(Texto inicial publicado na íntegra em jornal da época).

Com pesar, nos vemos privados do convívio do companheiro Maurício de Oliveira Araújo, co-piloto falecido recentemente no Rio de Janeiro. O grupo de vôo, sensibilizado, registra aqui seus pêsames aos familiares de Maurício, com uma nota Comte. Figueiral, do Grupo B-767.

“Do pai ele não falava, tal era a dor".
Por nosso lado também ninguém perguntava, tal era o respeito por aquele que já tinha ido, como pelo que ficou. Era assim, e para vocês que não o conheceram, gostaríamos de passar através desse escrito, um pouco do quão querido ele era, e que grande profissional perdemos.

O que mais me chamou a atenção em você, Maurício, foi o respeito com que tratava as pessoas, fossem elas quem fosse uma bela herança deixada por seu pai em conjunto com essa brava mulher, sua mãe. O seu interesse por tudo e todos chegava a ser comovente, parecendo-nos que estava como a mostrar a seu pai a quão perpétua e imaculada sua imagem seria mantida. Temos certeza que agora, quando para o lado dele você retorna: Parabéns, meu filho! Sinto muito orgulho de você! E nesse momento seu pai saberá (assim como sua mãe já o sabe), que bom filho, companheiro, amigo e grande ser humano você foi.

“Adeus garoto nos encontramos lá”


Carta ao Irmão que Partiu...

Sinto-me agraciado e também acarinhado por Deus pela enorme emoção e prazer que estou vivendo nesse momento em publicar um texto homenagem ao Maurício, não foi por acaso, claro que não. Tive essa grande missão, acho que sim, pela amizade que nos uniu ao longo dos anos. Amizade essa que perdurou até a grande viagem, mas não a última, se Deus quiser faremos tantas outras, juntos.

Lembro bem de sua paixão pelos cavalos, coitados, eram obrigados a subirem paredes e ao mesmo tempo, por incrível que pareça nadar muito bem, pois não abria mão da travessia do rio Jaquipe, melhor atalho para Campestre. Sem deixar de contar que Maurício fazia do sempre belo animal seu transporte montaria, traquinagens e alegria durante 26 horas por dia. Como o dia só tem 24 horas, ele acordava 2 horas mais cedo todo dia. Verdade pura e plena, beleza de saber viver livre, em contato com a natureza, em velocidade e como sempre... Perigosamente! Instinto... Coração e Mente.

Passamos muitas férias juntos, cúmplices, anos a fio, muita alegria e a afinidade que até então o tempo nos legou e premiou.

Bem, curtimos a época do pinhão, bola de gude (carioquinha), botão de mesa, bicicleta, peteca (badoque, estilingue), cinema, sorveteria, futebol (E como jogava mal o amigo primo), banho de bica, pega ladrão, e tantas outras que levo na memória essa bela história para relembrarmos juntos os momentos do ontem no agora, que a cada hora fica alternando entre o alegre e triste ao meu recordar, dentro do viver, tentando vivenciar o que foi vivificado no outrora.

Adolescência chegando, as festinhas, o carnaval, as mulheres da dita vida fácil e o primeiro porre, inesquecível? Que trabalheira tivemos com o primo? E eu avisei como o mais velho, mas gostei muito... Rimos a beça... Valeu! E quantos outros hem? Imaginem? Maravilhosamente bem curtidos e amadurecidos.

E as suas famosas idas à cidade de Campestre – AL, hora de namorar, os hormônios estavam a mil. Que o diga a filha do prefeito daquela localidade.

Curtidas e exploradas andanças pelos engenhos da Usina Santa Terezinha, lá podíamos tudo, ou quase tudo, banhos de bica, salame, coca-cola quente, bolachas com manteiga turvo e até uma cachacinha com Fanta, ou melhor, Clipper. Bela e curtida infância e adolescência...

Ajudou muito aos seres humanos que nos tornamos, graças ao nosso bom Cristo Jesus pela diversidade das oportunidades que desfrutamos e principalmente pelos ensinamentos através das carências, exemplos e fé daquelas gentes tão sofridas e unidas que trabalhavam não só pelo pão, mas também por orgulho e objetivo ao ideal de pertencer àquela grande família que era a Usina Santa Terezinha, Água Preta - PE, onde todos eram irmãos, e não podia ser diferente, pois tinha tudo haver com a Santa.

Reportemo-nos agora a época das motos na Usina Uruba - AL, legal e perigoso. Não sei se o melhor ou pior, mas ele desmontava tudo para ver como funcionava. E as quedas? Como os cavalos elas subiam até paredes, daí a nadar também já seria demais.

Usina Roçadinho... Aí já éramos bem crescidos, mas curtimos muita praia, jangada, esqui, namoradas, jipe e etc, na Barra de São Miguel - AL.

Como o passar do tempo a grande dor e depois os cursos de planador, paulistinha, instrutor, etc. Hora de pensar na profissão e no futuro.

Seguindo o caminho do pai, com pouca idade já eras co-piloto. Muita dedicação e disciplina. Vieram os vôos nacionais e os internacionais... A vida já sorria de forma exuberante, inimaginável...

E as nossas farras? Inúmeras? Quantas vezes as fizemos no terraço da nossa casa à Rua Mons. Julio Maria, 234. Memoráveis! Ligava quando chegava ao Recife – PE, eu e a Sylvia o pegávamos no aeroporto ou hotel. Recordo que muitas vezes chegava de surpresa de táxi.

Lembro bem da última vez que por aqui aportou. Eu e Sylvia tínhamos alugado um filme de vídeo cassete (Há época era o máximo). O nome da película era Poltergeist e assim que ligamos o vídeo o seu táxi buzinou. Ele desceu todo feliz e sorridente e falou: o rapa foi excelente, separaram pra nós cervejas, vinhos, petiscos e até revista. Foi uma noite memorável, inesquecível... Um brinde a despedida dessa dimensão de Cristo Jesus!

Foi em grande estilo, assistimos ao filme, bebemos, comemos, rimos muito e tudo mais que nos deixava felizes pela cumplicidade e amizade sincera que acompanhava nossas vidas até então e que nos era de direito e doado pelo Pai Maior.

Maurício partiu em um dia chuvoso, quando tinha acabado de chegar de uma viagem de trabalho a Miami. Tinha comprado uma antena de rádio e a estava montando.

Quando terminou a montagem, começou a erguer a mesma, quando sem perceber bateu em um fio de alta tensão que passava em frente a sua casa, foi fatal. O vizinho ainda tentou avisar, já era tarde, paradoxalmente a energia que possuía foi ceifada de forma estúpida por um fio de alta tensão. Assim Deus quis... Assim aconteceu!

Anterior a essa imensurável perda, já havia passado por outra de igual ou até maior magnitude, pois o mesmo sofreu muito, junto a todos nós da família

Era o ano de 1979, a pequena família constituída por José Severino, Onilda, Maurício e Patrícia e mais os da grande família, sofreram um grande golpe com o desaparecimento e conseqüente perda de nosso José Severino quando em viagem de trabalho de Narita (Japão) a Los Angelis (EUA), desapareceu em vôo da VARIG em pleno oceano Pacífico, por incrível que pareça, com toda a tripulação a bordo de um Boeing 707 prefixo PP-VLU. Até hoje não sabemos a causa, uma incógnita para todo o mundo. Um dia conto com detalhes o que ocorreu na opinião de alguns especialistas ou ditos e a minha irrelevante opinião.

Coisas da vida. O nome completo de Maurício era: Maurício de Oliveira Araújo. Sendo o Oliveira por parte de mãe e o Araújo por parte de pai. O meu nome completo é Julio Sergio de Oliveira Araújo, Oliveira por parte de mãe e Araújo por parte de pai, seu tio, e, por conseguinte irmão de seu pai. Mães sem parentesco e pais irmãos nos deram o mesmo sobrenome. Tínhamos orgulho disso e ainda tenho muito!  Coincidência? Vocês acham? Será... Acho que não, ou melhor tenho certeza, tenho minhas convicções acerca dos mistérios entre a terra e o céu.
Considerava-o como um irmão primo ou um primo irmão. Foi assim que vivemos parte de nossas vidas.

A Onilda minha especial admiração, uma mulher acima de nosso tempo, ou melhor, de qualquer tempo. Uma guerreira lúcida, culta, leal, ferrenha e iluminada, que sobreviveu com galhardia a essas grandes catástrofes que mutilaram sua família a qual jamais abandonou inclusive a de seu marido, fazendo-nos visitas periódicas como legado e provavelmente respeito e seguimento ao que seu esposo fazia. Lutou e luta bravamente por melhores condições de saúde e que Deus a ilumine cada dia mais, junto a nossa prima irmã Patrícia e os seus rebentos que vai dar sequência a descendência dos seus ancestrais e que já estão na lida, em busca de mais vida.

Deus obrigado por tudo... E pela oportunidade de deixar escritas a minha alegria e dor.

“Ninguém morre se ficar alguém que se lembre, e se não tiver mais quem se lembre, não importa, estaremos todos juntos novamente”.

Beijão terno e eterno na alma e no coração.

Julio Sergio
Recife-PE
(09.02.09)