Carta ao ex mais-do-que-presente
Um dia imaginei saber de todas as coisas. O seu comportamento arredio, sua distância diante dos meus afagos constantes... eu sabia que saberia um dia. Imaginava tanta coisa a seu respeito, comparava meus sentimentos aos seus... cheguei a acreditar que você não gostasse de mim.
Eu sofria por menos, sofria porque precisava de mais. Sem saber que tudo o que naquele momento você me oferecia era demais. Além da conta, da sua paciência, das suas vontades... Você me queria madura, grande, do seu lado; não lá atrás, como eu sempre estive. Não sei se por nossa diferença de idade, por imaturidade minha ou porque parecia tão desconexo minha inteligência contrastando com a minha falta de atitude. Você queria uma MULHER, embora estivesse do lado de uma menina.
Hoje ainda sou a mesma menina que você viu pela primeira vez; apaixonada pelo seu jeito de falar, pelo seu perfume impecável, pela sua inteligência. Uma menina diferente da que você imaginou jamais que eu poderia ser. Os anos passam, as pessoas decidem o que querem, podem ou vão ser. Eu decidi apenas ser.
Sei que nada apaga todo o caos que vivemos. Nem a volúpia, nem tampouco a calmaria. Sei que nada apaga o amor que sinto por você, nem a saudade, nem a curiosidade sobre a sua vida, seus projetos, se você é feliz ou não, se pensa em mim de vez em quando. Sei que sou na sua vida um “se”, recheado de “talvez” e de moedas imperceptíveis. A moeda que eu paguei foi a solidão. E me tornei tão dura quanto você.
O medo da entrega, da confiança plena, de não ser dono mais das próprias vontades em nome de um gostar. A certeza de que se ama alguém, mas que não dá pra esperar simplesmente que esta pessoa mude pra nos acompanhar. As perdas. As culpas por se sentir amando menos, porque o outro te sufoca e se transborda de tanto amor. A culpa por ter perdido um grande amor, um grande casamento, uma grande noite; enfim... Milhares de fins pra histórias desconexas.
Sei que hoje entendo perfeitamente tudo o que nos ocorreu, como e por que você sempre foi tão frio e distante... e ao mesmo tempo tão doce. Não entendo, apenas, que a chama exista como um fisco dentro desta sua vida tão atribulada pelas tuas buscas. Por que você foi tão severo conosco? Por que você foi tão severo comigo? Por que eu, hoje, tenho agido assim?
Hoje sou um mundo de exigências tolas, talvez até absurdas. Hoje quero o amor, o sexo, o orgasmo, a segurança financeira, emocional, filhos. Hoje quero todas as coisas que jamais fui capaz de te dar, na minha ainda adolescência. Hoje quero um homem que me afugente do vazio que você me deu.
Sei, entretanto, que eu também sou um vazio dentro de ti, porque também me esvaziaram. Também agiram comigo como eu agia contigo. Aquele amor sufocante, extremo, orgásmico, over. Aquela necessidade de te ver, te sufocar, te dizer “eu te amo” até em momentos inúteis. È uma reafirmação de que realmente se ama menos. Porque o amor do outro é doentio, estragado, exigente, sombrio.
Depois, uma tristeza enorme. Uma tentativa frustrada em culpar o outro pelo não-amor recebido em doses homeopáticas. A vontade escassa em dizer boa noite, o beijo sem gosto de nada, e; por fim, a prostração.
Sei de tudo isso, e mais ainda, do que não devia ter feito pra diminuir o seu amor. Talvez ele ainda exista em uma gaveta trancada a chaves enormes. Talvez ele ainda exista como a sua utopia, em sentir a entrega que eu te dava tão gratuitamente. Talvez seja mesmo só um carinho caramelado por tesão, às vezes. Admiração, quem sabe.
O fato é que hoje sou a mulher que precisava ter sido há 5 anos atrás. O fato é que não se pode mais voltar atrás, nem apagar as dores e as más impressões que deixamos um no outro.
Só vim dizer que sinto muito. Por nós, por você, e especialmente por mim. – na mesma situação que a sua, anos antes. Sinto, porque queria amar outra pessoa e não pensar em ti toda vez que me reporto ao meu passado. Mas é uma simbiose... O círculo se fecha.