Ensaio na cegueira



Fico deitada no escuro imaginando o primeiro erro.
Talvez tenha sido no dia em que duvidei de mim ou quem sabe na primeira fala torta.
Não sei e por mais que tente lembrar vejo tantas cenas dispensáveis que me cubro ora de arrependimento, ora de vergonha.
O fato é que palavras ditas são palavras lançadas ao vento e na maioria das vezes também na alma.
Nestas minhas reflexões sempre penso no poder do mal e na afinidade que temos com ele. Se assim não fosse, seria bem mais fácil lembrar e viver apenas as coisas boas e esquecer no segundo seguinte tudo o que não fosse construtivo.
Este, é o princípio de todo sentimento bom.
Portanto, me pego refletindo no que tenho feito e no que tenho alimentado e confesso que por mais que me esmere, minha cegueira é tanta que às vezes não compreendo.
Sinceramente, se eu fosse só um pouco mais inteligente, lembraria apenas dos sorrisos gigantes, dos planos e sonhos, dos dias de sol e das noites de chuva no aconchego.
Se eu fosse só um pouco mais compreensiva, passaria meu tempo a imaginar as noites de contos e fantasia, as viagens em estradas erradas cheias de belas paisagens, os vinhos descobertos à beira do caminho ou as infindáveis declarações derramadas com carinho.
Se eu fosse só um pouco mais forte, saberia que só existe a verdade, que a unidade é feita sim de dois, que fortaleza é admitir os medos, que construção também é feita de aceitação.
Se eu tivesse mais calma, respiraria a cada frase cortante, a cada expressão de tristeza ou a cada dia com menos cor.
Porque pessoas são assim, instáveis. E a instabilidade não tem a ver com falta de bom senso ou mesmo de amor.
Se eu tivesse discernimento, gritaria todos os dias, não as frases afiadas da navalha emocional, mas os cantos de quem quer viver intensamente, amar profundamente e gargalhar escandalosamente a cada piada boba mas cheia de boa intenção.
Se eu fosse tolerante, dançaria nas noites de estrelas, beberia de todos os vinhos, pintaria outros quadros e escreveria outros livros, todos, absolutamente todos, por você.
Se eu fosse apenas um pouco mais coerente, aprenderia a agradecer pelas dádivas, pelos momentos de alegria, pela imerecida vida que é oferecida, mesmo com tantas tentativas e muxoxos para torná-la menos bela.
Mas eu não tenho e nem sou nada disso.
Sou errante, ácida, impulsiva, intensa, descomedida e quem sabe até um pouco inconsequente.
Sou confusa, atribulada, questionadora e inquieta.
Sou intensa, veja você, até na minha profunda falta de tato.
Sei bem do metal com qual sou feita.
Porém, no meio de tudo, acima de tudo, a minha verdade não muda e a minha fala nunca deixou de ser a mesma. Ela ainda me mostra o paraíso guardado nos olhos de todos os tempos.
Edeni Mendes da Rocha
Enviado por Edeni Mendes da Rocha em 24/07/2013
Reeditado em 24/07/2013
Código do texto: T4402104
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