Filho

Filho, hoje você se mudou desta casa, eu ia trabalhar, e você veio tuas tralhas buscar! Feito tralha segui, rumo ao trabalho que a mim redime..Vieram as palavras, não do meu filho, mas de um estranho...estranho que esteve em meu ventre, a quem eu com tanto enlevo embalei, estranho que à duas semanas por um medo tolo, em minha cama se aninhou, estranho que à poucos dias a mim ligou a chorar por um por um doente que morrera...e mais uma vez em minha cama se aninhou...você voou filho, mas para minha tristeza e dor, não se lembrou de a mim dizer onde é teu ninho... agora...todos, todos a saber, menos eu meu filho, nossa!!!você foi cruel, você meu filho, enterrou fundo a faca, por quê?? eu te pergunto, por quê filho a mais esta dor eu não sucumbi de vez..por quê a tão profunda dor, eu sobrevivi??!! Por quê eu estou aqui, para quê estou aqui a escrever com sangue esta carta a ti... Não vi, filho, não vi meu menino, vi o você de agora, um estranho, estranho sim e por demais mundano, cheio dos planos, dos sonhos, das utopias, que nada são filho meu, senão enganos... Não, não ligarei mais para saber de você, tu já te sabes, não, não ficarei acordada a espera do barulho no portão, apenas filho, não mais dormirei. E não era pra ser assim, você abortou à mim.. Não era pra ser assim, para o mundo te criei, disto sempre eu soube, para o mundo te criei, e as palavras todas à ti eu citei, e as brigas todas, contigo eu briguei, assim, como o meu colo, eu nunca neguei, e quando você falou em partir, Deus, com o coração sangrando, te fiz um poema, mas na tua partida meu filho, apenas a frieza eu enxerguei, e caminhei sem saber que marcha passei, não dei ré, disto eu sei, minhas lágrimas, as lágrimas que deixei nas avenidas por onde passei...com certeza filho, teus tantos amigos hão de rir, você haverá de rir, mas todos têm razão, só eu que não, nunca isto eu terei, sou a risada, a piada, a mãe... E filho amado, assim como adorado é teu irmão, vai meu filho perdoando os ridículos que a ti fiz passar, Deus, eu liguei para todos, invadi teu orkut, pistas busquei, só mesmo não liguei, para o IML... Me perdoa filho, pelas brigas, pelos cuidados que sei exagerados e envergonhadores, haja visto, eu ser tua mãe, mães são assim meu filho, abortáveis. Dos amigos tudo se perdoa, pecadora é mesmo a mãe e sou sim a pecadora maior desta história...Perdoa-me filho...

Não sei onde moras agora, de meu coração não sairás jamais..mas filho, sou de poucos juramentos, de pouco levar à sério, mas o momento é!! Não, não, nunca mais, meu agoniado telefonema, não nunca mais eu problema... Nada mais filho, e hoje lhe digo, procure os amigos, são da tua geração, a geração dos sábios... Engraçado, não tive estas fases, talvez por não tê-las tido, à você e à teu irmão eu tenha feito a opção,como assim o fiz de chorar tanto para não vê-los chorar...Me perdoa meu filho, por não saber amar pequeno, por brigar, me preocupar, por alto gritar... me perdoa, não mais acontecerá... Serei mineral, serei pedra, cristal, diamante, qualquer coisa eu serei doravante, menos mãe... serei cal, serei sal, serei soda caustica, serei da moda... Nunca nunca nunca, nunca mais a ti vou envergonhar, fique tranqulo filho..nunca mais ligar, nem portão esperar, nunca mais filho o teu alô, vou mendigar, nunca mais ao celular vou ligar, nunca mais caixa postal, nada, nunca mais...também cravou fundo meu filho, o meu olhar nunca mais deixará de este sangue derramar... Ser feliz meu filho, não sei para onde, para onde enviar, não sei para onde envio este único pedido, ser feliz meu filho, mas se daqui à mil anos alguém encontrar, saberá, que uma mãe deseja e desejou a felicidade do filho, sem saber para onde enviar a mensagem...Adie....E... Ser feliz meu filho!!!

****************************************************

E tu meu filho, voltastes ao lar, como mero visitante, dois anos se passaram, crendo-se um gigante, apontastes teu dedo nas tramas de um enredo que tua ausência pouco conhece. Forma-se você este ano, és sim o primeiro lugar, em tudo, nos teus certames, no voo alto demais que estás a empreender, mas a vida que errou tanto para comigo e para com teu pai, nossos ideais, nossas faculdades feitas em meio a árduas e sempre duplas jornadas, não, não nos endureceu o coração, tampouco nos afastou da criação briosa sim, tua e de teu irmão, do lazer e do pão, da de vocês educação. O resultado está ai. Só calculei mal meu filho, quando pensei que a vida, poderia resguardar teu coração do aço. Hoje, tu não choras pelos pacientes jogados nas macas, hoje tu mais não choras os óbitos, são meras rotinas de trabalho. Hoje, o teu lado que tanto te esperou em minha cama, também com tua ausência se acostumou. Você hoje, aponta, sem saber, que apontas para o próprio peito. E fiz bem filho em não dar ré, muito muito muda fiquei, a minha poesia, essa, você não deveria ter maculado, meus dedos filho, ficaram paralizados, com força inumana aqui adentro e espero de coração, não e nem quero a tua in-compreensão, espero sim, que a luz falsa e mundana que te ofusca a bondade seja breve, seja só coisa da idade. Te amar é para sempre e hoje, hoje sei onde moras, mas minha casa é a mesma em que passastes tua infância!! Nunca se esqueça.

Tua mãe, Dorothy Carvalho.

Reeditado com modificações

Dorothy Carvalho
Enviado por Dorothy Carvalho em 18/03/2009
Reeditado em 14/09/2020
Código do texto: T1492777
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.