DIANA KLEBER: ELA ROMPEU COM O CAPITALISMO SELVAGEM E HOJE LEVA UMA VIDA MAIS NATURAL NA CHAPADA DOS VEADEIROS
Há pessoas que nasceram para seguir todos os ordenamentos sociais. São fieis e obedientes aos protocolos do sistema. São homens e mulheres que correm doze horas do dia atrás de moedas, respiram fumaça, comem agrotóxicos e tomam pílulas para dormir. Há outro tipo de tribo: aqueles que não vestem uniformes, resolvem se rebelar e não seguir esse padrão.
Diana Larissa Kleber é uma dessas rebeldes. Ela descobriu que colecionar dinheiro não é meta de vida, que ar puro é de graça e que alimentar seu corpo com comidas orgânicas é algo possível. Hoje, ao lado de amigos, ela mora em uma área rural da Vila de São Jorge – um povoado no município de Alto Paraíso – no coração da Chapada dos Veadeiros, em Goiás.
Atualmente ela trabalha na produção do sorvete artesanal Orangotango. “Também sou “chef afetiva” e ofereço o trabalho de personal chef para eventos e experiências, trazendo a culinária intuitiva e consciente. Para mim, ganhar a vida não é somente a manifestação de abundância através do dinheiro, mas sim os movimentos que expandem a rede e o potencial criativo dela”, completa Diana.
DE SANTA CATARINA PARA GOIÁS
Diana se define como uma pessoa desapegada de padrões e sistemas. “Sou enérgica, em constante movimento e impermanência”, explica. Mas nem sempre foi assim. Nem sempre ela encarnou esse estilo de vida mais libertador. Nasceu e cresceu em Peritiba, no oeste de Santa Catarina. Para cursar Relações Públicas foi morar sozinha em Balneário Camboriú, ao lado da capital, Florianópolis. “Longe de casa e assumindo as contas e riscos, trabalhei em comércios, festas e organizações corporativas no âmbito de comunicação e identidade de marca”, conta.
Tinha um trabalho, fazia faculdade, tudo caminhava na régua da normalidade. Mas algo dentro dela começava a gritar, a doer. Não era o mundo que desejava conquistar. Até que em um dia qualquer de 2018, “já desconectada do capitalismo e do sistema degradador de Balneário Camboriú”, ela decidiu organizar uma viagem de 21 dias para a Chapada dos Veadeiros. Era uma espécie de chamado para conhecer a terra prometida.
Diana chegou à Chapada por meio do Capim Estrela, que é uma área de reserva ambiental com três chalés ecológicos em meio ao cerrado. O local proporciona uma experiência de imersão ecológica e na época oferecia um projeto de voluntariado para desenvolver atividades e estudos de permacultura. Uma definição mais simples de permacultura ou cultura permanente: é a utilização de uma forma de pensar e conceber princípios ecológicos que podem ser usados para projetar, criar, gerir e melhorar todos os esforços realizados por pessoas, famílias e comunidades para gerar um futuro sustentável.
O QUE ERA PARA SER UM RETIRO SE TRANSFORMOU EM LAR
A moça do Sul se encantou com tudo que viu, sentiu e viveu na Chapada. “Nesse momento todos os portais de criatividade e expansão se abriram através do trabalho com a terra e os alimentos orgânicos. Os 21 dias chegaram ao fim e eu não via outra opção que não fosse seguir expandindo no propósito que encontrei aqui”, revela.
Aí o roteiro segue parecido com o de muitas pessoas de diversos estados e países que conhecem Alto Paraíso e não conseguem mais morar em seus locais de origem. Resolvem ficar para sempre ou por um bom tempo. “A Chapada dos Veadeiros me acolheu”, garante Diana. Depois da experiência de voluntariado e viver em comunidade, ela estruturou sua própria vida, uma nova vida na Vila de São Jorge.
CULINÁRIA E MÚSICA COMO EXPRESSÕES ARTÍSTICAS
Mais do que um trabalho, Diana vê seu ofício culinário como um meio de se expressar artisticamente. Não é a única forma de expressão. “Também sou DJ, o que não é ainda uma fonte de renda, mas alimenta muito a alma estar conectada com as possibilidades de arte”, define. “Relaciono-me artisticamente com as alquimias da culinária e da música”.
“Sempre fui muito conectada com a música e apreciadora de música eletrônica, mas precisei sair do movimento das festas da cidade pra despertar o meu potencial criativo como DJ”, informa Diana. Quando ela apeou na Chapada desenvolveu um projeto de curadoria sonora. “A partir dessas pesquisas musicais, aflorou a vontade de ‘discotecar’”, completa. O que impulsionou seu lado musical foi a criação do coletivo artístico Serenight. “Enquanto coletivo, estamos sempre movimentando alguma energia para manter a chama acessa, mesmo em tempos de pandemia”.
Diana e a Chapada dos Veadeiros parecem se pertencer. “Sinto-me potencializada pela energia que existe aqui. A Chapada é um local cheio de magia, basta estar atento e aberto para receber todos os sinais que tornam esse lugar tão especial”, revela Diana, com brilho nos olhos.
SENSAÇÃO DE PERTENCIMENTO À CHAPADA DOS VEADEIROS
“Sou um bichinho do mato”, se define. “Conectei com esse lado quando cheguei aqui. Aos poucos fui me sentindo realmente parte da natureza”. Ela está sempre desbravando algum lugar ou relaxando no rio que passa perto da sua casa. “Vivenciei experiências incríveis acampando aqui na Chapada também. Muitas pessoas até brincam que eu deveria ser guia, e eu sinto essa vontade também”, completa. É um passo futuro, assim ela projeta.
Diana não é mais a mesma mulher que era alguns anos atrás. Abriu muitas portas. Fechou outras. Suas prioridades mudaram. Seus valores são outros. Não se mata para vencer na vida, como reza a cartilha oficial. O dinheiro não tem autoridade divina sobre ela. “É apenas uma responsabilidade monetária que assumo para prover as experiências em vida nas quais acredito e que me trazem satisfação. Não sou apegada ou preocupada com dinheiro. À medida que me movimento, ele chega até mim!”, acredita e alardeia.
Ela não exige muito da vida. “O que me realiza é estar em contato com a natureza, ter uma alimentação orgânica acessível, espaço e acesso para me expressar criativamente”, eis o seu combo ideal. “Meu corpo é meu templo, os alimentos e os estímulos que direciono pra ele ativam o seu funcionamento perfeito. Sempre foi muito natural e consciente esse processo pra mim”, relata.
Ela conta que mantém um contato próximo e caloroso com sua família, mesmo que isso seja feito à distância. “Eles me apoiam e são felizes com a minha felicidade”, garante. Fez amigos que compartilham o mesmo propósito de vida, que vivem pelas mesmas crenças. “Cada dia é único por aqui. Busco me conectar nas melhores frequências para desenvolver tudo com prazer”, relata.
Sua paisagem não é mais povoada de arranha-céus e buzinas de automóveis. Um dia normal para ela pode começar com uma corrida, seguida de um banho de rio, um bom café da manhã, um momento de conexão para ritualizar com alguma medicina sagrada. Depois desse ritual, está pronta para suas demandas de trabalho e criações artísticas. Esse conjunto de coisas, ricas em simplicidade, ela chama de propósito de vida.