O BRASIL REAL

Perguntaram-me outro dia se daria minha vida para preservar a de algum grande líder político de meu país. Não hesitei em responder e disse que não. Por que não faria isso? Não sacrificaria minha vida pela vida de todos eles juntos. Não valeria a pena. Jamais valeria. Por que dar minha vida para salvar a vida de alguém que não tem compromisso algum por menor que seja, por aquilo que chamamos de nosso país?

Existiram em alguns momentos da história da humanidade, líderes que daria a minha vida para salvar a deles. Pois estaria preservando o futuro de toda a sociedade. Líderes que pensavam primeiro no futuro de seu povo e em último caso no seu próprio. É uma pena que não existam mais pessoas assim. Acho que não veremos mais esse tipo de ser humano.

Envergonho-me a cada instante que reflito sobre a estrutura governamental de minha nação, meu povo, minha sociedade. É alarmante o grau em que a mesma se encontra no que se refere ao conjunto de seus líderes. Meros inimigos dos princípios morais e éticos, que fundamentariam as bases de qualquer sociedade que almeja o sucesso, a liberdade, a democracia, princípios fraternos, respeito, a igualdade e a própria ética e moral.

Quantas pessoas vivem um sonho de que o Brasil é uma sociedade onde tudo isso tem lugar de destaque. E não conseguem abrir os olhos para o real mar de lama em que essa sociedade medíocre está mergulhada. Como posso falar em igualdade no Brasil, se sei que a lei não tem o mesmo peso para todos? Pois uma sociedade onde um magistrado é punido, não importando a gravidade de seu crime, com a aposentadoria integral e compulsória, posso falar em igualdade de direitos? Como posso falar em igualdade em uma sociedade que concede aumentos a classe trabalhadora não importando a categoria subalterna, de no máximo 7% e na classe de políticos de carreira esse aumento é de no mínimo 60%? Doce ilusão essa em que estamos mergulhados. Mergulhados em um mar inebriante de ilusões de igualdade.

Voltando ao que comentei no primeiro parágrafo, daria sim minha vida pelo meu país, mas pelo meu país, jamais pelos meus líderes. Seria tirar a sublime razão de ter existido. E não quero isso para minha memória e minha essência.

Já vi colegas meus se surpreenderem com a sociedade de castas da Índia (algo que já está desaparecendo). Às vezes dizem: “Como pode um povo viver sob princípios tão arcaicos como os indianos, vivendo sob um regime de castas?”. Refaço a pergunta, colocando o personagem Brasil nela: “Como pode uma sociedade existir pautada sob princípios legais tão absurdos de desigualdade, falta de justiça, obtusidade legal, privilégios da classe dominante, leis criadas para favorecer grupos dominantes, entre muitos outros absurdos?”.

Jamais compactuarei desses desatinos convencionais pelos quais estão edificadas as bases de nossa sociedade. Vemos que nosso povo sofre de um mal que atinge sociedades pelo mundo afora, em maior ou menor grau, que é a incapacidade de entender a realidade. E isso é fruto também do espírito individualista que está inserido nos corações de cada um de nós, infelizmente.

Penso no futuro sempre, mas só vejo os mesmos vícios do passado dessa sociedade que sofre. Triste sina de quem não consegue mudar as previsões de seu futuro. E continuamos mergulhados em um mar de esperança e igualdade ilusórias. Amo meu país mesmo assim. O meu país apenas, não seus líderes.