BIOGRAFIA RICARDO FONTOURA - O DIA QUE RICARDO DORMIU DURANTE O ASSALTO
Uma das muitas qualidades de Ricardo sempre foi a sua enorme calma diante de terríveis desafios. É uma característica dos grandes líderes. Às vezes o mundo estava desmoronando lá fora e ele, continuava sereno, em paz, sem se agitar. Não significa que ele estava alheio ao que estivesse acontece. Claro que ele se importava e muito com tudo à sua volta. Só que tinha um jeito cartesiano, lógico de encarar as coisas. Era do tipo que fazia cálculos mentais para tudo. Lia o mundo desta forma.
Uma vez, por exemplo, Ricardo chegou a dormir durante um assalto. “Quem consegue dormir num assalto?”, questiona, incrédula, Myrinha. Seu marido conseguiu essa proeza.
Era o fim de um manhã de calor em Goiânia. Ricardo estava acompanhado da esposa e da filha caçula, Júlia. Visitava a irmã, Silvinha, que na época morava em um apartamento. Os sócios de Luiz – esposo de Silvinha -, Gabriel e Valdivino, acompanhados de suas esposas, haviam se juntado ao grupo, que iria sair para almoçar fora. Já haviam reservado o restaurante, num local sofisticado de Goiânia.
Quando estavam descendo, foram surpreendidos por uma quadrilha de assaltantes. Vieram do Rio de Janeiro para cometer assaltos em Goiânia. Eram especialistas neste tipo de crime, em apartamentos. Um deles, mostrou um volume por baixo do casaco e ordenou para todos ficarem quietos. “Isso é um assalto!”.
Agiram rápido, pegaram todos os celulares e pediram para todos encostarem na parede, em silêncio. Ninguém ousou esboçar qualquer reação. Era meio que um protocolo, que já sabiam como cumprir: não reagir a um assalto. Não falar muito. Obedecer às ordens e torcer para terminar logo e com todos em segurança.
Acontece que algumas pessoas começaram a descer do elevador e os assaltantes eram “obrigados” a fazerem elas também de reféns. O grupo foi aumentando. Os marginais decidiram colocar todos num escaninho do prédio. Como o espaço era mínimo e havia muita gente, todos ficaram como galinhas num caixote.
Ricardo, por conta da sua limitação física, sofria ainda mais. Todos os músculos do corpo doendo no limite máximo. Mesmo assim, ele não reclamava, nem esboçava qualquer tipo de reação que denunciasse o que estava sentindo no momento.
Uma das pessoas que estavam no escaninho, que já conhecia a situação dele, argumentou com os assaltantes para aliviar a barra para Ricardo, que ele não iria aguentar. O que parecia ser o líder deles olhou fixamente para Ricardo e percebeu que era verdade. Com a arma em punho, fez sinal para ele sair do grupo e se encaminhar, sozinho, ao escaninho que ficava do outro lado. Ele obedeceu sem dizer palavra.
Myrinha, que era a guardiã de Ricardo para todos os assuntos, se desesperou. “Ficou ainda pior agora, já que ele está lá sozinho, longe de mim”, disse mentalmente a si mesma, tentando recuperar o que se poderia chamar de calma.
Ela não tirava os olhos do local onde Ricardo fora encaminhado, preocupado mais com ele que consigo mesma. Ricardo, por sua vez, mantinha a expressão serena, como se dissesse: “É só um assalto, vai demorar mais alguns minutos e tudo vai acabar bem”.
A cena era esta: num escaninho, apertados, um em cima do outro, umas dez pessoas, todos bastante aflitas, tensas, apavoradas. No outro escaninho, Ricardo, sozinho, com olhos de calma, como se estivesse num spa. No meio os assaltantes, com armas em punho e expressão de poucos amigos. Sangue nos olhos, prontos para atirar em alguém caso algo saia do controle.
No escaninho de Ricardo havia um colchonete jogado no canto. Sem muita função durante o assalto, Ricardo não teve dúvidas: ajeitou o colchão e, como se estivesse numa suíte do Copacabana Palace, simplesmente deitou. E conseguiu dormir!
Myrinha e o restante do grupo ficaram pasmos com a cena. Ninguém acreditava no que via. Como era possível, num desespero daquele, no meio de um assalto a mão armada, alguém consegue ter paz para dormir?
O sono dos justos de Ricardo, no entanto, não demorou muito. Foi interrompido por um barulhento e longo tiroteio na garagem. Uma das mulheres que estava de refém, acabou ficando com seu celular e, numa distração dos bandidos, acionou a polícia, que invadiu o local. Ao ver a presença dos policiais, os assaltantes tentaram correr e houve troca de tiros. Eles acabaram rendidos e presos pela polícia.
Todos os reféns se sentiram livres, saíram do “poleiro”, aliviados e ao mesmo tempo em estado de choque. Ricardo, calmamente, levantou do colchonete. “Que bom que acabou bem!”, disse, como se tivesse assistindo um filme de ação, em que os mocinhos vencem no final.