DE MIM MESMO PARA O OTÁRIO QUE SOU
“A dor é inevitável. O sofrimento é opcional.”
(Carlos Drummond de Andrade)
Despropositado, sei bem, mas mantive interesse por você. Encantava-me em alguns aspectos.
Entendo que é bobagem procurar a personificação daquilo que consideramos perfeito, e você não é! Nem imagina o quanto tens de defeitos. O convívio contigo, Fabiano, é insuportável!
Procure me explicar — ao menos uma vez, te peço — a razão de suas evasivas, seu desprendimento com o banal, com a realidade. É horrível dizer, mas sua dose de autismo me incomoda.
Das máscaras que usa — você disse que a Nélida Piñon escreveu sobre elas —, a que veste pela manhã é a que te esconde de ser diferente, as outras guardadas no armário as traças extinguiram. Esmurrá-lo não basta, um grito de acorde muito menos.
Falo só! Próximo, ignora o que digo. Joga-me na insignificância.
A relação é complexa. Não sei como conviver, ainda que eu goste.
Ignora, impede que eu viva ao pedir que me cale. Anseio que me escute, que me responda e permita adentrar em seu pessimismo, seu ostracismo, sua repugnância interior.
Tudo pela covardia.
Se desfaz, suicida-se inúmeras vezes e no fundo respira.
Deveria partir, mas sou impossibilitado. O Fabiano vivo sempre estará dentro deste Fabiano inerte.
Meus gritos se cansam e logo serão sussurros e, apurando os ouvidos ao perceber que deve ouvir, talvez não acorde, o sono se prolongue e desiludido eu também durma.