Corria o ano de 1971 quando, duas vezes por semana, eu frequentava o catecismo na igreja lá perto de casa. Não que em nossa família houvesse algum fervor religioso, mas porque era de praxe, neste nosso país que se declara essencialmente católico, que todos se submetessem aos tradicionais sacramentos. E eu, já contando com dez anos, precisava receber a instrução religiosa básica para poder enfrentar a Primeira Comunhão. Sinceramente, diferente de muitos ali, eu não fomentava nenhum interesse especial pelo evento. Isso porque, numa das missas que passei a ser obrigado a assistir, ao ver aquela fila imensa de pessoas indo se comungar, acabei me misturando à multidão e fui satisfazer minha curiosidade sobre a hóstia. Minha expectativa infantil restou frustrada, porque nem houve algum castigo divino por eu ter feito isso sem me confessar e, tampouco, fui tomado por algum arrebatamento espiritual. Simplesmente descobri que farinha de trigo e água resultam em algo tão excitante ao paladar quanto só farinha molhada pode fazê-lo. Mas, ninguém sabia de minha inocente travessura e, então, lá estava eu indo regularmente ao catecismo para formalizar na pompa e circunstância de um ritual o que, na prática e secretamente, já havia se consumado.
Irmã Vicentina era quem se dedicava à tarefa de orientar a meninada. A mim ela dava alguma atenção adicional, porque ingressei como retardatário nas aulas da catequese e presumia-se que era necessário que eu compensasse meu descompasso com relação aos demais. Naquela minha turma, havia crianças e adolescentes com idades que iam dos sete aos quinze anos. Eu sentava ao lado de Bernadete, uma garota que estava prestes a completar catorze primaveras e com quem encontrei grande afinidade. Numa daquelas tardes, durante o intervalo da catequese, fomos para trás da igreja, Bernadete e eu. Conversa vai, conversa vem e eu, dominado por apelos instintivos, consegui roubar um beijo da garota. Ela, certamente, percebeu meu insipiente traquejo nessas artes nas quais, então, eu ainda era principiante. Da mesma forma, ela notou que a natureza provocara em mim – como dizer? – reações metabólicas e reflexos involuntários em áreas mais remotas. Se eu não tinha exata noção do que fazer dali em diante, Bernadete pareceu-me não ter qualquer dúvida. Ali mesmo, começou a me catequizar sobre as facetas mais práticas do amor, porque pretendia que, com ela, eu tivesse uma.... uma.... primeira comunhão! Como eu fosse um aprendiz deveras interessado e muito dedicado, estava assimilando com rapidez seus ensinamentos e, confesso, naquele instante senti-me tocado. Sim! Tocado por ela que já estava se arrojando pelas vias de fato. Foi quando, abruptamente, surgiu Irmã Vicentina que nos flagrou a tempo de impedir que sacramentássemos nosso intento. Fomos levados à frente do pároco que, dentro da mais tradicional postura católica, obviamente abafou o caso, porque faltavam apenas duas semanas para a cerimônia em que seria ministrado o primeiro sacramento à nossa turma de catecismo. Dada a impressão que passei de ter sido uma vítima das circunstâncias, como penitência, a mim, foram recomendadas algumas dezenas de pais-nossos e outras tantas ave-marias a serem entoados diariamente ao longo daquelas duas semanas. Não sei o que fizeram com relação a Bernadete, porém, suspeito que por seu desprendimento, desenvoltura e empolgação, deve estar rezando até hoje! .oOo.