A ETERNA PRIMEIRA DAMA DE CORRENTINA.
Enoé Mattos de Araújo

Lauro Joaquim e Enoé Mattos

Natural da cidade de Barreiras – BA, onde nasceu no ano de 1916; Ela foi conhecida simplemente por Dona Énoe esposa do primeiro médico, correntinense. Estudou até o ginasial; no colégio interno Patronato, se transferindo para Aracaju; para onde ali permaneceu por mais dois anos;  se estabelecendo na Capital Salvador, onde já morava sua irmã mais velha.  Ada Mattos. Na capital estudou escrituração mercantil e logo entrou para o mercado de trabalho, sendo admitida como vendedora, na casa Dedal de Ouro, onde enfiu conheceu o recém-formado médico Lauro Joaquim de Araújo, que se hospedava num hotel de estudantes, na rua Chile, de frente ao seu local de trabalho..

- Foi amor a primeira vista!.
Confessou Énoe Mattos,  risonha, aos 93 anos de idade;  estavmos alí sentados no alpendre de sua casa no alto da colina;   ela numa espreguiçadeira confortável e eu com um pequeno gravador de voz, encantado com o relato consciente que dela ouvia, atento. Era fim da tarde e a sombra das mangueiras nos pretegia do sol que ainda brilhava no ceu de Correntina.
 
- Não teve namoro! continuou ela!
- Ele escreveu-me uma carta de amor e mandou em mãos, por um portador anônimo, acho que nem eu nem ele conheciamos o rapaz. Certamente parou o garoto na rua, deu-lhe um trocado e as explicações a quem entregar aquela carta. ,       
 
- Não foi também assim, entrou na loja, me viu, saiu, escreveu a carta e a enviou... Nâo! foi um processo que durou mais de seis meses. Sempre que ele chegava ou saia do hotel, dava uma paradinha na porta da loja, me olhava, até que eu percebesse sua presença e aí, seguia seu caminho. Por vezes entrava, olhava alguma coisa, de quando em vez uma compra, se orientando por uma pequena anotação que se viu ser, encomenda de alguem que Ele fazia questão de atender . Lauro era discreto, como Eu também o era, a gerencia da loja não podia nem imaginar que havia alguma coisa entre o cliente e a atendente de balção. Uma colega, a quem eu já havia relatado que aquele moço, grafino, esta me flertando e ela se aproximava quando ele entrava na loja para comprar ou vê preço de alguma coisa. Por vezes me pediu para fazer outra coisa e atendia o cliente, que já sabiamos o nome por ele ter-se se apresentado. Sabia que era médico, pelo univorme branco que por vezes voltada do trabalho vestido e a maletinha, propria dos médicos, onde guardavam seus instrumentos de trabalho.
 
Naquele dia Ele entrou na loja, olhou bem para mim, certamente certificando a roupa que eu vestia, pois foi essa a atenção do garoto ao entrar na loja para entregar a carta. Na carta Lauro abriu seu coração, como nunca certemente tivesse feito e pedia-me em namoro.
 
- A Senhora tem ainda essa carta?
- Sim!, sim. Guardei por todo esse tempo e a Noelia fez alguma copias, mas tenho a original comigo.
 
Passou uma copia e mostrou o original, cuidadosamente platificada, para evitar as ações do tempo) . Acende um cigarro, e continua sua narrativa:
- Seu pedido de namora era mais um pedido de casamento. Fui para casa e mostrei a carta a minha irmã  Ada, não respondi nada  até mesmo porque não recebi de suas mãos, mas certamente Ele cobraria de alguma forma a resposta. Não pude esconder o meu espanto, pois se tratava de um médico, recém-formado e uma balconista, filha de um sapateiro do interior do Estado (suspira! Não era para acreditar no que estava acontecendo. Eu pensava que as fabulas de principe e princesa, gata burralheira, fosse contos frutos da imaginação do escritor. Acontecia comigo. Somente convifidenciei com minha colega Alzira para que o caso não se tornanse um ti ti ti ou fofoca entre as demais funcionarias.
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A Jovem Énoe nada sabia do seu pretendente, nem ousava perguntar ou querer de algumas forma saber. Confessou que por vezses pensou que o mesmo não passava de u m fidalgo, se valendo de sua posição social, rico, formado doutor, querendo tirar proveito de uma moça pobre, balconista de  uma loja de artigos de costura e aviamentos, um armarinho.  

- Procurei desestimular o jovem estudante de suas pretensões; não lhe dando nenhuma resposta, mas não foi o que  minha irmã esperava de mim. Ada discordou totalmente de minha decisão em ser indiferente àquela carta. Ao tomar conhecimento da carta e do interesse do jovem médico, por sua mim que  respondesse a carta e que o convidasse a vir a nossa casa e falar com ela. Não lhe desse um não por resposta, também não lhe desse a certeza de sim..

- Responde a carta de forma bem simples e objetiva,  "que ele comparecesse a minha casa"  passei o endereço, e falasse com minha irmã...
 
No dia e hora marcada lá estava ele, bem vestido, perfumado, um belo chapeu na cabeça, trazendo nas mãos um boque de rosas. Pensei! Vou ganhar pela primeira vez rosas de um pretendente. Ada foi abrir a porta, Ada se apresentou, disse-lhe o nome e Ele a ofereceu o boque de flores... - UE! não era  pra mim essas flores.ADA também foi pega de surpresa e exclamou:- É mesmo pra mim as flores! - Sim, (respondeu Lauro).
 
Lauro não perdeu tempo e sem rodeios fizera um resumo do tempo que rondava a Loja Dedal de Ouro, e que seu corção "supitava de amores"  por  mim. E como disse, foi direto ao assunto, declarou-se  e fez seu pedido de casamento. Em resposta Ada solicitou-lhe  que se manifestasse ao Pai da pretendidan e sugeriu que lhe fizesse uma carta, já que o mesmo morava na cidade de Barreiras, oeste da Bahia e aguardasse a resposta do Pai. Outra vez Lauro, decidido que estava em tomar-me por esposa, perguntou se poderia escrever a carta ali mesmo, naquela hora. Foi providenciado papel, e ele sacou de uma fina caneta tinteiro PavarottiMontblanc e pos-se a escrever:ali, diante de todos, o seu  pedido de casamento  ao pai da Énoe. Na carta solicitava que a responsa fosse enviada à seu Pai, Major Felix Joaquim de Araújo, em Correntina, onde ele aguardaria a resposta, pois estava de volta à cidade, para o exercicio da profissão de médico, clinico geral.     

ANão se sabe precisar o tempo, mas pouco mais de um mês e a resposta estava em mãos do Major Felix, com outra enviada a Sanvador, informando a Enoe que estava prometida em casamento, conforme pedido que ela já tinha conhecimento e que estava liberada para viajar a cidade do noivo, para conhecer seus familiares e tratar dos preparativos para o casamento. 

A CHEGADA A CORRENTINA
 
Énoe é recepcionada na entrada do município, mais precisamente na Barra do São José, onde uma comitiva montada a cavalo a aguardava a beira do Porto de São José, que o vapor atracasse e  matasse a curiosidades dos que aguardavam a chegada da noiva de Dr. Lauro.
 
O Rio das éguas, ou rio de Correnitna, cheia do corredeiras não oferecia condições para navegação, apenas apartir da Barra do São José as barcaças cargeiras e vapores é que se tornava possivel a nevegaçáo. Logo o Porto da Barra  Sâo José, era o ponto de partida e chegada dos passageiros que se aventuravam pelo rio Correntina até o encontro do São Francisco para daí ganhar o horozonte agua das águasdo velho Chico, subindo ou descendo . 

As embarcações tinham suas classes especificas, para passageiros de todas as classes sociais, quem podia pagar mais, viajava de 1a. classe, no andar superior da embarcação e logo abaixo, uma área aberpa para redes que separava passageiros e cargas. TIve  este privilegio em 1961, aos 9 anos de idade, viajar na primeira classe, quando em companhia de uma tia, fui morar no Rio de Janeiro. Como sempre fui menino curioso por natureza, descia para brincar nos andares inferiores a nos misturar entre as sacarias e de quando em vez, um "pito" e uma ordem para voltar para ao camarote.  

Enfim Done Enoe chega ao Porto de São José e mal a barca atraca no porto, o arraial fora sacudido por fogos de artifícios e musica, numa calorosa recepção feita pela comitiva incumbida pelo Major Felix  a dar as boas vindas a noiva. O caminho de volta foram oito léguas inesquecível, de música, poesias que Dona Énoe diz nunca em sua vida esquecer. Nâo estranhava o ambiente de mata, a estrada, o baculejo do cabalo... afinal estave perdo de sua cidade, uma vez que o municipio de Correntina faz fronteira com o municipio de Barreiras. Aquele era também o seu habitar.  


- Lauro não cabia em sí de tanta felicidade, seu olhar para mim era pura expressão de amor e muito carinho; como sempre, teve durante todos os anos que juntos vivemos e  não foram poucos... até que a morte nos separou em 1982, foram mais de 50 anos... (emociona-se) e Noélia chega com um copo com água, ela dá um gole e acende outro cigarro...

 

Foram dias de festas, saraus, serestas e assim a jovem Énoe fora apresentada a sociedade,  como a mais nova integrante da nobre familia Araújo Joaquim e Araújo Neiva, pois Major Felix já era viuvo do primeiro casamento .

O  casamento ocorreu em Salvador, novembro de 1939; onde também passaram a lua-de-mel, o que não impediu que outros dias de festas acontecesse, quando o casal retornou a Correntina, para fixar residência.

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 Tiveram dois filhos, Veríssimo e Noélia, que lhe deram seis netos e três bisnetosArquiteto Veríssimo M. Araujo (filho)

 

Os olhos de Tia Énoe brilhavam ao descrever aqueles momentos inesquecíveis, com uma lucidez tamanha, que parecia terem acontecido no dia anterior. mais de 50 anos de vida conjugal, comemorado sem a presenta de seu grande amor. Agora, já passados mais de 90 anos de existência, Dona Énoe revive, com lucidez,  todos aqueles dias.

 
- Tenho muito saudade de quando Lauro era vivo Tonho. Desde que “ele” se foi tenho dito que com absoluta certeza do que foi viver veliz, amada em todos os 50 anos de união conjugal vivido
                            

Quando veio para Correntina, em 1939, Dona Énoe aos poucos foi interagindo no contexto social da cidade e auxiliando o jovem médico em suas atividades profissionais. Ela tornara-se referencial para as jovens moças da época, que mal sabiam da vida na capital. Acostumada com o fino gosto da capital, em sua experiência de vendedora de artigos de luxo; Dona Énoe logo interferiu nos costumes das jovens moças e dos comerciantes de moda, da cidade, exigindo dos mesmos, produtos de grifes famosas, até mesmo importadas, tecidos variados para confecção de roupas, perfumes, chapéus, calçados, produtos de beleza, coisas que eram restritos as poucas famílias da alta sociedade, passou a estar disponível nas pratileiras do comercio local, para quem as quisesse adquirir.

Professora Noélia M. Araujo  (Filha)
Rainha do Carnaval


-As moças de Correntina, em ocasião de festas pareciam colegiais uniformizadas da cabeça aos pés! menino! Vários vestidos com a mesma estampa,! Até os sapatos eram iguais!. Os comerciantes de  tecidos roupas e  sapatos, não tinham o hábito de variar o estoque de suas mercadorias. Compravam peças inteiras de tecidos, 100 metros de roupas iguais com algumas variaçoes de modelo, mas a mesma estampa. Não havia variedade de sapatos e sandalias, aquelas coisas repetidas e de qualidade a desejar. Quem podia recorria a parentes que viajavam a capital mas os demais eram sujeitos ao que o comercio punha em suas vitrines. Isso EU  mudei, fazendo encomendas detalhadas; indicando marcas,  padrão e compra de retalhos finos, para roupas, vestidos, carmisas de classe. A coisa pegou de tal jeito, que passei a ser referencia entre moças e rapazes, uma especie de consultora de moda. 

 

Tia Énoe sempre fora muito falante, mas não tinha uma conversa consativa, como não tem até hoje, ainda é atraente passar umas horas em sua compania, óbvio, com a paciencia de as vezes ouvir a mesma coisa duas vezes seguidas.  Hoje, com a mesma alegria e descontração de sempre, em paz, e conservando os vestígios fortes da irreverência que a caracterizou ao longos dos anos, Tia Énoe nos recebe no alpendre de sua casa, onde escrevemos este resumo biográfico de sua vida.

Mais uma vez expõe seu generoso coração, sem mencionar momentos ou pessoas que lhes foram desagradáveis, embora tenha deixado escapar um fio de tristeza, ao lembrar a morte do companheiro e o esquecimento  a que lhe foi imposto pela sociedade, na qual foram eles tão atuantes. Dr. Lauro, chegou a ser chamado “Pai dos pobres” quando o mesmo estabeleceu o dia de sábado, para atendimento gratuito as comunidades carentes. Neste dia a porta de sua casa se transformava em um pronto socorro. Alguns o consideram como o JK de Correntina, tanto por ser um médico, como JK, também pelo desemprenho e visão futurista, o conhecimento politico  em sua  curta passagem pela poder executivo; dois anos apenas ( Sua história está no Livro A História de Correntina, de Helverton Valnir Neves Silva).

- só Deus sabe as duras penas que passei, para vencer as dificuldades financeiras e emocionais, depois da ausência de Lauro. Depois de sua morte fui esquecida ! Confessa com tristeza na voz.

Adiante transcrevemos a carta de amor que deu início a esta saga, confessando nosso encanto pela sinceridade das palavras, que em todo este tempo, não foram vencidas pelas traças, que poderiam corroer o papel, mas já estavam gravadas no coração de quem sabe hoje dizer, quando o amor se faz eterno.

- Tia Énoe, Correntina e o mundo, através do livro Conto mais um ponto e da tecnologia da internet, agora tomam conhecimento de sua valiosa participação em nossa história; da influência e da nobreza de seus atos, assistenciais, principalmente entre aquelas carentes de amor e cuidados, que lhe fez, junto com Dr. Lauro, abrir as portas de seu consultório, para atendimento gratuitos.

- O homem e suas palavras passam, o que fica é a grandeza de seus atos, que hão de perpetuar na memória daqueles que se fazem eternamente gratos. Obrigado Dr. Lauro Joaquim de Araújo pelo seu amor à Correntina e por tudo de bom, que fez pelo seu povo.


Flamarion Antonio de Araujo Costa
do livro Conto MAIS um ponto.



CARTA DE AMOR
Lauro Joaquim de Araújo PARA Enóe Mattos


"Tomei hoje a deliberação de expressa-lhe nesta carta os meus sentimentos para com você e espero que sobre ela medite e se manifeste com inteira liberdade e sem constrangimento. Poderá parecer-lhe estranha tanto quanto surpreendente esta minha atitude, quando apenas pouco nos conhecemos. Evidentemente, o curto espaço de tempo durante o qual tive a fortuna de conhecê-la, não nos permitiu um franco entendimento entre ambos. Esta carta poderia ser o começo deste intercambio, por meio do qual nos fossemos informados das inclinações, temperamentos e ambições de um e de outro. Desta aproximação e deste entendimento talvez resultasse um acordo de sentimentos e aspirações, como base de um futura felicidade.

Da minha parte não oculto a simpatia que lhe tenho. Na verdade, venho sentido que gosto de você. Eu mesmo não sei explicar isso. Apenas já reconheci em você uma força que me atai; você talvez sorria. Esta certo. É uma canção que certamente esta habituada a ouvir, entoada por quantos, alguma vez, por você já se tenham interessado. O interesse, porém que tenho por você, é particularmente, diferente.

Sentir-me-ia infinitamente feliz e satisfeito se você me considerasse capaz de promover seu bem estar e sua felicidade; sou sincero que não lhe digo estas coisas. Não há, nelas, paixão. Tenho bastante experiência da vida e das mulheres para não cometer o ridículo das atitudes apaixonadas. O que faço é natural e humano não é só humano e natural, senão também, necessário, visto como tenho em mira disciplinar a minha vida, restaurando-me das agitações por que tenho passado, nos erros das minhas aventuras e nas venturas das minhas extravagâncias. Para isso é indispensável que uma companheira fiel marche ao meu lado nas lutas da minha vida profissional e pública sobre ela exercendo sua influência suavisadora estimulando-me nos momentos difíceis e participando das minhas alegrias nas horas gratas.

Não preciso entretanto, adentrar mais nesta carta, mesmo porque, não sei como você a receberá na emoção de sua surpresa: se com desdém com prazer ou com pesar. Ignoro se você está ou não comprometida, com outro, bem como considero a possibilidade de não ser correspondido; a opinião contraria de sua família ou outros fatores de ordem pessoal cada um desses motivos, bastando por si só para impedir que eu continue o culto de um amor tão puro quanto espontâneo e sincero.

Neste caso lamentarei o insucesso mas não insistirei no propósito. de qualquer modo porém ficar-lhe-ia imensamente grato se desse a esta carta a atenção de uma resposta".

 

Lauro Joaquim de Araújo
2 de abril de 1938



                              Lauro e Énoe - 

 

Flamarion Costa
Enviado por Flamarion Costa em 15/06/2009
Reeditado em 19/04/2022
Código do texto: T1649595
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