BIOGRAFIA RICARDO FONTOURA - O LADRÃO ARREPENDIDO DE ROMA

Ricardo e Myrinha, no início dos anos 90, fizeram uma viagem à Itália, na companhia de dois casais amigos. Era algo que eles sempre faziam. A esclerose múltipla não foi uma adversária à altura das ambições que Ricardo tinha que viajar pelo mundo. A doença não atingiu seu passaporte, que a cada ano recebia novos carimbos.

O grupo aproveitou durante alguns dias diversas atrações de Roma, como o Coliseu, o Fórum Romano, o Panteão, a Fonte de Trevi, a Piazza Navona. Sempre com uma máquina fotográfica a tiracolo e aquele olhar de encantamento diante de monumentos milenares.

Ricardo sempre foi um cidadão do mundo. Sempre teve interesse genuíno em conhecer novas culturas, ver pessoas diferentes, experimentar sabores culinários exóticos, bons vinhos. Viajar era o programa mais aguardado do ano: ele topava todos os roteiros.

Myrinha, desde sempre, era a responsável pelos roteiros. Sua responsabilidade nas viagens era cuidar da logística. Quando, alguns anos mais tarde, Ricardo foi tendo cada vez mais limitações, ela organizava os passeios tendo como prioridade locais com acessibilidade e que ele pudesse desfrutar sem maiores dificuldades.

Ao fim desse tour pela Itália, na cidade de Roma, Myrinha resolveu aproveitar para comprar os remédios e os produtos naturais da dieta de Ricardo. Ele estava seguindo ao pé da letra o tratamento experimental que fazia com uma médica suíça, em São Paulo.

Os produtos não eram encontrados ainda no Brasil. Ricardo e Myrinha decidiram comprar estoque para um ano. Iniciaram um périplo pelas farmácias da cidade, comprando um pouco em cada. Foram às lojas de produtos naturais, encheram a sacola. Por serem raros, naturalmente eram itens de alto custo. Mas era preciso comprar em grande quantidade. Não é todo mês que se vai à Itália!

Após todas as compras serem feitas, Myrinha colocou todo o estoque numa maleta, lacrou e colocou na Van que haviam alugado para o passeio. Teve o cuidado de colocar junto todas as receitas e exames do marido, caso tivessem algum problema na alfândega. A mala estava fechada. A ideia era abrir só quando desembarcassem no Brasil.

Com a sensação de dever cumprido, Ricardo, Myrinha e os dois casais foram fazer o último passeio em Roma, antes de encerrar o tour. O destino era conhecer as Termas de Caracalla, o maravilhoso complexo de quase 2 mil anos, que servia de lazer e os famosos banhos públicos dos romanos.

Após terem se maravilhado com as ruínas do imponente monumento, o grupo voltou para a Van. Era hora de ir embora. Ao chegarem ao veículo, notaram que ele havia sido arrombado. Duas malas haviam sido levadas: uma com itens de higiene de Raul e a outra, com os remédios e produtos de Ricardo.

Ricardo ficou sem palavras, desolado. Myrinha caiu em prantos. Seus irmãos tentavam acalmá-la. “Não tem problema, você compra tudo de novo, vai dar certo”. Não teve outro jeito. Mais um périplo pelas mesmas farmácias e lojas e encheram a sacola de novo. A doença de Ricardo não podia se dar ao luxo de ficar sem esses produtos. Seu bem estar dependia disso.

Alguns meses após a viagem, chega uma correspondência pelos Correios. Estranhamente, da Itália. Era um envelope grande. Ao abrir, Ricardo viu ali todos seus exames, diagnóstico, receitas. Pelo jeito o ladrão ficou com a consciência pesada. Era um gesto, na cabeça dele, de compaixão com quem havia roubado.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 17/05/2022
Código do texto: T7517916
Classificação de conteúdo: seguro