Recife Assombrado – Conto n. 1

O Teatro Valdemar de Oliveira já se incendiou, pelo menos, duas vezes. As chamas consumiram o veludo da cortina, as poltronas de couro vinho, os carpetes, todos os figurinos das peças já apresentadas nessa casa de arte e diversão. Tudo foi reduzido a cinzas, até mesmo a pipoqueira colocada estrategicamente antes da porta de entrada à frente do palco onde o recifense e o turista já viram as peças:“A Ratoeira”, “Cinderela. A história que sua mãe não contou” etc.

Alheio a esses acidentes, o busto de Valdemar de Oliveira está sorridente na praça Oswaldo Cruz, bem na frente da entrada do Teatro. Quem passa ao lado dele tem a impressão de que uma voz declara: a vida é um teatro.

Clarice, uma mulher com quase 60 anos, não se importava com a voz assombrada. Ela diz que mora num dos edifícios próximos, na rua Fernandes Vieira. E que, em noite de calor intenso no Recife, sai de seu apartamento de um quarto e caminha em volta daquela praça, para sentir a brisa vinda nas correntes de ar espremidas entre um edifício e outro, causando um barulho suave na inexplicável lagoa existente no meio da praça, ao lado de onde graciosamente está o coreto, cercado de quatro bancos de cimento, dos arbustos, árvores e da vegetação gramínea, até onde começa a calçada portuguesa já desgastada pelo tempo.

Ali atualmente também há barracas de camping instaladas, cujos donos dormem cedo da noite e fazem questão de não saber de quem ou o que vagueia por ali depois que se recolhem.