velas