Um bilhete - a ti (22.09.2014)

A ti, que não é mais um menino, porque a vida tem começado lentamente a desiludir-se pra ti e, dessa forma, te desiludir, nem tampouco é um homem, pois tu ainda de alguma forma mística sofre visivelmente nos teus olhos sem conseguir esconder isso e, pelos deuses, espero que isso jamais mude... a ti, queria dizer que isso não é amor, nem nunca será. Me dizer, às onze da noite, entre os goles daquele vinho barato que eu odeio e que mesmo assim a gente - querendo dizer, com isso, tu - compra toda sexta-feira, dizer que o menino – esse sim, menino mesmo – que você é apaixonado te cortou o coração por não ter tido coragem de olhar na tua cara ou responder aquelas mensagens ou ter ao menos aceitado teu abraço naquela noite, não é amor, nem nunca será. É possível que você seja como eu e esteja apenas tentando se convencer que não conhecer os olhos ou os lábios de alguém é deseja-lo imensamente, é apaixonar-se perdidamente a ponto de reclamar da vida mesmo sorrindo ridiculamente no meio da aula da manhã, mas nós dois sabemos que isso é uma terrível ilusão, talvez induzida ou pelo nosso eu mais íntimo, ou pelo mais superficial, e isso, meu querido e amado, é uma dificuldade nossa – como um todo – em admitir que não amamos ninguém e, dificuldade maior ainda, é saber que não escolhemos não amar alguém, as coisas simplesmente são como são. Eu sei que tu quer que nem eu quero - e isso quer dizer, exatamente, querer muito - mas não podemos escolher, assim, “é este!”, ou chegar, depois de quatro cadeiras de cálculo e duas de lógica, a um denominador comum que seja “avaliando, essa é a escolha mais sensata e a que tem mais chances – percentualmente – de se encaixar e, por isso, eu amarei”, ou melhor, até podemos dizer isso, mas isso não é amor, nem nunca será. Por mais que lutemos para convencer os outros – tentando, com isso, provar para nós mesmos – que estamos apaixonados, viciados, que agora realmente amamos, isso é uma terrível ilusão, tenha a bondade de admitir isso a ti mesmo. O amor é mais complexo que isso e infinitamente mais simples. Mas olha, se te servir de consolo - ou talvez de desespero - eu te amo profundamente, mas não te desejo... ou melhor, te desejo, sim, mas não quero te possuir jamais. Estou começando a entender essas sutilezas, mas para você as respostas ainda tem que ser mais diretas.

E sobre aquele outro, eu queria te dizer que, sim, ela tinha razão, e por mais que tu te esforçasse – coisa que não deveria ser assim, um esforço – você jamais conseguiria olhar para os olhos dele e dizer, realmente, que ele era o mais importante na tua vida e no teu coração e, olha, não é tua culpa. Ela me disse e eu não acreditei na época, mas agora eu sei que não é tua culpa. Se ele te culpar, paciência, sei que ele deve estar magoado como eu mesmo fiquei um dia, é aceitável e até mesmo natural, mas veja, não volte atrás, não é tua culpa e tu não deveria. Tenha paciência para se curar.

Amo você, e nesse processo aprendi a me amar também,

D.C.