ISADORA OTONI: A GAROTA QUE TRANSFORMA OS SABORES DO CERRADO EM SORVETES NATURAIS
Com apenas 26 anos de vida e muitas milhas percorridas, muitos clichês sociais vencidos, muitas escolhas feitas fora da cartilha, Isadora Couto Otoni é uma mulher que decidiu dizer não para o papel que o mundo decidiu que ela interpretasse. Escolheu ouvir o coração e caminhar nas trilhas que ele pulsava.
Filha de Arlene e Claudimar, empresários bem sucedidos em Goianésia, ela poderia seguir carreira nos negócios da família. Não era o que via como missão pessoal. Irmã de Natassya e Jessyca, médicas já com carreira encaminhada, ela poderia ter abraçado a medicina como meio seguro de vida. Mas não era o que fazia seu coração explodir.
TRILHOU SEU PRÓPRIO CAMINHO
Com 17 anos, mudou-se para São Paulo para estudar jornalismo. “Sempre me dei bem com literatura e redação, gostava do exercício da criatividade e de estar conectada com temas atuais e tendências. Também acredito que através da comunicação podemos mudar o mundo”, explicou os motivos da sua escolha acadêmica.
Talvez mudar o mundo ou o mundo à sua volta fosse sua vocação mais forte. Não é mulher de uma só paixão: morou em Londres em 2016, onde estudou inglês e Cozinha Básica na conceituada Le Cordon Bleu. ”Quando voltei, fiquei um tempo em São Paulo adquirindo experiência em restaurantes renomados e estudando mais. Eu já planejava um retorno para Goiás, mas em 2018 resolvi antecipar a minha vinda”, explicou.
De volta a Goiás, escolheu Alto Paraíso, no coração da Chapada dos Veadeiros, para morar. Não falta inspiração no local: cachoeiras incríveis, bons passeios para fazer, energia diferente. “Os moradores daqui vêm de lugares distintos, muitas vezes de outros países, então temos um sincretismo cultural fascinante”, destaca Isadora. “Aprendi a respeitar mais a natureza aqui. Observo de perto o ciclo da natureza, como a decomposição dos alimentos ou como os animais predadores se comportam. Na natureza tudo faz sentido, tudo é reaproveitado, não existe descarte ou animal indesejado. Então tento viver a minha vida de acordo com essa regra do mínimo impacto possível, por mais que o modelo atual do capitalismo não nos permita uma sustentabilidade plena”.
O INÍCIO DA ORANGOTANGO
Diante de tudo isso, inserida nesse pequeno Éden, Isadora reuniu inspiração para viver seus sonhos, para empreender na área que acredita. Há um ano ela criou a Oragotango Sorvetes, especializada na produção e distribuição de sorvetes artesanais, com sabores de frutas do cerrado.
De onde vem a inspiração? “Vem principalmente do cerrado, o bioma da minha terra, no qual encontramos frutos maravilhosos e exóticos para criar novos sabores. Além disso, tento valorizar sempre os frutos sazonais para respeitar os ciclos da natureza e depender menos de transporte e plantio regado a agrotóxicos e fertilizantes”, explica a jovem empreendedora. “Também me inspiro na comunidade local, onde vivem muitas pessoas conscientes e veganas”.
Isadora conta que trabalhou em um café na Vila de São Jorge (distrito de Alto Paraíso) e sentia falta de um bom sorvete para acompanhar as suas criações de sobremesa, já que só chegavam marcas industrializadas no mercado local. ”Vi então uma excelente oportunidade de inserir um produto de qualidade para os moradores daqui”, informa Isadora.
QUALIFICOU-SE ANTES DE EMPREENDER
Vislumbrando a oportunidade, ela se inscreveu em um curso ministrado pelo chef Francisco Santana em São Paulo, comprou seus primeiros equipamentos e começou a fazer sorvetes na cozinha do IluminArte Atelier e Café, na Vila de São Jorge. “Trabalhava nesse café durante a tarde, mas chegava mais cedo para bater meus sorvetes, porque na minha casa eu não tinha espaço para essa produção. No início, eu produzia um ou dois quilos por dia e reutilizava embalagens de sorvetes industrializados para guardar os meus. Mas a saída foi tão boa que logo a produção precisou crescer”, completa.
SABORES DO CERRADO
A Orangotango está sempre inovando, sempre testando novos sabores de sorvetes. Feitos ao leite, os mais procurados são: baunilha do cerrado, cheesecake de goiabada, flocos de chocolate belga, cointreau com raspas de laranja, mousse de maracujá, gorgonzola com doce de buriti, jabuticaba com chocolate ruby. Há também uma linha toda vegana: chocolate 70%, mangaba, cajuzinho do cerrado, macadâmia com caramelo salgado, tamarindo com rapadura.
“Praticamente toda semana eu penso um novo sabor para a Orangotango e invisto em matéria-prima para testar. Muitas vezes o sorvete não dá certo e eu tenho que mexer nas receitas algumas vezes até funcionar”, explica Isadora. Ela garante que algumas receitas já tiveram mais de 10 versões para chegar à versão atual. “Acho válido ressaltar que meus sorvetes são feitos a partir de ingredientes naturais, e não possuem gordura vegetal, aromatizantes, corantes ou saborizantes artificiais”, garante.
EMPREENDIMENTO SUSTENTÁVEL
O público-alvo da Oragotango são pessoas que moram nos três pontos de vendas - Chapada dos Veadeiros, Goianésia e Brasília. “São pessoas que se preocupam com o meio ambiente, que acreditam em formas de economia mais sustentáveis, que se alimentam de forma natural e/ou são veganas e gostam de comidas gostosas”, explica.
“Minha estratégia é sempre oferecer um produto que condiz com a minha própria ideologia e forma de ver o mundo, para atingir pessoas que acreditam no que eu acredito. Nesse sentido, não faço um marketing bitolado que só pensa em vendas”, completa Isadora.
PLANOS DE EXPANSÃO
Isadora Otoni é uma mulher que trabalha com metas. “Estou sempre me cobrando, mas também estou ciente de que as coisas têm seu próprio tempo. Além disso, tive muito apoio da minha família e dos meus amigos, que acreditam muito em mim. A minha ideia na gastronomia sempre foi empreender, inclusive gostaria de poder empreender em ramos diferentes”, diz, com olhar de quem consegue ver paisagens que ainda não estão à mostra para todos.
A VIDA EM MEIO À NATUREZA
Isadora mora com seu companheiro, Raphael Palmer, em uma fazenda no meio das belezas naturais da Chapada dos Veadeiros. Preenche seus dias produzindo sorvetes, cozinhando, trabalhando no computador e cuidando da casa.
Durante a quarentena, ela resolveu unir a facilidade em se comunicar com a experiência na cozinha para ajudar as pessoas que estavam aprendendo a cozinhar. “Vi que muitos amigos têm interesse nesse tipo de conteúdo, então sempre que posso e consigo eu publico algo relacionado à minha alimentação. Aqui em casa sou eu e meu companheiro que cozinhamos todos os dias, porque nenhum restaurante faz entrega onde eu moro, então na maior parte das vezes eu posto uma receita do dia-a-dia. Fico muito feliz quando algum seguidor coloca em prática alguma dica que eu dou!”, conta Isadora.
Isadora não se contenta em desempenhar apenas um papel. Ela é múltipla. Conecta-se de várias formas. Arrisca-se também como DJ. Em Alto Paraíso participa de um coletivo de artistas que realizam eventos, projetos e exibições. “Também faço decoração de festas, mas tem colegas do coletivo que fazem projeções, instalações, performances e etc. É tudo uma diversão e outra forma de me expressar em um ambiente sem julgamentos”, revela.
PRÓXIMOS PASSOS
Perguntada sobre quais são seus próximos passos, sua meta para o futuro, Isadora diz que quer continuar criando sorvetes e expandir suas vendas. “Estou com alguns projetos encaminhados para a Orangotango Sorvetes. Também pretendo aprender novas técnicas de produção, mas estou esperando tomar a vacina contra Covid-19 para encarar aulas presenciais”, ressalva. E completa: “quero muito que essa pandemia acabe para poder ver minha família mais vezes e sem culpa”.
“Um ano depois eu sinto que tenho mais trabalho ainda a fazer! Novos desafios surgiram, mas acredito que com respeito à natureza, respeito à minha comunidade e com produtos de boa qualidade eu consigo chegar onde eu quero”, finaliza. A julgar pelos primeiros passos ninguém ousa duvidar que sua caminhada será longa e cheia de frutos pelo caminho.