NA DANÇA DO BOI

MEUS BOIS

A vida não me levou para o lado da pecuária, mas sempre gostei da vida rural, a agricultura e a pecuária sempre me cativaram.

Talvez porque meu avô materno, que não conheci vivo, tivesse possuído uma fazenda no Marajó e em algumas oportunidades, mesmo já não existindo a fazendola, eu tivesse podido passar algumas férias em Salvaterra, no município de Soure, onde ele tinha deixado algumas pequenas propriedades para minha avó e para os mus tios.

As histórias contadas pela minha mãe e meus outros familiares, também contribuíram para esta minha preferência. Na região do Marajó a história do Boi-Bumbá é muito comum e até hoje lembro da cantiga que cantavam no boi em Salvaterra.

Resolvi então aproveitar a história tradicional e fiz uma letra com intenção de musicar a minha própria história do Bumba meu boi. Saiu então o “Boi no Céu”

BOI NO CÉU

(Gervásio Cavalcante e Almir Morisson)

Perdão meu boi, eu não sabia

Que junto também matava

Com a vida que te roubava

A melhor parte de mim.

Tirei com tiro certeiro

Tua dança viço e alegria

Pensando que era desejo

Hoje sei que era ciúme

Do modo de eu te tratar.

Porque foi pedir a língua

E não um fio de cabelo

O rabo, ou mesmo a estrela

Que tinha grudado na testa

Praqueles dias de festa

Se eu soubesse ela quem era

Eu tinha lhe dado o chifre

Que além de calhar mais certo

Não carecia matar.

Perdão meu boi pelo feito

Agora não tem mais jeito

Fiquei mais triste que tu

Pois ontem olhando pra cima

Pensei que aves em bando

Rodassem junto com as nuvens

Aí reparei direito

Foi quando te vi contente

Dançando todo enfeitado

De branco azul e encarnado

Lá no terreiro do céu.

25/09/94

No Retiro Vivi – esse era o nome da casa da minha avó em Salvaterra – em julho, onde e quando passava minhas férias, os grupos de boi solicitavam às casas da região para se apresentarem na frente das residências e mostrarem o auto do boi que estavam apresentando desde junho e assim ganhavam quitutes do morador e às vezes até uma gratificação.

Nessas ocasiões, com o pai Francisco, a Mãe Catirina, os índios, os vaqueiros, o Boi e demais personagens da peça, era comum acontecer alguns romances fora do drama, entre personagens, espectadores ou quem por lá estivesse.

Aproveitando a deixa, no mesmo dia em que fiz o Boi no Céu, resolvi escrever a história de dois amores, um perdido e um achado que aconteceram em uma apresentação.

NA DANÇA DO BOI

(Gervásio Cavalcante e Almir Morisson)

Foi lá na dança do boi, doeu,

Que perdi meu amor,

E o boi, o culpado que foi

Me chifrou e feriu

O meu curtido coração

Só o que eu não sabia, que um índio

Um caboclo certeiro, matreiro,

Muito mais que ligeiro

Já havia flechado o seu coração

A Rosa menina

Morena formosa

Faceira e dengosa

Filha amada do patrão

Deixou bem pisado e maltratado

O meu já cansado coração

Foi lá na dança do boi, valeu,

Que encontrei outro amor

E o boi, o culpado que foi

Dessa vez me ajudou

Fazer sarar meu coração

Rita, diferente da Rosa, formosa,

Entendeu meu amor, dançou,

No compasso do boi

Enfeitando de estrelas o meu coração

Rita era bonita

Mais meiga que Rosa

Vestida de chita

Dançando de pé no chão,

Coloriu com fitas tão bonitas

O meu já aflito coração

25/09/94

Embora possa fazer melodias sozinho, o que geralmente faço, gosto de ter parceiros que possam enriquecer a música. Convidei então o Gervásio Cavalcante, que já havia feito algumas parcerias comigo para musicar aquelas duas. Sairam tão boas que o “Na dança do boi” foi uma das escolhidas para fazer parte do primeiro CD que o Clube do Camelo gravou em 1995.

No ano seguinte resolvemos gravar um segundo CD que só foi concretizado em 1997 e foi sugerido pelo grupo que eu compusesse uma segunda música de boi.

Já tínhamos o “Boi no Céu” pronta, mas eu pensei em fazer uma continuação da Dança do Boi. Romanceei uma história onde a Rosa, que tinha rejeitado o protagonista da primeira letra por causa do índio, havia se arrependido e pedido pra voltar. Claro que o protagonista recusou pois agora já estava muito bem arrumado com a Rita.

Todo mundo gostou e no segundo CD saiu, além do Boi no Céu, a volta á fatídica primeira Dança do Boi.

DE VOLTA À DANÇA DO BOI

(Gervásio Cavalcante e Almir Morisson)

De volta no boi

Eu encontrei Rosa Maria

Cheirosa como a rosa

Menos pura que Maria

Passava rodando, rebolando,

Vinha toda “empavulada”

Pensando ainda tinha,

Preso meu coração

Olhando pra ela

Eu não vi tanta beleza

O índio roubara

Metade da boniteza

Quando foi chegando, se encostando,

Fingi não lhe conhecia

Sentia ainda ferido o coração

Jurou que não tinha culpa

Disse o culpado era o boi

Foi a tal flecha do índio

Que lhe derrubou no chão

E ficou cravada na ilharga do coração

Sei toda a culpa é da Rosa

É fácil jogar no boi

Hoje eu não quero nem prosa

Mesmo enfeitada de fita,

Sem nenhum espinho

Eu agora tenho a Rita

1996

Dai em diante em todos os shows juninos que o Clube do Camelo faz, sempre que possível, apresentamos “Na dança do boi” e “De volta á dança do boi”, uma na ilharga da outra.

Escutem as três aqui no Recanto das Letras ponto com.

Bem mais tarde, fiz mais uma letra relacionada a bois, o “Aboio Marajoara”. Mas isso já é outra história.