Aulas

Tudo por aqui está bem pacato. Poucas e produtivas aulas. O professor vem dar aula de chinela havaiana, os pássaros cantam em nossa janela. O sol matinal não faz arder a pele, dá apenas uma aquecida gostosa de sentir. Aqui a faixa de trânsito é respeitada. Defronte a minha sala tem uma árvore frondosa. Cães e gatos dividem o espaço conosco , brincam e vêm pedir dengo. Paro para pensar o quão é esquisita essa situação, reflito e vejo que esquisito era estudar em uma gaiola de quatro andares em meio a um trânsito caótico, poluição, barulho, stress.

Minha qualidade de vida aumentou; no intervalo tem pão de queijo e tapioca quentinha, no almoço tem um feijão gostoso e , apesar desse ambiente aconchegante, as pessoas transitam pelos corredores sem dar ‘bom dia’. Parecem tropas marchando para a guerra. Guerra do conhecimento? Guerra do mercado de trabalho? Sou muito nova para lhes responder. É nessas horas que sinto falta daquela perguntinha que parecia tão banal: “O que você está pensando?” Essa pergunta que por vezes me fez corar as faces. Parecia ser tão fácil responder; aquilo que eu queria comer, o medo que eu estava sentindo, o sonho da noite passada. Ninguém me pergunta o que eu estou pensando, nem eu, equiparo-me a todos. Estou perdendo a essência ou me adequando ao mundo? Todos têm algo a dizer, mas a maioria das pessoas nunca ouve.

Aqui os professores nos ensinam a sermos bons profissionais, mas temos que aprender sozinhos como sermos boas pessoas. E apesar da natureza próxima, soprando-nos um ventinho que dispensa condicionadores de ar, ninguém amolece o coração. Ah, queridas! Ainda insisto em dar ‘bom dia’, em mexer no cabelo da amiga, em chutar os gatos. Ainda insisto em sustentar um oceano no peito.

Tamyle Ferraz
Enviado por Tamyle Ferraz em 25/02/2011
Reeditado em 25/02/2011
Código do texto: T2813350
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