Páginas de Luiza I
31/01/09 manhã O dia de ontem foi uma tempestade que passou pela minha vida, em algumas horas perdi minha filha e quase perdi a vida. Tudo aconteceu de forma rápida, muito rápida, e ao mesmo tempo muito lenta. Por volta das 20:00 entrei no msn e já estava com dores, parecidas com cólica, iam e vinham, parava e logo as pontadas voltavam. Duas horas depois, fui deitar, e as dores aumentaram, comecei a sangrar, mas nem assim me entreguei, lutei e muito contra a dor. Voltei ao msn, zonza, sem ar, com muita dor, mas eu precisava estar ali, pois ali estava a única pessoa que se importava comigo. Cheguei a cair duas vezes, mas não perdi os sentidos, lutei para ficar acordada, não foi fácil, ler, escrever e pensar, quando meu corpo queria cair, se entregar a um sono talvez eterno. Lutei pela vida de aninha, fui forte, ela também, mas ela não resistiu. Sei a hora em que ela morreu, pois senti duas pontadas, que só não me mataram porque eu sou forte e consegui vencê-las. A primeira, foi uma pontada que me levou ao chão, tamanha sua força, ali eu soube, que o coração de aninha parara de bater, essa pontada foi seguida pela dor da perca. Perdi minha filha. Juntei forças e escrevi algumas linhas para ela. Meu socorro veio e após fazer um pedido para uma amiga, me entreguei. Não foi apenas um desmaio, foi uma quase morte. Fui levada ao hospital e já cheguei lá em coma, os médicos disseram que eu havia morrido, depois de segundos constataram que meu coração ainda pulsava, firme, e fraco, mas mesmo assim, forte. Ainda não sei exatamente quanto tempo fiquei em coma, foram algumas horas, mas sei que se não fosse isso, o médico que me atendeu não teria chamado sua equipe e não teriam visto minhas feridas. Estive dormindo desde que cheguei, mas quando acordei, os médicos me fizeram assinar um termo de responsabilidade, pois eles iriam cuidar de mim. Ainda na madrugada, fizeram a curetagem, tiraram aninha de dentro de mim, mas não a tiraram de dentro do meu coração. Estou sendo medicada, pois daqui a pouco entrarei na sala de cirurgia, pois a curetagem acabou definitivamente com o que restava de meus vasos e veias vaginais. A cirurgia tentará reparar os vários estupros que sofri nas mãos de meus algozes. Que deus esteja comigo, e se ele me levar, alguém por favor transcreva essa carta e mande á todas as vítimas de abusos. Que elas leiam e denunciem antes que seja tarde, tão tarde quando o momento que estou hoje. 31/01/09 tarde Graças a deus não morri, estou viva, muito zonza, e com muita dor, passei por uma cirurgia de reconstrução vaginal, estou com dificuldades para escrever, pois o efeito da anestesia ainda não passou, a dor começa a se tornar insuportável, mas preciso me manter firme, mal enxergo o que escrevo, mas tenho de terminar isso antes que eu morra. A cirurgia durou 3 horas, o médico responsável pela equipe disse que a cirurgia foi ótima, pois não houve hemorragia, mas que precisará de mais cirurgias para reconstruir minha área íntima. Essa segunda cirurgia será mais complicada, pois estou muito fraca e se perder sangue morro. Antes da cirurgia pude ver as pessoas que me ajudaram, agradeci por tudo, elas me disseram que sou uma garota forte, uma menina de ouro, não sei se concordo, forte eu sou, mas de ouro, não. Dentre as pessoas que me ajudaram, faltou uma, que chamo de mamys, sinto muita falta de uma amiga, queria ter ela aqui comigo, mas não posso, me contento em ouvir sua voz ao telefone e sonhar que um dia nos abraçaremos. Sei o quanto a amo, se ela me ama? Bem, espero que sim, e se não me amar com a intensidade que a amo, tudo bem, amo por nós duas. Sobre aninha, prefiro não pensar nela agora, preciso sobreviver a essa luta primeiro. E depois que eu estiver bem, volto a pensar nela e aí poderei passar pela dor da perca. Dor saudável, até, mas nesse momento não posso vencê-la, então, estou adiando, não estou me iludindo, ela morreu, mas não quero digerir isso agora. Não estou agüentando escrever, dói muito. Estou escrevendo isso por 3 motivos: 1- dar noticias minhas para mamys. 2- Nunca esquecer que sobrevivi a tudo isso. 3- Caso eu morra, quero que essas páginas possam ter algum destino útil, estou escrevendo-as para que vítimas de violência possam Lê-las e ajam, antes que seja tarde. Se você está lendo isso, significa que morri ou que estou bem perto disso, se você é ou foi vitima de algum tipo de violência, denuncie agora mesmo e se cuide, você merece.
Parte II