S A N G U E
Há oito dias que não durmo…
As imagens estão gravadas no meu cérebro. Não sei como tirá-las.
Continuo com as mãos sujas de sangue, tento raspá-lo das unhas, mas, está já entranhado. Nada sai. Não consigo tirar da cabeça o corte da garganta, a profundeza do interior humano.
Há oito dias que tenho visões…
Não consigo, ainda, entender o porquê. O que terá despoletado aquela loucura, todo aquele sangue, toda aquela monstruosidade. A faca a cortar pescoços, a tirar corações e os olhos, os olhos mataram-me. Incendiaram o mal que havia dentro mim, saiu tudo! Odeio olhares!
Há oito dias que tento rever o que se passou…
Claro que a culpa não é minha, eu não queria fazer nada de mal, a ninguém. Nada!
Mas, aquela voz, aquela cara, aquela língua, aquele frasear de palavras, aquele olhar, tudo, tudo…mais ninguém devia ter aparecido… tive de calar todas as vozes, todas as bocas, tirar todos os olhos.
Há oito dias que não sei como as pessoas vão encarar estas mortes…
...Raios para todos! Estava tão bem a tomar o meu café, após deliciar o cortar da garganta, que não parava de rugir...porque tinhas de aparecer? Agora tenho de arranjar mais justificações! Raios! Terei que os cortar em pedaços mais pequenos...
Há oito dias que não sei nada do mundo, estou aqui fechada intoxicando com este cheiro, e, banhada nestas águas sujas...tento...
...Por muito que tente explicar, tal não existe...apenas fiquei farta, tudo me incomoda neste momento, incomodava...
Talvez, nunca se tenham apercebido, mas, para nos entregarmos a este estado de “loucura” não é necessário muito, basta pensar...apenas deixar de pensar...talvez...
As pessoas irão questionar os meus actos, irão chamá-los de monstruosos, mas eu apenas os considero um grito de ajuda!
Tudo bem, que pessoas inocentes tiveram que morrer, mas, a vida não é justa! Nada é justo, vejam!
Olhem para mim, agora!
Foi justo?
Serão justos?
Claro que não! Ninguém o é.
...Estou cansada, vou tentar pousar a cabeça e descansar...Sinto a cabeça à roda, o coração fraco, falta-me o ar...
Há oito dias que não durmo...agora que estou a conseguir...a luz da rua não me deixa...estão a bater à porta? Quem será?
...Não se mexa!