Pico da Estação

Era o Pico o chefe da estação ferroviária do Brumado naquela já cheia de brumas década dos cinquenta. Morava, com a família nos fundos do prédio, cuja frente compunha-se de seu gabinete e do armazém.

Pelo nome de seu primogênito, Zé Olímpio, inferi que o de pia do pai não seria diferente. A mulher, se me não falha a memória, Maria seria, para compor a história. E costureira, se a narração é verdadeira. Outros filhos havia, mas só do segundo é que guardei lembrança: Hélio, talvez uns dois anos mais velho do que eu.

A rotina diária do trem de passageiros, era um que descia na direção de Bom Despacho, e outro - ou ele mesmo - que subia, no seguinte dia, com direção a Belo Horizonte. Apitos, atrasos e algaravia balanceavam tristeza e alegria. Era também a hora da ativação do comércio das guloseimas do mais variado naipe.

Ocasionalmente, em horários nada republicanos, eram trens de carga que trafegavam. O povo, em geral, os chamava de lastro. Mais raridade, eram os automóveis de linha que aparentemente transportavam algum graúdo em inspeção. Miúdos, eram os tróleis, movidos à mão.

O que à rotina fugia era o comportamento de Héilo que, na ousadia, ou sadia folia, botava vestidos e sapatos da mãe, a desfilar pela plataforma da estação nos intervalos - ou interfalos - daquela ruidosa comoção.

Um dia, pela mesma via, sem prévio aviso, era o Pico que com a família partia. E não foi que vendo um dia - televisado - um show de balé do Bolshoi Kirov, experimentei a sensação dum reencontro, ainda que virtual: magistral, sem par, eis NureyHélio, a levitar...E como saiu-se bem na fita, justamente no pico da estação do balé moscovita....

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 28/01/2017
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