Prévia do livro: Um dia de cada vez memórias de uma família (De Monareta Azul)

De Monareta Azul

No início dos anos 90, havia, em nossa casa, uma bicicleta Monareta azul, de propriedade da Karla. Meu pai estava sem bicicleta, pois a sua havia sido roubada, e enfrentava-se a crise do Fernando Collor. Meu pai usou essa Monareta para andar e fazer orçamentos, além de entregar móveis restaurados. Ele solicitava a um carroceiro que entregasse os móveis, e eu, Fábio, acompanhava na garupa.

Sempre fui apegado ao meu pai; ia junto, sentado na garupa, e colocava os pés nos parafusos da roda traseira, para apoiá-los. Eu vivia preocupado por não ter uma Monareta, mesmo que ela tivesse rodas maiores. O quadro do veículo não tinha o ferro no meio, então me sentia mais seguro para aprender a andar. Em alguns momentos, eu pedia para pedalar. Meu pai, sentado no selim, apoiava os pés no quadro, e eu pedalava. Essa estratégia tinha continuidade com meu irmão e amigo. Quando a bicicleta estava encostada na parede, eu ficava pedalando para trás e segurando no guidom, e as imaginações iam longe.

Em frente à nossa casa, eu me lembro da oficina de bicicleta do Varnei, onde havia 3 minimonaretas. Da sala de casa, eu as avistava, elas com placas "Vende-se". Como toda criança tem o dom de trabalhar a imaginação, eu pedia à minha mãe que me ajudasse a atravessar a rua, que era muito movimentada, para ficar conversando com o Varnei. Minha mãe me ajudava. Enquanto o Varnei se distraía com pássaros nas gaiolas, eu corria e tirava a placas de “Vende-se”, sentava-me na Monareta e ficava empurrando com os pés. Ali nasceram o equilíbrio e a vontade de pedalar. Eu dava 4 pedaladas e me empolgava. Daí em diante, adquiri mais equilíbrio e, quando estavam em frente à Loja Maçônica, sobre o passeio, meus pais me viram pedalando com perseverança, atravessaram a rua e pediram ao Varnei que fizesse uma revisão na Monareta, pois estava saindo a corrente, as rodas estavam bambas e empenadas, havia raios quebrados, além de precisar de pedais novos, pois tudo isso dificultava o aprendizado. A colocação de pedais novos pesaria no orçamento, então eles não foram colocados. Eu me sentia inseguro para andar; algumas vezes o pé escapulia do pedal quebrado e surgia um corte em minha canela, que também ficava roxa, mas, mesmo assim, eu não desistia, andava e andava, cambaleando, caindo, mas, quando ia dormir, ficava imaginando, meditando.

Depois da Monareta, consegui ganhar uma bicicleta Cross, usada, de cor branca, toda suja, arranhada e mal zelada. Compramos de um colega que havia ganhado uma Mountain Bike de marcha, e seus dois irmãos ganharam também. Tive o prazer de ganhar uma Cross. Daí em diante, muita curtição, vários tombos, cada dia criando algo diferente em cima da bicicleta.