Olhar pedagógico...Olhar humano.
Mossoró, 12/02/2009
Querida Célia Matos;
Estive analisando pedagogicamente a questão do compromisso profissional nas ações a serem desenvolvidas nas Escolas Públicas da Rede Estadual de Ensino, as expectativas da família, dos coordenadores pedagógicos, dos alunos, professores e demais envolvidos na equipe escolar; a responsabilidade de cada membro que constitui a equipe deste corpo transformada num trabalho coletivo de responsabilização para a construção significativa da aprendizagem dos alunos, para atuarem como sujeitos participantes nas decisões políticas sociais e na cidadania.
Ainda tenho esperança que isso aconteça de fato, mas para isso colega é preciso que haja “comprometimento” do “todo”, principalmente no chão das escolas. Os cursos de Formação Continuada no interior das escolas favorecem a este anseio, por exemplo. Enquanto gestora você deve saber que ainda há muita resistência a ser superada; que uma escola sem proposta pedagógica é uma escola sem alma, sem vida e sem rumo. Ora, se precisamos planejar diariamente nosso projeto pessoal numa casa com quatro pessoas imagine numa escola do porte de mais de dois mil alunos... É preciso estar previamente preparado, saber o que se quer, como, porque e para quê; e ainda lhe digo mais, é preciso romper paradigmas ultrapassados, aprender a “olhar”, ter consciência dos saberes e fazeres a serem postos em prática de uma forma prazerosa e criativa que tenha sentido pra vida dos atores envolvidos considerando a prática social, a cultura de cada um, perceber a heterogeneidade existente na sala de aula, mediante um mapeamento das situações existentes no contexto de vida da comunidade; saber em que terreno vai plantar a semente.
Permita-me fazer um parêntese nesta reflexão... Certa vez, tive um aluno que nada que planejava interessava a ele. Era uma criança de dez anos; muito agressivo,o menino não deixava ninguém ter sossego na aula. Chamei os pais, foi pior; deram uma pisa no garoto que ele ficou mais revoltado ainda. No outro dia, olhou pra mim faiscando de raiva e disse-me:
“_Sua Ra-pa-ri-ga! Vai ver o que vou aprontar!”
Você acredita que disparei numa risada que quase não me contive?!Então, olhei pra ele e falei:
_ “Façamos então um trato, querido! Você diz do que mais gosta e realizarei seu desejo. Faz de conta que sou sua fada, está certo? O que é que te deixa feliz?”
Ele então respondeu:
“_Quero ser artista de teatro e quero todo mundo me aplaudindo, mas você queria saber por quê?”
Respondi categoricamente a ele:
_ “Porque vou te ajudar a realizar o seu desejo, mas vai me prometer que vai olhar no dicionário o que quer dizer a palavra rapariga... Tudo bem?!”
Aproveitei e expliquei pra turma como utilizar o dicionário e o sentido da palavra pesquisada, trabalhei gênero, número, sílaba tônica, ordem alfabética e algumas variantes verbais... De modo contextualizado.
No planejamento com a equipe montamos um projeto sobre como trabalhar e descobrir talentos na escola, com direito a prêmio por melhor desempenho em atividades cênicas. Foi uma maravilha.
Atualmente, este garoto faz parte dos atores que se apresentam na Estação das Artes, em Mossoró; costuma enviar mensagem e flores no meu aniversário, sempre com belas palavras de gratidão.
Portanto, colega não podemos perder de vista que o amor e dedicação pelo que fazemos contribui muito para os avanços esperados, os objetivos traçados durante o processo gradativo de ensino aprendizagem.
Não estou mais em sala de aula, mas faço monitoramento nesta atuação e vejo que a história continua... Tem sempre aluno revoltado que precisa ser ouvido, amado e encontrar pontes seguras que lhe ajudem a atravessar o caminho e chegar a algum lugar sonhado.
Um forte abraço e muita luz nesta caminhada;
Cheiro grande!
Antonia Zilma.