BIOGRAFIA RICARDO FONTOURA - O TRATAMENTO NATURAL COM A MÉDICA SUÍÇA
Assim que recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla, Ricardo decidiu que iria tentar diversos tipos de tratamento. Os convencionais, que estavam em voga no Brasil. E os experimentais, mais alternativos que eram praticados em alguns locais do mundo.
O que se sabia é que é uma doença degenerativa e sem cura. Sobre isso sempre houve uma unanimidade. O que se discutia era a eficácia dos tratamentos para retardar os efeitos mais graves da esclerose e oferecer mais qualidade de vida e por mais tempo ao paciente.
Nesta condição também não é proibido sonhar com algum tipo de milagre da medicina. Afinal, muitas doenças foram vencidas ao longo do tempo com o avanço agressivo da ciência. Ricardo já tinha o pior. Não havia muito a perder. Poderia tentar o novo, desde que não causasse efeitos colaterais graves ou muito doloridos. Esse era o plano. Sempre com a anuência e liderança de Myrinha, que passou a ser uma espécie de pesquisadora autodidata e independente da esclerose múltipla.
Ela colocou em segundo plano sua carreira de arquiteta para ser uma especialista em tratamento da doença. Pelo menos na parte de buscar as melhores opções de tratamento. Ela fuçava bibliotecas, ia atrás de publicações médicas, conversava com profissionais da saúde, ligava para hospitais ao redor do mundo, consultava pesquisadores. Passou a ser a missão da sua vida encontrar a solução para o problema do marido. Se não conseguisse a solução total, pelo menos diminuiria o avanço da doença. Já era uma vitória.
Ricardo não criava dificuldades em aceitar participar como cobaia em algum teste. Se havia uma nova droga no mercado, do Canadá, por exemplo, que trazia algum tipo de esperança, Myrinha avaliava os riscos. Se fosse viável do ponto de vista da saúde dele, recomendava. Ele, prontamente, aceitava.
No início do tratamento, eles descobriram uma médica suíça que vinha duas vezes por ano ao Brasil para tratar um grupo de aproximadamente 50 pacientes de esclerose múltipla em São Paulo. Ricardo ficou sabendo da médica através de seu neurologista clínico, na mesma cidade.
Revolucionária na época, a médica fazia tratamentos à base de dieta. Ela defendia que a esclerose vinha por meio do intestino, que permeava e deixava passar as toxinas. Isso intoxicava o organismo e desencadeava a doença.
Uma senhora paulistana, também com esclerose múltipla, cedia a parte dos fundos de sua loja para os atendimentos da médica. “Em vez de 50 pessoas se deslocarem até a Suíça, é mais fácil eu vir e atender todos vocês aqui, no Brasil”, dizia a médica. Era um pensamento lógico.
Ela receitava uma dieta muito rígida e natural, que sequer era encontrada no Brasil. Ricardo e Myrinha conseguiram encontrar os produtos na Itália. Ele tinha de comer óleo de girassol prensado à frio. Alguns grãos, aveia, vitaminas, óleos, saladas. Era um cardápio totalmente novo e difícil para o paladar de Ricardo. Ele seguia quase que à risca. Abria concessão para carne. Isso ele não conseguia tirar do prato. Era disciplinado, mas não era radical.
Quando a médica vinha acontecia uma reunião com todos os pacientes. Ela receitava os medicamentos e dieta. Além disso, passava alguns exercícios de fisioterapia em fitas de vídeo cassete para que os pacientes pudessem fazer com seus fisioterapeutas. Na época, o professor de Educação Física, Antônio – amigo de Ricardo – fazia as vezes de fisioterapeuta. Ele recebia as fitas e repetia os movimento com Ricardo. A maioria na piscina. Algum tempo depois, ele passou a tarefa à fisioterapeuta Janete, que seguia à risca os mesmos procedimentos.
Um desses dias de reunião, Ricardo notou que havia muitos cadeirantes. Pessoas em estágios bem mais avançados que o seu. Com problemas bem mais sérios. Ele se sentiu mal de ouvir todas aquelas histórias, aqueles problemas. Tudo soou como um filme de terror que o aguardava no futuro. Talvez num futuro próximo. Aquilo mexeu com o seu psicológico.
“Não estou gostando dessas reuniões não, Myrinha. Não quero mais vir não”, confessou Ricardo. Ela assentiu. Entendeu o ponto de vista dele. Era pesado ele se imaginar com alguns dos colegas, que já não tinham muita mobilidade. Nesta época, Ricardo ainda andava sem qualquer tipo de apoio. Não podia correr ou jogar futebol, mas se locomovia sem grandes dificuldades.
Mas coincidiu que a médica foi impedida de continuar os tratamentos. Algum médico brasileiro, enciumado, fez uma denúncia ao Conselho Regional de Medicina, que acabou proibindo a profissional suíça de continuar exercendo a profissão no Brasil. Legalmente, ela teria que validar seu diploma para exercer a medicina no país.
Bastante chateada, ela avisou que não viria mais. E assim ela fez. Nunca mais pisou no Brasil. O grupo ficou sem a continuidade do tratamento, que estava tendo bons resultados. Ricardo se sentia melhor com a dieta, com os medicamentos, com os exercícios. Era um campo de batalha fechado. Era preciso buscar outros.