Um inverno
Sinto um frio percorrendo meu corpo por inteiro. Como se ao invés de sangue fosse gelo correndo em minhas veias, deixando minhas unhas azuladas e até mesmo enegrecidas. Sangue frio, gélido como uma noite de inverno intenso.
Como um objeto sem valor, vou trocando de lugar, perambulando os cômodos da casa. Sinto como se fosse uma coisa qualquer, nunca fui prioridade na vida de ninguém, sem significado nem nada. Deixo-me ficar inerte apenas observando o movimento do meu abdômen conforme respiro.
Tudo passa muito rápido por mim, quase não dá tempo de tocar ou avistar. Olho minhas mãos e percebo a fragilidade de minha pele, ela já foi mais bela. Examino meus olhos e sinto falta daquele brilho que um dia eles tiveram, daquela alegria que um dia eles transbordavam. Sinto falta de tantas coisas, do cheiro adocicado do verão, do calor do sol queimando minha pele pálida. Aquele céu maravilhosamente azul durante o dia e perfeitamente estrelado à noite.
O inverno é como um adeus demorado e sem volta. É triste e frio demais, não consola e nem acalenta, para sempre se mostra presente na memória. É como uma despedida de namorados que sentirão saudades até o próximo encontro, quando se verão novamente e se beijarão com paixão.
O inverno é como a tristeza, como a lágrima que cai após uma desilusão. Porém ele chega ao final após três meses de desespero. Por olhar um céu acinzentado, agora eu adoeço, mas sei que em setembro meu corpo voltará a florescer e meu sangue ficará demasiado quente.