PROCÓPIO FERREIRA
O símbolo da época de ouro do teatro brasileiro
Poucos atores merecem mais o epíteto “símbolo de uma época” do que Procópio Ferreira – exceção talvez feita a João Caetano, que dominou a cena brasileira um século antes. Carioca, nascido João Álvaro de Jesus Quental Ferreira em 08 de julho de 1898, Procópio praticamente monopolizou a audiência entre os anos 1930 e 1960, produzindo, muitas vezes, seus próprios espetáculos e encarnando centenas de papéis. E, para isso, utilizou seu talento cômico, a voz que mesmerizava o público e a consciência do lugar de proeminência de um protagonista.
Procópio, aliás, não gostava de ser coadjuvante, nem mesmo em sua própria vida. Contrariou a família quando se inscreveu na Escola Dramática Municipal, quando, pela ideia do pai, deveria se tornar advogado. Abandonar a Faculdade de Direito para se tornar ator cobrou um preço alto do jovem de 18 anos: foi expulso de casa. Baixinho, com o nariz proeminente, um tipo físico afeito aos papéis cômicos da época, ingressou na Companhia de Lucília Pires, em 1916.
Nos primeiros anos, passou pela Companhia Dramática Nacional, pela Companhia de Operetas do Teatro São Pedro e até mesmo por uma companhia de atores portugueses, encabeçada por Alexandre Azevedo e Antonio Serra. Em 1921, encontra o grupo que o levaria à maior popularidade: a Companhia Brasileira de Comédias. Encenou textos de nomes proeminentes da época, como Viriato Corrêa, Margaret Mayor, Max Dearly e, especialmente, de Joracy Camargo.
Apenas com o texto “Deus lhe Pague”, que se tornaria um clássico de Joracy Camargo, Procópio viajou todo o país por incontáveis temporadas, contabilizando mais de 3.600 apresentações, sempre lotando as casas de espetáculos. Fruto de um tempo em que as companhias encenavam, muitas vezes, vários textos simultaneamente, e também contando com sua carreira longeva, de mais de 60 anos, Procópio atuou em, pelo menos, 460 peças.
No final da década de 1950, encerrou as atividades de sua companhia, que já enfrentava dificuldades provocadas pela mudança dos gostos do público e da linguagem teatral. Passou à condição de ator convidado, sempre estrelando montagens de grandes textos, como “O Avarento”, de Moliére (1969). Nos últimos anos de carreira, levou “O Vendedor de Gargalhadas”, de sua autoria, aos palcos.
Leitor voraz, escritor inspirado, Procópio Ferreira deixou muitas de suas experiências no palco e na produção teatral, além de pesquisas sobre grandes nomes do teatro, registrado em livros, como A Arte de fazer graça (1925), “Como se faz rir - e o que penso quando não tenho em que pensar...” (1967), e, especialmente, suas memórias “Procópio Ferreira apresenta Procópio”, lançadas em 1967, que foram reeditadas pela Editora Rocco em 2000. Proferiu diversas palestras que também foram registradas em livro.
Se, para dominar a cena, Procópio marcava seu espaço com o proverbial círculo de giz riscado no palco, onde apenas ele brilhava, o ator viu a cortina fechar definitivamente em 18 de agosto de 1979. Procópio Ferreira faleceu de uma parada cardíaca, após três semanas de internação em decorrência de uma pneumonia, e teve o corpo velado no Theatro Municipal do Rio. Seu legado inclui uma das maiores atrizes brasileiras, sua filha Bibi Ferreira.
(Parte da coletânea GENTE DE TEATRO, de William Mendonça. Direitos reservados.)