Cecília Meireles
Cecília Meirelles era de origem cigana
Uma das maiores poetisas do Brasil, Cecília Meirelles, era uma bela mulher de origem cigana. Ela foi a primeira pessoa do grupo de “Rom" do mundo, ou seja, a primeira cigana, a receber um título de Doutora Honoris Causa.
O título foi recebido em Délhi, Índia, no ano de 1953 e ela se tornou Doutora Honoris Causa da Universidade local.
Foi através das palavras de um dos maiores poetas de nossa língua, Carlos Drummond de Andrade, que ficamos sabendo sobre a cigana Cecilia Meireles, embora ela tenha escrito diversos poemas sobre o tema.
Ela viveu e se posicionou em um período de nossa história onde uma mulher não era bem vista trabalhando fora de casa e muito menos colocando sua opinião, escrevendo, criticando.
Ela não foi lembrada pela Associação Brasileira de Letras na sua época, mas, entre a ABL e a Cecília, quem perde é a ABL. Eles é que perderam...o povo cigano não.
Ao povo cigano fica o orgulho de ter entre seus filhos uma figura tão digna que com certeza inspirou e inspira toda uma linhagem de artistas das palavras com o dom de tocar nossas almas através das palavras.
Poema: "Canto Cigano”
Seus cabelos,
Balançavam com o vento.
Ela dançava,
Dançava de dia,
Dançava de tarde,
Dançava à noite.
À noite,
Enquanto os archotes brilhavam,
E punham nela muitos fulgores,
Ela sorria e sorria...
Para quem sorria?
Para ninguém.
Bastava, para ela,
Sorrir para si mesma.
Sorria...
Sufocando o pranto,
Que lhe inundava a alma.
Porque, se ela chorasse,
Todos choravam também.
E ela tinha que sorrir,
Cantar,
Dançar.
Bailando,
Como baila o vento,
Cantando,
Como cantam as aves,
Só, tão só...
E, no entanto, dona absoluta,
De todos os olhares,
De todas as mentes,
Que estavam ali.
Cada um achando,
Que era para eles que ela sorria,
Quando, na verdade,
Ela não sorria para ninguém,
Ela sorria para si mesma.
O tempo passou...
E, no vento tão forte,
Que muda a vida,
Mudando as pessoas de lugar,
Daqui para acolá.
Um dia,
Ela deixou de dançar,
Mas não deixou de cantar.
Mesmo na solidão dos pinheiros gelados,
Fazia, com os rouxinóis,
Um dueto encantado.
O rouxinol cantava de tristeza,
Ela cantava de saudade,
De dor...
Por onde andará?
Como estará a terra dos meus amores?
Aonde estarão aqueles,
Que pisam, firme, o chão?
Aonde estará o meu povo?
Será que estão como eu...
Na solidão?
Canta, cigana,
Canta...
Deixa que o vento da vida te carregue,
Que a brisa te abrace
E que as folhas te teçam arpejos,
Nos ninhos dos pássaros.
A solidão nos faz
Aprender a viver,
Dentro de nós,
Num castelo encantado.
Onde se é possível,
Chorar sozinha
E rir, feliz,
Para todos os passantes,
Caminhantes,
Andantes de muitas terras,
De muitos sonhos,
De muitas estradas.
Deixa voar,
O seu sonho de paz,
Porque, um dia, você terá.
Não chore,
Não chore, cigana,
Cante.
Porque, mesmo sem cantar,
Você encanta.
E, Mesmo chorando,
Você sorri.
Deixa o tempo passar,
Deixa as folhas voar,
Voar...
Porque, um dia,
Paz você terá!
Foto: Cecília Meireles e seu baralho de cartas.