BIOGRAFIA RICARDO FONTOURA - FILHO SIM, FILHINHO DE PAPAI NÃO!

Ricardo sempre se apavorou com a ideia de ser visto como um pai que passa a mão na cabeça dos filhos no trabalho. Nunca viu problema algum em tê-los no ambiente das empresas, desde que fossem por merecimento, por esforços próprios. Detestaria a ideia de preterir alguém competente para favorecer um filho menos qualificado.

Seria algo que colocaria sua liderança em dúvida na empresa. Mas não era a parte pior. O que o incomodaria de verdade seria na sua mente não ser justo o suficiente com os funcionários. Um de seus trunfos como patrão era exatamente ter ações coerentes com seus discursos, tratar a todos com justiça, com dignidade. Ter um filho no ambiente de trabalho é algo que pode gerar fraturas nesta parede sólida que ele construiu na cultura da empresa e na sua própria teia de valores.

Ricardo, no entanto, tinha verdadeira paixão por transmitir aos filhos os valores de sua ética de trabalho. E não havia lugar melhor para isso que as empresas da família, estarem juntos no dia a dia. Era uma linha tênue e arriscada. Mas Ricardo sempre foi um homem de apostar alto nas suas jogadas. Confiava bastante no seu jeito de trabalhar, nas suas decisões de vida.

O primogênito Rodrigo foi o primeiro a dividir com o pai o dia a dia no trabalho. Com larga experiência no mercado financeiro em São Paulo e com uma passagem de sucesso na Goiás Carnes – liderada pelo avô, Otávio Lage -, Rodrigo chega para trabalhar na Jalles Machado na época que Ricardo era o diretor-presidente.

No início os dois entraram em rota de colisão por terem ideias diferentes em relação à forma de conduzir os negócios e na política salarial. Rodrigo havia saída de uma escola diferente: os ganhos pessoais como comissão por produtividade eram valorizados. Era até um estímulo para avançar mais como profissional. Na Jalles Machado – empresa controlada pela família -, a política era diferente: receberia salário e lutaria para fazer a empresa crescer, ficar mais forte no mercado. Ricardo teve muita dificuldade para convencer Rodrigo sobre a cultura da empresa. Havia ali também um choque de gerações.

Apesar das divergências iniciais, tudo era tratado em um clima de respeito. Tanto no nível de pai e filho como no nível de líder e liderado. Com o passar do tempo, Rodrigo conseguiu emplacar algumas ideias que trouxe do mercado financeiro e conseguiu assimilar outras do agronegócio. Ricardo cedeu onde podia. Rodrigo cedeu onde conseguia. E o chão profissional dos dois começou a ser mais fértil.

Ricardo exigia mais dos filhos do que dos outros funcionários. Não cruzava, no entanto, a fronteira que separa a justiça da injustiça. Às vezes essa fronteira não ficava muito nítida, mas Ricardo não a ultrapassava. Questionado por pessoas próximas sobre a forma mais dura que tratava Rodrigo no trabalho, costuma dizer: “já viu o pé da galinha matar os pintinhos?”. Era um provérbio que seu pai, Otávio Lage costumava pronunciar. Ricardo já esteve na pele de Rodrigo ao seu tempo e entendeu que a exigência serviu como escola para ele.

Henrique seguiu os passos do irmão. Também fez carreira no mercado financeiro em São Paulo. No Itaú conseguiu crescer e atingiu patamar promissor dentro da instituição. Ao deixar a vida na maior cidade do Brasil para começar carreira na Jalles Machado, ouviu do pai: “Você precisa trabalhar mais e ser melhor no que faz do que os funcionários que estão na sua mesma função que você. Não seja conhecido por ser filho e neto do dono, seja por ser bom no que faz”.

Foi um ensinamento que virou mandamento. Não só para Henrique, mas para todos os filhos. Passou a ser um capítulo da cartilha profissional da família. Um valor inegociável e acima de tudo, uma meta de vida para eles. Era uma ideia que embutia entusiasmo e senso de responsabilidade nos filhos.

Após não conseguir convencer Julia a atuar na psicologia coorporativa, empresarial, Ricardo teve sucesso ao convidá-la a fazer estágio no Grupo Otávio Lage, mais especificamente na Vera Cruz Agropecuária.

Feliz por ter a filha por perto, de passarem mais tempo juntos, Ricardo desfrutou bastante dessa experiência. Afeto à parte, fez questão de deixar claro que as regras da empresa valiam para todos, inclusive os filhos. Talvez principalmente os filhos.

Deu ordem ao Departamento de Recursos Humanos que descontasse no salário – já baixo – de Julia em casos de faltas ou atrasos. Não havia meio termo: se faltou, não recebe pelo dia faltado, se atrasou não recebe o dia de forma integral. Isso não era algo apenas com valor pedagógico, um jeito de transmitir uma lição. Era acima de tudo um valor da empresa, um valor de Ricardo. Não seria justo descontar o dia faltado por um funcionário e aliviar o mesmo dia faltado de outra funcionária pelo simples fato de ela ser filha do patrão.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 13/05/2022
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