Zipei minh´alma num pendrive
Houve um tempo em que as lembranças eram guardadas em gavetas. Eram diários, fotos, cartas, bilhetes, anotações... Hoje em dia, tudo é diferente. As lembranças estão arquivadas! Tudo está em algum HD, CD, DVD... A alma humana foi capturada, digitalizada e zipada. Parte da minha, especificamente, foi parar num pendrive.
Desconsiderando a produção de natureza profissional, tenho eu para lá de uns quinhentos ou seiscentos arquivos dos textos que escrevi nos últimos sete ou oito anos - nunca parei para contar. Tudo que ficou ingenuamente estampado em papel, anterior à criação informatizada, deve estar nas gavetas de alguém - ou, alguéns! - por aí ou, simplesmente foi parar no lixo.
Esses gigabytes de informação estavam espalhados em três computadores diferentes que, além disso, não ficam no mesmo endereço. Eu jurei várias vezes para mim mesmo que algum dia iria reunir tudo e fazer uma triagem, só que nunca cumpri. Agora, ao menos, pus tudo num pendrive. Mas só os juntei, ainda não me pus a revisar tudo.
Confesso que tenho um certo receio de me deparar com as mensagens que, no passado, eu escrevi para mim mesmo no futuro. Quanto mais antigas minhas palavras, mais doridas também são. Por enquanto, o agora ainda não é um futuro seguro para que eu consiga enfrentar determinadas coisas que prefiro manter esquecidas. Alguns anos mais e eu talvez esteja pronto para essa purgação.
Cá entre nós, eu não quero correr o risco de ficar reabrindo velhas feridas porque isso pode, involuntariamente, suscitar - ou ressuscitar - rancores que penei para afastar de mim. É viável engasgar-se com a dor, vez por outra. Inviável é afogar-se em rancor por muito tempo. O engasgo aflige o bom humor e, depois de algum tempo, passa. O afogamento tortura a alma e, aos poucos, mata.